
A terça-feira é de efemérides nas letras gaúchas e argentinas. No mesmo dia, completam-se cem anos da morte do escritor brasileiro João Simões Lopes Neto (1865 – 1916) e três décadas do falecimento do argentino Jorge Luis Borges (1899 – 1986).
Responsável por uma edição crítica das obras de Simões Lopes e, atualmente, trabalhando em uma obra de ficção na qual reflete sobre Borges, o jaguarense Aldyr Garcia Schlee tem intimidade com a produção dos dois autores. No entanto, ele evita comparações:
– Borges e Simões são escritores únicos, insuperáveis, cada com seu modo de se expressar e de fazer literatura. Não há possibilidade de comparação.
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Aos 81 anos, Schlee também teve oportunidade de se aproximar da vida pessoal destes dois nomes da literatura. Conheceu pessoalmente Borges – embora quase não lembre do episódio.
Com cerca de seis anos, Schlee foi apresentada ao criador de O Aleph pelo padrinho de sua irmã, amigo do escritor uruguaio Enrique Amorin. Casado com uma prima de Borges, Amorin e Borges se tornaram companheiros de viagem em um recorrido pela região de fronteira entre Brasil e Uruguai.
Foi nessa jornada que os escritores se hospedaram em um hotel de Jaguarão. Antes de chegar na cidade, pediram que uma nova porta fosse aberta no quarto em que dormiriam. O novo acesso deveria dar direto para a rua, de modo que os viajantes não precisassem passar pelo restaurante do local ao entrar ou sair. O pedido, feito para reservar os escritores dos curiosos, foi atendido, mas Schlee teve oportunidade de conhecê-los, embora só mais tarde compreendeu de quem se tratavam.
Schlee não lembra de quase nada do episódio, mas o fato é um estímulos para sua imaginação a respeito do escritor, a qual vem trabalhando no livro Contos com Espelhos, sem data definida de publicação.
– O livro uma série de reflexões que faço em forma de contos ficcionais, que tratam como espelhos algumas histórias escritas pelo Borges – conta Schlee.
Já sobre Simões Lopes Neto, o escritor jaguarense esteve próximo de quem conviveu cotidianamente com o autor de Contos Gauchescos e Lendas do Sul. Aos 15 anos, Schlee foi morar em Pelotas, trabalhando nos jornais Diário Popular e Opinião Pública – Simões colaborou até o fim de sua vida com este último. Nestas redações, onde Schlee trabalhava como desenhista, passou a conversar com mais de uma dezena de colegas que estiveram próximos do escrito que já admirava.
– Juntamente com a viúva de Simões, a dona Velha, eles me passaram a ideia de que Simões não tinha sido grande coisa. Nunca ninguém teve condições de perceber a qualidade extraordinária de sua obra – conta Schlee.
O reconhecimento sobre o trabalho de Simões Lopes Neto veio décadas depois da morte deste.
– Depois que saiu a primeira edição crítica, aí ele passou a ser considerado com outros olhos, passou a ser estudado na academia e teve a consagração dos críticos. A recepção dele se enriqueceu e ele se tornou nosso maior regionalista.
Neto de Visconde da Graça, Simões Lopes Neto pode ter sofrido com o as expectativas que repousavam sobre ele. Essa é a opinião de Schlee:
– Acredito que esperavam que ele correspondesse ao que se espera de um neto de visconde, ou seja, que usasse a influência do avô para obter êxito. No entanto, Simões foi um sujeito que fracassou nas áreas do comércio, serviço e indústria.