Logo depois de o país receber a notícia da queda do avião que levava o presidenciável Eduardo Campos e sua equipe, uma jornalista amiga se queixou da estupidez de alguns comentários que caçoavam da morte do ex-governador de Pernambuco. Outro jornalista, Leonardo Sakamoto, que tem um blog muito acessado no UOL, logo postou um texto que trazia a mesma indignação com gente que lamentava a morte do "político errado', que insinuava que Dilma ou Aécio seriam responsáveis pelo acidente ou que se diziam satisfeitos, porque se tratava, afinal, de "só mais um político".
(Antes de prosseguir, que fique claro: não sou ou fui ou serei eleitora de Campos nem de Marina Silva. Sigo.)
Tragédias como essa costumam despertar nas pessoas comoção e solidariedade. É bom que assim seja, porque uma marca de saúde mental é justamente a capacidade de empatia com o sofrimento alheio. O princípio é simples: o reconhecimento do outro leva à percepção da própria individualidade, e a compreensão de seu sofrimento é o momento de reconhecer, em todos, a instabilidade da condição humana. Agir fora desse script demonstra, se não uma psicopatia sádica, pelo menos o embrutecimento das relações e a penúria a que se reduziram os sentimentos essenciais. Desrespeitar o luto é não respeitar a própria morte.
Não que as piadinhas com a morte de Eduardo Campos cheguem a surpreender: o que tenho visto de barbaridades é estarrecedor. Iniciando por desdém e zombarias relativos a paciente oncológico, passando por xingamentos e pichações racistas e antissemitas, o que me tocou de maldade no mundo sugere que há um caldeirão de ódio borbulhando, uma sopa de inveja e recalque que faz com que muitos se revelem monstruosos. Se o objetivo da educação é que o indivíduo viva em sociedade e não ceda aos instintos e pulsões básicas, então a educação falhou: o mundo anda cheio de neandertais cujo grande argumento é o tacape.
No caso de Campos, alguns tentam salvar a pátria dizendo que as reações engraçadinhas se devem ao "cansaço com os políticos" ou que as piadas servem para amenizar o drama. Nada disso é verdade, simplesmente porque nenhum tipo de cansaço autoriza a zombar da morte e porque o humor, aquele que alivia, é a expressão máxima da inteligência e não do barbarismo. Até prova em contrário, todos aqueles a quem falta empatia e respeito pelo sofrimento do outro estão condenados à falta de transcendência, de piedade e de amparo.
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Coluna
Cíntia Moscovich: Psicopatas à solta
A colunista escreve quinzenalmente no 2° caderno
Cíntia Moscovich
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