A primeira semana de 2015 já se esvaía no calor praiano da Baixada Santista, e as negociações pareciam travadas nos gabinetes da Vila Belmiro. Foi quando o agente de Ricardo Oliveira, Augusto Castro, já desgastado, radicalizou. Pegou uma folha em branco, assinou e entregou para o superintendente de futebol, Dagoberto Santos.
- Pronto, coloca aí quanto você acha que deve pagar para o Ricardo Oliveira por quatro meses de contrato. Pode ser um salário mínimo.
Dagoberto se assustou. Alegou carecer de parâmetros. O volante tricampeão do mundo Clodoaldo entrou no circuito:
- Vamos combinar assim, R$ 50 mil por mês.
Augusto sorriu. Não blefava quando havia falado em um salário mínimo. Além disso, atendia ao desejo do seu cliente. Ricardo Oliveira estava determinado a jogar no Santos para cumprir um pedido do filho, Anthony, 12 anos, Mesmo nascido na Espanha, o guri é santista roxo.
Tão logo fechou o negócio, o agente avisou os representantes do clube:
- Deixem pronta a renovação que o momento dele em abril vai ser outro.
O Santos relutou mesmo em acertar com Ricardo Oliveira. Havia dirigentes, entre eles o próprio Dagoberto, desconfiados da contratação de um centroavante à época com 34 anos, sendo os últimos cinco deles nos Emirados Árabes. Augusto estava convicto do sucesso. Ricardo Oliveira havia desembarcado em São Paulo em agosto, com a rescisão no Al Wasl na bagagem. O agente e seus sócios na Goal Sport Promotion, Oldegard Filho e Caio Ziller, sentaram-se com ele e traçaram um projeto para recolocá-lo no mercado brasileiro. Nada de acerto imediato. O centroavante faria um período de preparação antes de ser oferecido a grandes clubes.
Assim, Ricardo Oliveira passou a treinar em casa. Melhor, na academia que montou na garagem de sua mansão em Alphaville, na Grande São Paulo. Os equipamentos, parte deles importados, em nada perdem para grifes famosas de fitness. Sob orientação de um personal trainner, intercalava exercícios aeróbicos, treinos de força e aulas de boxe e jiu-jitsu. O centroavante segue a linhagem do amigo Zé Roberto. É obcecado por manter a forma física. Foi por isso que, mesmo depois de cinco anos no futebol árabe, onde os treinos são mais leves, conseguiu se manter em alto nível. Em Abu Dhabi, em horários alternativos, complementava o trabalho com sessões no ringue ou no tatame.
Desempenho pelo Santos garantiu retorno à Seleção
Foto: Leo Correa/Mowa Press
- Ele segue com treinos de boxe e jiu jitsu, agora menos. Diz que o boxe ajuda no movimento do tronco na hora do cabeceio, e o jiu-jitsu, a se levantar mais rápido dentro da área - conta Castro.
Ricardo Oliveira se apresentou ao Santos a tempo de fazer as avaliações físicas e médicas com os demais. O grupo foi levado a um hospital da capital paulista, endereço também dos exames do Palmeiras. Foi o último de um pelotão de 78 jogadores. Resultados à mão, o médico chamou o staff do jogador:
- Tem como repetir os exames?
- Há algum problema com o Ricardo, doutor? - sobressaltou-se seu agente.
- É que bati esses resultados com os exames que ele fez aqui em 2006. Esses de agora estão melhores.
Não só os exames apontam um Ricardo Oliveira melhor. Os gols também. Com os dois sobre o São Paulo, na quarta-feira, chegou aos 33 em 2015 e igualou sua maior marca na carreira, alcançada na temporada 2011/2012, pelo Al Jazira. A volta ao país é marcada pela excelência. Foi craque e goleador do Paulistão, com 11 gols. No Brasileirão, já conta 19 - sete a frente de Pratto e Jádson. Tanta eficiência rendeu a volta à Seleção depois de oito anos. Entrou na derrota para o Chile e começou como titular contra a Venezuela, pelas Eliminatórias. Fez um gol e ganhou a confiança de Dunga. Tanto que o técnico telefonou dias depois:
- Conto contigo.
Nos bastidores da CBF corre que, aos 35 anos, o centroavante desponta como a liderança que faltava. A eloquência aprendida em oito anos como pastor evangélico, a postura irretocável fora de campo e a eficiência dentro dele o ascenderam rápido como referência nesta jovem Seleção. Em 2018, na Copa da Rússia, terá 38 anos. Mas ninguém duvida mais de que estará lá, como centroavante do Brasil.
*ZHESPORTES
