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*De São Paulo
Em tempos de juízes dominando as manchetes dos jornais e sendo aclamados por muitos brasileiros como heróis nacionais, a estreia de Em Nome da Lei até parece golpe oportunista: no novo filme do diretor Sergio Rezende, o ator Mateus Solano encarna um jovem e arrogante magistrado federal que chega disposto a desmantelar uma máfia imperando há anos na fronteira do país com o Paraguai.
Ainda que a produção do longa em cartaz a partir desta quinta nos cinemas da Capital tenha começado antes da atual febre popular em torno de juízes e suas decisões ousadas, Em Nome da Lei tem inspiração na realidade: Odilon de Oliveira, juiz federal de Campo Grande conhecido por sua atuação na fronteira paraguaia – onde condenou 120 traficantes e confiscou mais de R$ 2 bilhões do crime organizado –, serviu de modelo para o personagem Vitor, além de ter sido consultor durante a produção do thriller.
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Veja entrevista com Sergio Rezende e Chico Diaz
– Ele foi o ponto de partida. Há uns quatro ou cinco anos, vi uma matéria sobre o Odilon, que enfrentou os reis da fronteira, e achei uma história incrível. Aquela região é uma parte do Brasil que a gente conhece pouco e que quase não é mostrada no cinema nacional. Me encontrei com o Odilon em Campo Grande e também falei com os policiais federais que fazem a escolta dele. Depois, à medida que a gente ia escrevendo o filme, a história foi se distanciando dos fatos ocorridos. Em Nome da Lei é um apanhado de casos que o Odilon me contou, que outras pessoas me contaram e que eu imaginei – explicou Rezende em entrevista durante o lançamento do filme para a imprensa, no último dia 11, em São Paulo.
Na trama de Em Nome da Lei, o novato juiz conta com o apoio duas pessoas de confiança: Alice (Paolla Oliveira), jovem procuradora de Justiça, e Elton (Eduardo Galvão), policial federal que lidera uma equipe na região. Os três irão arriscar as próprias vidas na missão de acabar com o esquema de contrabando e tráfico de drogas controlado pelo chefão Gomez (Chico Diaz), que conta com a conivência do poder público brasileiro e o apoio de criminosos paraguaios e de outros países.
– Fui atrás do que move o Vitor. Ele é um juiz vaidoso, que acha que vai resolver tudo, e se surpreende com a realidade. Ele traz a impetuosidade da juventude, mas também a arrogância e a pressa. Porém, só depois que aprende a trabalhar em equipe e ouvir os outros é que ele chega perto dos seus objetivos. Ele é movido por sede de justiça, mas também por vaidade – resumiu Solano, atualmente na novela Liberdade, Liberdade na pele do vilão José Maria Rubião.
Em paralelo ao enredo policial, Em Nome da Lei acompanha três romances: o conturbado casamento do piloto de avião que trabalha para o tráfico Cebolinha (Silvio Guindane) com uma piriguete (Carolina Chalita), a paixão proibida do bandido Hermano (Emilio Dantas) com a filha do patrão Luna (Juliana Lohmann) e o relacionamento que nasce entre Vitor e Alice.
– A Alice já vive na região há mais tempo e está meio desiludida com tudo. Chega então o Vitor cheio de vontade, mas a Alice e o Elton questionam até que ponto ele, em sua busca por justiça, está certo ou errado, até onde vai a ética. Acontece o romance entre eles, mas a Alice e o Vitor são muito mais ligados pelo ideal e pelo trabalho, por essa energia nova que o Vitor traz – disse Paolla, que interpretou em Amor à Vida a irmã de Felix, personagem de Mateus Solano na novela.
* O repórter viajou a convite da Morena Filmes
Entrevista com Sergio Rezende
O currículo de Sergio Rezende é pontuado por filmes ambiciosos, tanto do ponto de vista temático quanto de produção, como Guerra de Canudos (1997) e Mauá – O Imperador e o Rei (1999). Filho de juristas, o diretor e roteirista fala nesta entrevista sobre seu novo longa.
Que filmes inspiraram você na criação de Em Nome da Lei?
Me inspirei em faroestes clássicos em que o Clint Eastwood chega na cidadezinha trotando no seu cavalo e defronta com o mundo do crime. Mais especificamente, em O Homem que Matou o Facínora (de John Ford), em que o James Stewart é um advogado do Leste, cheio de boas ideias, que chega no Oeste e encara aquele mundo. Também dialoga com O Homem da Capa Preta (1986), que foi meu segundo filme (sobre Tenório Cavalcanti, polêmico advogado e político da Baixada Fluminense que andava armado com uma submetralhadora). Tenho procurado fazer um cinema que tem um lado de entretenimento ao mesmo tempo em que procuro fazer uma reflexão sobre o Brasil.
Como você imagina que o público vai interpretar seu novo filme?
As pessoas às vezes ficam só na superfície. Quando eu fiz o Capa Preta, eu era um cineasta de direita porque o Tenório era de direita. Depois, quando fiz o Lamarca (1994), eu era um esquerdista. Quando eu fiz o Mauá, eu era um cineasta capitalista. Com o Zuzu Angel (2006), voltei a ser comunista. E no Salve Geral (filme de 2009 sobre os ataques da facção criminosa Primeiro Comando da Capital em São Paulo, em 2006), virei cineasta bandido (risos). Em Nome da Lei é um filme oportuno, não oportunista. O filme faz essa pergunta: qual é o preço da justiça? Tem ainda outra questão: a lei ou a justiça? Elas deveriam caminhar juntas, mas nem sempre é assim.
Você pode falar de seu próximo projeto?
Estou trabalhando em um filme chamado Sertão Sertões. Não é bem um documentário, mas estou refazendo as viagens de Euclides da Cunha, quando ele foi para a Guerra de Canudos, e a grande viagem a cavalo do Guimarães Rosa que o inspirou em Grande Sertão: Veredas.