Cultura e Lazer

Sem essa aranha

"O Homem Duplicado" mostra em tom de suspense fantástico saga de professor em busca de seu sósia

Filme dirigido pelo canadense Denis Villeneuve adapta livro lançado em 2002 pelo escritor português José Saramago

Marcelo Perrone

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imagem filmes / d
Jake Gyllenhaal estrela o filme dirigido pelo canadense Denis Villeneuve

José Saramago (1922 - 2010) era bastante criterioso na liberação de sua obra para o cinema, por reconhecer a dificuldade que o universo e a prosa peculiares de seus livros impunha aos roteiristas. O escritor português, porém, ficou satisfeito com o resultado obtido por Fernando Meirelles em Ensaio sobre a Cegueira (2008) e liberou, pouco antes de morrer, os direitos de adaptação de O Homem Duplicado para o mesmo produtor, o canadense Niv Fichman.

Por sua vez, Fichman entregou o projeto para o compatriota Denis Villeneuve dirigir, logo após a consagração deste com o drama Incêndios (2010), que concorreu ao Oscar de filme estrangeiro. Missão espinhosa que Villeneuve cumpriu com empenho, sobretudo no clima de progressiva tensão psicológica que extrai do drama do professor Adam Bell (Jake Gyllenhaal), que descobre, ao assistir a um filme, ter um sósia entre os atores.

Obstinado em saber mais sobre seu duplo, Adam chega a Anthony St. Claire (Gyllenhaal também) e enxerga nele um impressionante reflexo físico de si mesmo.As implicações psicológicas desse encontro são distintas. Adam é um sujeito metódico, preso a uma rotina sem maiores emoções e em um relacionamento prestes a ruir. Cruzar com seu doppelgänger o desestabiliza emocionalmente. Já Anthony, sujeito extrovertido e vaidoso, parece estimulado com a revelação, que se dá em um momento de crise no casamento com a mulher grávida.

A eficiente encenação proposta por Villeneuve estimula o espectador a refletir sobre questões que vão da crise de identidade do homem em uma sociedade na qual a individualidade se dilui em sonhos, frustrações e costumes padronizados à projeção que se faz ao ambicionar ter a vida de outro.

Anthony e Adam, nesse sentido, poderiam ser a mesma pessoa lidando com as escolhas feitas, um querendo impor diante do outro o caminho escolhido? Não espere explicações. Ao contrário, O Homem Duplicado mais intriga do que esclarece ao abrir portas do universo surreal e colocar enigmáticas aranhas pontuando a narrativa até o desconcertante desfecho.

É um filme estranho, que transita entre a representação alegórica de uma realidade opressiva e distorcida e um plano onírico no qual se projetam desejos e delírios. O resultado agradou à viúva de Saramago, Pilar del Rio, que, após uma sessão de lançamento em Madri, disse: "O leitor talvez não encontre o livro, mas José Saramago está dentro deste filme".

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