
Em 2002, Cidade de Deus passou como um furacão pelos festivais e pelo circuito de cinemas. Para além do burburinho da crítica, dos debates sobre questões sociais e da aclamação internacional alcançada, seu impacto se fez notar na vida de quem participou da produção.
>>>Em galeria de fotos veja por onde andam 10 atores
mirins que se destacaram no cinema nacional
A começar pelo diretor, Fernando Meirelles, hoje um dos realizadores latino-americanos de maior prestígio em Hollywood. As grandes histórias de mudança, no entanto, são as dos atores. São eles o foco do documentário Cidade de Deus - 10 Anos Depois, longa que os diretores cariocas Cavi Borges e Luciano Vidigal estão preparando para lançar no Festival de Cannes do ano que vem - o mesmo palco da primeira exibição do filme de Meirelles.
Cavi é o cara por trás da Cavídeo, locadora que virou produtora e uma das referências do jovem cinema nacional. Vidigal é forjado na Nós do Morro, projeto de sociabilização por meio da arte de onde saíram, por alto, 80% dos intérpretes de Cidade de Deus.
- O Meirelles também está no projeto, mas só dando dicas e contatos. Ele não quis se envolver diretamente para que o documentário não ficasse assim, chapa branca - relata Cavi.
Alguns trechos já postados em sites de compartilhamento de vídeos evidenciam depoimentos variados, das confissões de quem não deu certo como ator e sucumbiu à criminalidade (caso de Rubens Sabino, intérprete do traficante Neguinho) às brincadeiras de quem, diante das dificuldades da carreira artística, não perdeu a capacidade de rir de si mesmo.
Para além de Alice Braga (Angélica), Jonathan Haagensen (Cabeleira), Darlan Cunha (Filé com Fritas) e Douglas Silva (Dadinho), também se saíram bem no cinema e na TV atores como Renato de Souza (Marreco, integrante do Trio Ternura), que, entre outros trabalhos, fez o longa-metragem Quase Dois Irmãos (2004), e Roberta Rodrigues (Berenice), atriz de novelas como Insensato Coração (2011) e longas como Desenrola (2010). Também o intérprete de Zé Pequeno, Leandro Firmino, seguiu carreira: participou de séries (como A Diarista e A Grande Família) e filmes (como O Homem que Desafiou o Diabo, de 2007). Os três, Renato, Roberta e Leandro, estarão na linha de frente de Cidade de Deus - 10 Anos Depois. Eles e outros dois atores, que após 30 entrevistas foram escolhidos por apresentar "as melhores histórias". Explica Cavi:
- Vamos focar no Thiago Martins, que mesmo depois de um papel pequeno em Cidade de Deus (Lampião) viu a carreira decolar na TV Globo, e no Eduardo Dornelles, o Piranha. Este era bandido, vivia de crimes antes do filme. Foi escolhido pela cara de mau, como diz o Meirelles, para integrar a gangue do Cenoura. E, após 2002, viu a vida mudar: trabalha com o AfroReggae e ganha a vida dirigindo projetos audiovisuais.
A intenção de Cavi, Vidigal e do produtor e roteirista Luís Carlos Nascimento - ele próprio ator de Cidade de Deus (integrava a gangue de Zé Pequeno) - é usar depoimentos de todos os 30 atores, os outros 25 naturalmente ocupando menos tempo na montagem final. A dificuldade em acomodar tudo em 90 minutos foi determinante para que o documentário não pudesse ser finalizado ainda em 2012, ano do aniversário de uma década. Isso e a falta de dinheiro.
- Ainda nem conseguimos fechar o orçamento - conta Cavi.
- Captamos R$ 50 mil com o Canal Brasil e outros R$ 30 mil com amigos e produtoras. E só. Mas vai dar tudo certo. O apelo de Cidade de Deus é incrível, você precisava ver a reação das pessoas em Cannes, em maio, quando eu falava do projeto. Não tem como não dar certo.