
Autora do livro Descobrindo o Irã, a crítica de cinema Ivonete Pinto avalia Cortinas Fechadas, filme de Jafar Panahi que estreia nesta terça-feira, com sessões às 15h, na Sala P.F. Gastal da Usina do Gasômetro, em Porto Alegre. Confira:
Jafar Panahi é um dos cineastas iranianos com maior visibilidade fora do seu país. Assume-se como um militante, que faz cinema-denúncia para contestar o regime dos aiatolás. Em 2001, quando o entrevistei no Farj Film Festival, de Teerã, o governo havia pedido que ele fizesse nada menos do que 18 cortes em O Círculo (2000). Ele não cedeu, o filme ficou censurado, e depois disso sua relação com o regime só piorou, culminando com a condenação a seis anos de prisão e 20 anos sem poder filmar e sem poder sair do Irã.
Mas, além de não estar cumprindo a pena (desloca-se livremente, ao menos no país), tem conseguido produzir e por meio de amigos faz os filmes chegarem ao Exterior. A pergunta que fica é: o cinema de Panahi tem evoluído? Seus primeiros longas, em especial o inventivo O Espelho (1997), distanciam-se gradativamente das propostas de O Círculo, passando por Fora do Jogo (2006), Isto Não É um Filme (2011) até Cortinas Fechadas (2013).
A opção pela denúncia bruta, recheada de ingredientes que estão no enredo só para "causar", esvazia um projeto estético mais arrojado. Filme a filme, estamos vendo uma progressão de alegorias que perdem a força por esbarrarem no óbvio. Em Isto Não É um Filme, ainda tínhamos a novidade de uma obra nascida do esforço desesperado de filmar, rodado nos limites do seu apartamento. Ali, forjava uma narrativa documental em torno de seu encarceramento.
Já em Cortinas Fechadas, um escritor se esconde com seu cachorrinho em uma casa de praia, fugindo de algo que não fica claro. O cão é animal interdito por ser impuro (não está no Corão, mas na tradição islâmica). Inserido no filme, redunda em um claro exagero, pois muitas famílias possuem cães hoje no Irã e elas não precisam se trancar em casa. Nesse cenário, Panahi introduz outros personagens também fugindo de algo, como a mulher suicida, sendo que o suicídio também é um interdito no Islã, mas explorado com mais inventividade pelo diretor Abbas Kiarostami em O Gosto de Cereja (de 1997).
Naturalmente, para quem não concorda com regimes opressores, seja qual for a cor do turbante, é legítimo e louvável que Panahi faça filmes de denúncia, inconformados e rebeldes em relação à falta de liberdade no Irã. No entanto, na perspectiva da arte, se continuar assim, seus filmes ficarão apenas datados e reconhecidos pela falta de imaginação.