
A exposição "Um Trágico nos Trópicos", em cartaz até julho no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB) de São Paulo, apresenta mais de 140 obras de Iberê Camargo de coleções e acervos diversos. Percorrendo as galerias do antigo prédio do banco no centro paulistano, por cujas paredes há pouco passaram impressionistas e renascentistas, é possível acompanhar o decorrer das fases do artista gaúcho.
São quatro andares de Iberê, mas é a pequena sala do terceiro piso que arrebata o visitante. Há apenas seis trabalhos, mas estão ali as monumentais telas das derradeiras séries "As Idiotas", "No Vento e na Terra", "Crepúsculo na Boca do Monte" (todas de 1991) e "Tudo Te É Falso e Inútil" (1992). Reunidas e confrontadas, essas pinturas, habitadas por figuras fantasmagóricas e dotadas de forte carga sombria, parecem emparedar e lançar o espectador para dentro daquelas paisagens desoladoras. O conjunto forma, nas palavras do curador Luiz Camillo Osorio, uma síntese do drama melancólico de Iberê.
- É o apogeu do trágico - conta Osorio, caminhando pela montagem da exposição na véspera da abertura. - Essa fase final de Iberê sintetiza o que chamo de dimensão trágica e resume a coerência interna na obra dele. É quando a escala da pintura é exponencializada, e a temática se volta ao embate com a finitude, a proximidade da morte.
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No quarto andar do CCBB, há uma pequena retrospectiva que situa os temas do artista - as paisagens dos anos 1940, as naturezas-mortas dos anos 50, os carretéis e a abstração dos anos 60 e 70 e os ciclistas e as idiotas dos anos 80 e 90. O segundo piso amplia o período dos carretéis, mostrando como eles explodiram na decorrente fase abstrata e como depois retomaram certa ordem figurativa. O destaque é a série soturna em que Iberê aboliu a cor e com a qual ganhou o prêmio de pintura na Bienal de SP de 1961.
Já no primeiro andar, em torno do cofre onde estão matrizes de gravuras, é possível descortinar um pouco a mitologia alimentada a respeito de Iberê. Esboços e estudos com indicações de cor e composição anotadas a lápis deixam claro que Iberê não era um artista totalmente dado ao acaso. Havia algum planejamento, um pensamento anterior às figuras que depois o artista construiria na tela em uma quase performance, marcada por gestos espontâneos e acúmulo e retirada de grandes camadas de tinta, no seu processo experimental de construir e desconstruir a imagem.
*O jornalista viajou a convite da Fundação Iberê Camargo