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E N T R E V I S T A S
A favor do financiamento público
“A corrupção está vinculada
às doações de campanha"
Marcia Ribeiro Dias,
Cientista política
P
rofessora da Escola de Ciência Política da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UniRio), Marcia Ribeiro Dias é uma defensora convicta do financiamento público de campanha, aliado a doações limitadas de pessoas físicas. Confira os argumentos.
Por que o financiamento público é a melhor opção?
A corrupção é um problema sério no Brasil e está o tempo todo, de alguma maneira, vinculada às doações de campanha. O financiamento público exclusivo é o mais recomendado. Poderia até haver doação de pessoa física também, desde que fosse vinculada ao CPF, declarada no imposto de renda e que tivesse um teto. Com o fim das doações empresariais, as campanhas deixariam de ser faraônicas.
As campanhas ficariam mais simples?
Sim. Se você olhar outros países com financiamento público, a maioria tem campanhas muito mais modestas, e os partidos fazem um trabalho de formiguinha, com gente na rua para ganhar votos. É assim que se faz política e que se convence as pessoas. A contribuição seria enorme para a qualidade da nossa democracia.
E o caixa 2?
Continuaria existindo, como existe no mundo inteiro, mas em escala reduzida. Hoje, com o financiamento misto, existem várias maneiras de mascarar o recebimento de recursos não contabilizados. Já a mudança no sistema tornaria público quando cada partido ganha do Estado. Isso evitaria os excessos.
Novos partidos não teriam mais dificuldades para se estabelecer?
A gente já tem partidos suficientes. Não estamos carecendo disso. Se isso acontecesse, eu até diria "que bom".
O custo das eleições não sairia mais alto para o contribuinte?
A gente gastaria muito menos com o financiamento público do que gasta com corrupção. Mas é claro que teríamos de botar um limite. O custo das campanhas teria de ser reduzido, e os partidos teriam de parar de valorizar o espetáculo para começar a valorizar o conteúdo.
A favor das doações de empresas
“É errado jogar todo o peso
da corrupção nos doadores"
Rodolfo Viana Pereira,
Especialista em Direito Eleitoral
C
oordenador Grupo de Estudos sobre Constituição e Política da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas (UFMG), Rodolfo Viana Pereira é um defensor da doação de empresas, desde que com limites claros. Confira os argumentos:
Por que as doações de empresas devem ser mantidas?
O Brasil está vivendo uma fase em que parece que todo problema é do doador eleitoral, o que é uma mentira. É errado jogar todo o peso da corrupção nos doadores e apontar o financiamento público como solução. O que precisamos é de ajuste, não de revolução.
Qual seria a saída?
O financiamento misto, tal como existe hoje, mas com uma alteração importantíssima. Hoje, a empresa pode doar até 2% do faturamento bruto, o que parece isonômico, mas não é. Empresas ricas influenciam demais. Deveríamos limitar essa doação a um teto com valor nominal, por CNPJ. Por exemplo: cada empresa poderia doar no máximo R$ 300 mil.
Isso não perpetuaria a influência do poder econômico?
Não. Eleição tem custo, as empresas têm interesses e é legítimo que tenham. A questão é haver controle e transparência. Esse ajuste teria o mérito de pulverizar a influência dessas grandes corporações e acabaria gerando um fluxo menor de recursos nas campanhas. A limitação deveria valer, também, para pessoas físicas.
E o caixa 2?
Na eleição que resultou no impeachment do ex-presidente Fernando Collor, ainda era proibida a doação de empresas, e a resposta ao escândalo foi justamente a liberação do financiamento por pessoas jurídicas. O que houve, na época, foi o uso de recursos não contabilizados, de caixa dois. O problema é que a gente perde a memória.
Mas as campanhas não ficariam mais simples e baratas?
Não é bem assim. O volume global do caixa um pode até diminuir, mas o caixa dois sairia do controle e surgiriam outros problemas, como a perda de autonomia dos partidos. Eles tenderiam a ser equiparados a entes públicos, com perigosas ingerências em seu funcionamento.
As controvérsias
do sistema
espanhol
“O financiamento público
não foi suficiente na Espanha"
Ana Claudia Santano,
Especialistas em Ciências Jurídicas e Políticas
A
utora do livro O financiamento da Política - Teoria geral e experiências no Direito Comparado, Ana Claudia Santano fez mestrado e doutorado na Universidade de Salamanca, na Espanha, onde estudou o sistema de financiamento eleitoral e partidário espanhol. Para a especialista, que integra a Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político, os brasileiros têm muito a aprender com a experiência espanhola.
O que o Brasil pode aprender com os espanhóis?
Muito. Eles já tiveram esse debate sobre as doações privadas, se elas seriam ou não saudáveis para os partidos e as campanhas, e terminaram por restringi-las ao máximo, por acreditar que assim combateriam a corrupção. Só que, na prática, não funcionou. O financiamento público não foi suficiente na Espanha para substituir as doações de empresas.
O que aconteceu?
Os partidos recebiam muitos recursos públicos, mas estavam afundados em dívidas e continuaram buscando doações privadas. Só que o sistema de doação privada passou a ser tão restrito que invariavelmente surgiram irregularidades. Além disso, os partidos se sentiram confortáveis dentro do Estado e pararam de abrir espaços para a sociedade. Houve um distanciamento gradual. Hoje, o desgaste político é enorme na Espanha.
Algum país conseguiu chegar a um modelo equilibrado?
A Alemanha, mas os alemães pensam diferente de nós. Eles realmente acreditam que a política é necessária e deve ser fomentada. Lá, se o partido consegue convencer o militante a pagar uma cota anual, ele ganha uma contrapartida do Estado e tem a chance de ampliar os seus recursos. Isso promove mobilização e aproxima os partidos das pessoas, que realmente se envolvem. A democracia gira. É isso que a gente não está pensando aqui.
Mas acabou a corrupção na Alemanha?
Claro que não. É por isso que mudar o sistema de financiamento não é a solução para a corrupção. Precisamos ir além e não podemos cair no discurso moralizador que querem transmitir com a reforma política, como ocorreu na Espanha, porque isso pode acabar nos levando a piorar as coisas.
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