
O rock morreu? Pelo menos não em Porto Alegre. Na capital do Rio Grande do Sul, o gênero segue respirando, mas também inspirando e se renovando. E não são só os gaúchos que moram por aqui que continuam botando as guitarras para gritarem alto – Lucas Silveira, há anos radicado em São Paulo, dá um tempo na Fresno e investe novamente no seu projeto independente Beeshop com The life and death of Beeshop. Das formações com base em Porto Alegre, temos a estreia em altíssima voltagem do hard rock da Rebel Machine com Nothing happens overnight, a apresentação da nova formação da Suco Elétrico em Se o futuro permitir e a volta do rock alternativo da Walverdes com Repuxo.
Confira aqui um pouco sobre esses lançamentos.
Rebel Machine
O quarteto porto-alegrense é o que se convencionou chamar de "banda gringa". Não apenas porque cantam em inglês, mas porque apresentam uma produção caprichada e trabalham um som que mira fora das fronteiras tupiniquins. Por isso, sem nenhuma surpresa, Nothing happens overnight ganhou resenhas elogiosas em publicações virtuais norte-americanas e rodou em webrádios da Suécia, Austrália e Alemanha. Com pouco mais de 30 minutos, o álbum poderia muito bem ter sido gravado ali no finalzinho de 1980 e começo de 1990 em Los Angeles, quando o metal farofa começava a ceder espaço para um rock mais encorpado – mas não menos divertido. Porque a vocação da Rebel é a arena, é a multidão se acotovelando, chacoalhando a cabeleira, fazendo air guitar e cantando junto. As tintas estão dadas logo na faixa de abertura, Don’t tell me i’m wrong: duelo de guitarras, baixo pesado estalando no peito, bateria segura e um vocal potente e com personalidade. Não inventam a roda, mas não decepcionam. Na verdade, mostram que têm potencial para, agora que já provaram que são bons nos fundamentos do hard rock, avançar para outros campos. Desde que continuem descendo a mão com bom gosto e esmero. (Independente, 8 faixas, disponível nos serviços de streaming). Gustavo Brigatti
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Beeshop
O ídolo adolescente cresceu: Lucas Silveira, que se transformou em um dos mais populares músicos do Brasil por meio de seu trabalho com a Fresno, agora é um pai de família, produtor musical e workaholic insaciável. E acaba de lançar o segundo álbum de seu projeto mais íntimo, The life and death of Beeshop. Se na última década a carreira do cearense criado no Rio Grande do Sul – e atualmente radicado em São Paulo – virou um grande caos que ele tem dificuldade de controlar, seu projeto solo funciona quase como uma consulta psicológica. Em seu segundo trabalho sob o pseudônimo (tirado de um personagem que desenhava tirinhas baseadas em histórias pessoais), Lucas investiga as mudanças que transformaram sua vida recentemente e apresenta um resultado sujo, emocionado e caótico. Tudo intencionalmente:
– A busca musical que faço é da minha composição mais natural. Quem sou eu no estágio mais puro? Como é a minha música no estado mais depenado de produção, em que tudo que resta é a mensagem só em formato de ondas e sons? É uma busca constante, vou morrer sem chegar nesta utopia. Mas eu fui atrás disso neste disco de uma forma bem clara: priorizei as primeiras ideias, as primeiras gravações, o improviso, o sentimento. (Independente, 8 faixas, disponível nos serviços de streaming). Gustavo Foster
Walverdes
Uma das mais representativas bandas da cena independente brasileira, a Walverdes está de volta. Seis anos depois de Break dance, o quarteto formado por Gustavo Mini (guitarra e vocal), Marcos Rubenich (bateria), Patrick Magalhães (baixo) e Julio Porto (guitarra) lança Repuxo, disco com sete faixas que adiciona um pouco de sofisticação ao peso característico da banda.
– Somos uma banda de rock dos anos 1990 que não deixou de se atualizar aqui e ali – define Mini. – O esqueleto segue o mesmo, com influências de Mudhoney, The Whow, Black Sabbath e Melvins, mas com uns toques de psicodelia que ligam o disco a um pessoal mais atual, como o Tame Impala.
Mini se refere à Água, faixa que leva os Walverdes para mares lisérgicos, enquanto a vinheta Jazz com bacon encerra o disco com inesperada classe – como é inesperada a introdução da faixa de abertura, Cálculos & negociações, quase um minuto e meio de instrumental hipnótico. A urgência e o peso do som casam bem com as letras – com destaque para É muita gente, um pequeno conto de angústia moderna ("É muita gente pra administrar / É muita gente pra dizer alô / É muita gente pra satisfazer / É muita gente pra fazer amor"). Recomendadíssimo. (Loop Discos, 7 faixas, disponível nos serviços de streaming). Gustavo Brigatti
Suco Elétrico
Em nova formação, a Suco Elétrico lança Se o futuro permitir. Logo na primeira faixa, Canção do futuro, uma reflexão sobre, claro, o futuro. Mas também o passado: "Quem resiste há muitos anos, firma o passo e nada dói / Pagam alto pelo Suco, só assim que se constrói / uma leva de canções / Quem será que vai ouvir?". A pegada é um pop rock divertido e dançante, com músicas que bebem do BRock oitentista ao rock alternativo dos anos 1990 e alguma coisa do indie dos 2000. Tênis, econômica na letra, abusa no instrumental e é uma das melhores do disco – quiçá, uma das melhores faixas do gênero lançadas por aqui neste ano. Eu acho pesa um pouco mais nas guitarras e coloca o baterista convertido em vocalista Alexandre Rauen para trabalhar; Dragão resgata uma antiga tradição do rock brasileiro de escrever letras que deixam para o ouvinte decidir no que acreditar (“Adoro ouvir as histórias do dragão verde cabeçudo / Adoro quando ele mergulha nas águas paradas do fundo / Gosto quando ele cospe o fogo de sua cabeça / Na minha cabeça que esquenta”). Com produção do sempre excelente Marcelo Fruet, Se o futuro... recoloca a Suco no bom caminho. (180, 10 faixas, disponível nos serviços de streaming). Gustabo Brigatti