
Mauro Moraes não é sujeito de meias palavras: lamenta a baixa qualidade dos festivais nativistas atuais com a mesma franqueza que confessa questionar-se às vezes se deve seguir na carreira artística. Se essa dúvida bate, felizmente parece não se aquerenciar por muito tempo, já que o cantor, compositor e violonista vai lançar um disco novo nesta sexta-feira e já prepara outro para breve. Nesta sexta-feira, Moraes apresentará no Auditório Barbosa Lessa do Centro Cultural CEEE Erico Verissimo algumas músicas do CD Dos arreios e sucessos como Milonga abaixo de mau tempo, Chamamecero, Milongueando uns troços, Feito o carreto, Com o violão na garupa e Com cisco nos olhos – canções que o alçaram ao posto de um dos mais inspirados compositores surgidos na explosão dos festivais gauchescos no começo dos anos 1980. Batizado de abrecancha, o show terá a participação dos músicos Éverson Maré (violão e voz), Carlos Madruga (violão e voz) e Fabiano Torres (acordeom).
– Venho de uma época em que a gente subia no palco para concorrer com Apparício Silva Rillo, Luiz Coronel, Mário Barbará. Era outro nível. Hoje, se tu ganhas, tu és prevalecido; se tu perdes, eles dizem “pô, ganhei do Mauro Moraes!”. Já passamos dessa fase de competições. A picada a gente abriu, agora a gurizada pode cuidar da plantação ou continuar estragando – diz o músico de 57 anos em entrevista a ZH.
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Com uma obra registrada em 15 álbuns, ganhador de dois discos de ouro e de seis troféus Açorianos – incluindo quatro de Melhor Compositor de Música Regional –, Moraes é um dos grandes vencedores de festivais no Estado, contabilizando entre os prêmios a cobiçada Calhandra de Ouro, recebida com a música Feito o carreto na 31ª Califórnia da Canção Nativa de Uruguaiana, em 2002.
– Tenho uma Calhandra, mas belisquei várias. É mais fácil dizer os festivais que não ganhei: Musicanto e Tertúlia.
Nascido em Uruguaiana, Mauro Moraes mudou-se para Porto Alegre em 1971. O começo da carreira foi em 1979, participando da Vindima da Canção Popular, em Flores da Cunha, quando tirou o quinto lugar e foi escolhido o compositor revelação com Vaqueano.
– Não sei mais nem assobiar essa música – diverte-se Moraes, lembrando que aprendeu sozinho a tocar violão.
Bebeto Alves gravou o compositor em três discos
Dono de uma poética poderosa e imagética, capaz de evocar cenas campeiras com iguais realismo e lirismo, o autor faz questão de se identificar como urbano, apesar da origem interiorana:
– Venho de uma criação lá de Uruguaiana com alguns parentes e amigos na área rural. Sou um bom observador, pego os detalhes do campo. Tem poetas que descrevem a cena campeira como ela está acontecendo, eu escrevo como gostaria que ela fosse. Minhas canções sempre têm uma segunda interpretação.
Moraes diz que teve sorte de ser reconhecido logo de início no meio musical por nomes como Luiz Carlos Borges, Neto Fagundes, Renato Borghetti, Vinícius Brum, José Cláudio Machado e César Passarinho – artistas que divulgaram ou gravaram sua obra. Confessa escutar pouco a música nativista, ouvindo mais MPB.
– Vou de Bebeto Alves a Chico Buarque, de Telmo de Lima Freitas a Alfredo Zitarrosa, versejo por essa turma – afirma, destacando a importância do conterrâneo Bebeto em sua formação: – É a maior referência na minha vida.
Curiosamente, os uruguaianenses não se conheceram na terra natal de ambos: foi na Capital, depois de mostrar a Neto Fagundes a milonga Fulanos e sicranos, que o cantor disse a Moraes que a música tinha a cara de Bebeto.
– “Mas eu fiz pensando nele! Só que não tenho acesso a ele”, disse para o Neto. Ele ligou então para o Bebeto e nos apresentou. O Neto foi o padrinho – explica o compositor.
A parceria artística foi registrada em três discos de Bebeto: Milongueando uns troços (1995), Mandando lenha (1998) – antológica gravação que conta com o mestre do violão Lucio Yanel – e Milongamento (1999). Bebeto também fala com entusiasmo de Moares:
– O Mauro me possibilitou me apropriar desse universo rural, do qual eu não faço parte, nunca fiz, assim diretamente, apesar de todos nós interioranos, povoeiros, estarmos cercados dessa cultura. Ele não retrata o dono de estância, o patrão, e sim o homem comum do campo que sofre por amor, que cuida dos bichos, galinha, cachorro, porco, que tem saudade da “nega veia”. Na verdade, a composição do Mauro ampliou o meu entendimento da nossa cultura.
MAURO MORAES – abrecancha
Sexta-feira, às 20h.
Auditório Barbosa Lessa do Centro Cultural CEEE Erico Verissimo (Andradas, 1,223, 4º andar).
Ingressos a R$ 40, à venda nas lojas Multisom e em minhaentrada.com.br.