
Fim de viagem. A oitava e última parada da série sobre grandes cinematografias do século 21, que ZH apresentou ao longo das oito semanas de janeiro e fevereiro, propõe uma reunião inusitada, de países com produções bem diferentes, embora próximos geograficamente: as nações do Oriente Médio e três vizinhos (Grécia, Turquia e Egito) com os quais abraçam a ponta oriental do Mar Mediterrâneo.
Leia o texto inaugural da série, sobre o cinema da Ásia Extrema
Parte 2: o Leste Europeu e as desigualdades sociais
Parte 3: o Universo Nórdico para além de seus maiores clichês
Parte 4: Oriente Exótico, um mundo a descobrir
Parte 5: América Central, tão próxima, tão distante
Parte 6: as ex-Repúblicas Soviéticas
Parte 7: o velho e o novíssimo no Mundo Ibérico
Olhe para o top 10 abaixo. Ali, pode apostar, só há filmes realmente especiais. Para elaborá-lo, foi preciso excluir bons longas como O Círculo (de Jafar Panahi) e Às Cinco da Tarde (Samira Makhmalbaf), entre outras produções iranianas, e A Bolha (Eytan Fox) e A Banda (Eran Kolirin), entre outras israelenses. Não houve espaço para citar realizadores consagrados, como Amos Gitai (Free Zone), nem revelações, como a libanesa Nadine Labaki (Caramelo). É preciso reconhecer: nenhum outro capítulo desta série reuniu dois cineastas de obra tão poderosa quanto Abbas Kiarostami e Theo Angelopoulos.
O problema é que não deu para dar conta, plenamente, do que a crítica internacional já chamou de "estranha" e "pungente" nova onda do cinema grego (da qual o indicado ao Oscar Dente Canino, de Giorgos Lanthimos, é apenas um entre vários representantes). E nem de um novíssimo movimento, no Egito, que tem usado o cinema para falar da realidade do país ao fim do governo de Hosni Mubarak (em títulos como o longa de direção coletiva Tahrir 2011).
Mobilizações como essas não são novidade: em suas particularidades - bem distintas entre si, destaque-se -, esses países possuem cinematografias bastante tradicionais. O cinema egípcio, por exemplo, entre as décadas de 1940 e 70, esteve para o mundo árabe quase como Hollywood está para o Ocidente, constituindo-se a segunda maior fonte geradora de riqueza para seu país, atrás apenas do algodão. Neste novo milênio, não se pode dissociar a cinematografia do Egito das questões políticas e sociais - Cairo 678 (de Mohamed Diab) e Asmaa (Amr Salama), ambos com boa circulação internacional, são dois exemplos conhecidos a confirmar essa tese.
Numa ponte imaginária (sobre o Mar Mediterrâneo e o Oriente mais próximo), pode-se associar essa produção emergente à de nações como o Irã, cuja cinematografia está difundida globalmente desde as últimas décadas do século 20, e a Turquia. Esta última ganhou força a partir de 2000, com títulos voltados para o grande público, como a série de humor Vizontele (de Yilmaz Erdogan), e experiências de linguagem mais elaboradas, caso de toda a obra de Nuri Bilge Ceylan (Distant, Climas, Três Macacos), um dos raros diretores que bem poderiam figurar com mais de um filme na lista ao lado, tamanha a qualidade de seu trabalho.
Fatih Akin (Contra a Parede), na Alamanha, e Ferzan Ozpetek (Um Amor Quase Perfeito), na Itália, são exemplos de cineastas de origem turca que têm feito sucesso produzindo em países mais tradicionais. Na Turquia propriamente dita, além de Ceylan, têm chamado a atenção nomes como Ulas Inan Inaç (Türev) e Çagan Irmak (Meu Pai e Meu Filho).
Mas não é demais ressaltar: a ponte aqui estabelecida é menos estética e mais geográfica, o que quer dizer que está se falando ao mesmo tempo de Grécia e Irã, Turquia e Líbano, para que se possa de fato contemplar as cinematografias que, como diz o enunciado desta série, estão fazendo por merecer a nossa atenção.
E, já que a viagem cinematográfica intercontinental está chegando ao fim, nada mais adequado do que citar uma obra-prima que resume alguns dos preceitos do melhor cinema global produzido no novo milênio: Valsa com Bashir. Dirigida por Ari Folman, esta produção internacional que conta com recursos de oito países, entre eles Israel, França e Austrália, é ao mesmo tempo uma animação, um drama de guerra, um ensaio memorialístico e um contundente tratado político contra a violência dos conflitos no Oriente Médio. Mais contemporâneo impossível.
Top 10
Filmes produzidos nos 2000 no Mediterrâneo Oriental:
A Caminho de Kandahar, de Mohsen Makhmalbaf (Irã, 2001)
Dez, de Abbas Kiarostami (Irã, 2002)
O Vale dos Lamentos, de Theo Angelopoulos (Grécia, 2004)
Paradise Now, de Hany Abu-Assad (Israel, 2005)
Lemon Tree, de Eran Riklis (Israel, 2008)
Valsa com Bashir, de Ari Folman (Israel, 2008)
Dente Canino, de Giorgos Lanthimos (Grécia, 2009)
Líbano, de Samuel Maoz (Líbano, 2009)
Era uma Vez na Anatólia, de Nuri Bilge Ceylan (Turquia, 2011)
A Separação, de Asghar Farhadi (Irã, 2011)
Todos os textos da série:
8/1 - Ásia Extrema
15/1 - Leste Europeu
22/1 - Universo Nórdico
29/1 - Oriente Exótico
4/2 - México e América Central
11/2 - União das Ex-Repúblicas Soviéticas
18/2 - Mundo Ibérico
25/2 - Mediterrâneo Oriental