
Até a noite de 30 de agosto de 2013, Porto Alegre contava com 12 Steinway & Sons D Concert Grand, considerado o melhor piano do mundo: dois no Theatro São Pedro, dois no Instituto de Artes da UFRGS, dois no Teatro do Sesi, um no Salão de Atos da UFRGS, um no Salão de Atos da PUCRS, um no auditório do Cultural Brasileiro-Norte-Americano, um com a Ospa e dois em endereços particulares. Na madrugada do dia 31, o rompimento do dique do Arroio Feijó, na Zona Norte, alagou o subsolo do palco do Teatro do Sesi, onde estavam os dois flamantes Steinway mais um belo Yamaha de ¾ de cauda. Os três apareceram boiando, sem chances de recuperação. O teatro foi imediatamente interditado, e os shows, cancelados, com ampla divulgação. Mas a Fiergs preferiu calar sobre a morte dos pianos, adquiridos durante a gestão do pianista Miguel Proença como diretor-artístico do teatro (1999 - 2004), ao custo de US$ 200 mil cada. Até hoje poucos sabem disso, como atesta o espanto de um notável do Instituto de Artes ao tomar conhecimento do fato, dias atrás.
Proença, que vive no Rio, diz ter sabido pelo telefonema de um amigo - e que ficou estarrecido.
- Foi uma das maiores tragédias da história de Porto Alegre na área da cultura. Não entendo o silêncio do teatro. Senti uma dor forte, muitos grandes artistas imprimiram seu som naqueles pianos, me deprimo em pensar que morreram.
O engenheiro de som Marcos Abreu, responsável pela maioria das gravações de música erudita no Estado, pondera que "perder assim três pianos é um assunto complexo". E lembra: sempre que músicos tentaram utilizar os Steinway do Sesi para gravações, nunca obtiveram permissão.
- Agora estão lá, inutilizados.
Entre os artistas que deixaram sua marca nos Steinway, Proença e Abreu mencionam em primeira memória os internacionais Nelson Freire e Martha Argerich, que fizeram um inesquecível concerto em 1° de outubro de 2004, tocando em duo de pianos - inclusive nas seis vezes (!) que tiveram de voltar ao palco, por imposição do público.
Como entidades vivas, os Stein­way do Teatro do Sesi eram únicos, lembram Abreu e o técnico em afinação de pianos Person Losekann, credenciado pela Steinway & Sons para o sul do Brasil e conhecedor de todos os existentes na cidade. Proença foi escolhê-los diretamente na fábrica alemã, em Hamburgo. Eles asseguram ser raro um teatro ter pianos gêmeos, como esses que morreram há quase um ano, e eu acho que ele está coberto de razão ao sofrer por eles como se fossem filhos.
Proença também lamenta que seus projetos, como os ensaios abertos, os concertos para crianças e a série Concertos Sesi, tenham sido interrompidos "por decisão de algum burocrata". Mas nem tudo está perdido. Maurício Duval Macedo, gerente-geral do Centro de Eventos Fiergs, responsável pelo Teatro do Sesi, revela que esteve em Hamburgo, que está em processo a compra de um novo Steinway para o teatro e que projetos como os Concertos Sesi serão retomados.
Lançamentos
> Nazareth Revisitado, de João Carlos Assis Brasil
O internacional pianista carioca volta a um de seus autores favoritos. Especialista em Villa-Lobos, Assis Brasil atua com igual excelência tanto na música erudita quanto na popular - e Nazareth (1863 - 1934) situa-se na intersecção das duas. O álbum tem Batuque, Coração que Sente, uma suíte com Brejeiro/Faceira/Apanhei-te Cavaquinho, outra com Quebradinha/Ouro Sobre Azul/ Escovado/Até Quem Enfim/Atlântico e três arranjos para piano e voz: o paulista Carlos Navas canta Bambino (letra de Zé Miguel Wisnik) e Odeon (letra de Vinicius de Moraes), a eterna Alaíde Costa canta Sertaneja (letra de Catulo da Paixão Cearense, feita com Nazareth ainda em vida). Tratore, oito faixas, R$ 25 (em média)
> 2 Mares, de Kátya Teixeira e Luiz Salgado
Este é um belíssimo álbum de música ecológica. Quarto disco da paulista Kátya, terceiro do mineiro Salgado (ambos cantores, compositores e instrumentistas), pela primeira vez juntos, reúne canções deles, do folclore, de artistas populares, do português José Afonso. Do mergulho no Brasil profundo trazem histórias e esperanças. Algumas faixas: Vinde Meninas (folclore, MG), Mineira (folclore, BA), Deusa da Lua (folclore, AL) e Eu Subi Lá no Alto do Tempo (tema dos índios Xocó, SE). Tem chula, folia de reis, moda de viola, tocados com viola de cocho, viola caipira, rabeca, percussão. Entre os convidados, a cantora portuguesa Susana Travassos. Tratore, 16 faixas, R$ 30 (em média)
> Macumba pra Bacana, de Lunar & Cia de São Jorge
Da praia do Cassino, onde vive e é médico, o cantor, compositor e violonista Lunar (pseudônimo de Leonardo Bulcão) observa o mundo e se diverte misturando sons. Neste segundo disco, confirma sua competência de cancionista, com letras muito boas e abrangência de ritmos. Quem Faz o Som começa funkeada e passa para um afoxé, com guitarra distorcida e citação de Hermeto Pascoal; A Costa Brava tem violão, efeitos e um bombo leguero gaúcho; em inglês, Sorry Mama é um blues; Nova Bossa cruza samba com reggae; Olho de Gata é pop rock; Payada Yupanqui tem milonga e pop. Lunar canta bem, acompanhado por músicos de qualidade. Independente, 11 faixas, R$ 20