
Porto Alegre teve um dia, uma vez, que foi chamado de "Dia da Copa". Era o 31 de maio de 2009, um domingo na mesma estação em que estamos - mas diferente deste. O Dia da Copa de 2009 era uma licença publicitária criada pelo governo estadual e pela prefeitura, que montaram um palco com telão no Parque Farroupilha para 3 mil pessoas acompanharem o anúncio, nas Bahamas, de Porto Alegre como uma das 12 cidades-sede do Mundial de 2014.
O verdadeiro Dia da Copa em Porto Alegre é este domingo, 15 de junho de 2014. É o dia em que os 3 mil interessados na Redenção de cinco anos atrás serão 42 mil no Beira-Rio e outros tantos milhares espalhados pela Capital. No mesmo Parque Farroupilha estarão centenas deles, caso faça o sol que prometia a previsão do tempo na sexta. Em cafés, em bares, na fan fest à beira do Guaíba, nas casas cheirando ao churrasco de mais cedo: será difícil passar incólume à notícia de que a Copa aterrissou aqui.
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É por isso que França x Honduras será bem mais do que 22 caras correndo num campo. Para vê-los, o Brasil fechou, em 2007, um contrato com a Fifa cujo impacto deixa poucos indiferentes. Gerou R$ 28 bilhões em investimentos. Turbinou as manifestações que sacudiram junho de 2013. Todos têm opinião sobre a Copa, porque a Copa mexeu com a vida da sociedade. Porto Alegre fechou contratos de R$ 888 milhões para obras viárias na cidade, há décadas imaginadas, porque em um dia de 2009 seus gestores sentaram em frente à então ministra de Lula, Dilma Rousseff, e listaram tudo o que a cidade precisava.
- Mas metrô? Metrô não fica pronto para a Copa - argumentava a hoje presidente ao hoje prefeito José Fortunati.
Não entrou o metrô, mas entraram 15 obras, entre viadutos e duplicações, que receberam financiamento a juro camarada por uma linha disponibilizada pela União para cidades da Copa. Quatro estão prontas, e as outras ficam como legado, diz o prefeito:
- Nenhuma cidade conseguiu tantas obras quanto a nossa. Não temos um tostão aplicado em estádios, só em investimentos que ficam para a população.
É uma forma de ver. Outra é olhar para o baixo percentual de prazos cumpridos nos projetos. Uma terceira maneira de enxergar a Copa é perguntar-se por que foi preciso um evento de futebol para surgir dinheiro à infraestrutura. Ainda outra é estranhar a quantidade de polêmicas envolvendo a reforma do Beira-Rio, as estruturas temporárias, o entulho.
Neste domingo, esses olhares estarão virados para a Avenida Padre Cacique, à beira de um Guaíba iluminado. Ao mirar o Beira-Rio que recebe os jogadores de França e Honduras, se vai enxergar o resultado de sete anos de expectativa. O Mundial que foi feito do nosso jeito: muito discutido, bastante improvisado, um pouco errado, no fim, acertado.
A Copa de Porto Alegre. Hoje é o dia dela.
Confira o caminho até a Copa:
2007
O SONHO
No dia 30 de outubro de 2007, o presidente da Fifa, Joseph Blatter confirmou o Brasil na Copa. Naquele dia, os gaúchos começaram uma mobilização para trazer o evento: foi formado um comitê com a participação da prefeitura, do Estado e da sociedade. A promessa era um Beira-Rio reformado até o início de 2012 como sede.
2009
A EUFORIA
Mesmo tida como certa no Mundial, pela importância no futebol, Porto Alegre respirou aliviada quando foi confirmada, em maio. O prefeito da época, José Fogaça, ajudou a governadora de então, Yeda Crusius, a levantar uma taça de brinquedo em uma mini fan fest montada na Redenção. A Copa traria obras públicas - em dezembro do mesmo ano, a cidade mandou a lista ao governo federal -, programas de qualificação, turistas.
2010
AS PROMESSAS
Em julho, clubes e governos estaduais, municipais e federal assinam a Matriz de Responsabilidades, documento que definia o que seria feito em cada cidade-sede para a Copa. O Beira-Rio começa a ser reformado, em um projeto do Inter que envolvia recursos próprios e venda de camarotes. No fim do ano, a arquibancada inferior começa a ser demolida.
2011
O IMPASSE
Em junho, o Inter interrompe as obras no Beira-Rio e começa a estudar uma parceria para concluir a reforma para a Copa. Durante meses, o clube discute com a construtora Andrade Gutierrez o acordo. Enquanto isso, a Fifa desiste de esperar por um acerto e exclui a cidade da Copa das Confederações - apesar de não ter oficializado, a entidade mantinha Porto Alegre em todas as pré-listas para o evento, considerado uma prévia do Mundial.
2012
A TENSÃO
No verão de 2012, Porto Alegre quase perdeu a Copa. O Beira-Rio seguia sem obras e o acerto entre Inter e Andrade Gutierrez não acontecia. O desinteresse da construtora foi contornado em uma operação que envolveu a presidente Dilma Rousseff, a parceria foi assinada e, em 20 de março, as obras no estádio colorado foram retomadas. A promessa era a entrega até dezembro do ano seguinte.
2013
O PRAGMATISMO
O ano anterior à Copa foi o momento de cair na realidade: não somos a Alemanha. Nas obras de mobilidade urbana, os cronogramas tornaram-se impossíveis de serem cumpridos e, para não perder os financiamentos com juros mais baixos, a prefeitura retirou as obras da lista de Copa. Concentrou-se em terminar o essencial para receber os jogos: o entorno do estádio e o caminho até o Centro.
2014
ESFORÇO PARA ANIMAR
De ressaca das manifestações de 2013, Porto Alegre manteve-se muito distante da euforia de Copa sentida em 2009. Os questionamentos foram turbinados por discussões surreais: a dois meses do Mundial, não se sabia quem pagaria as estruturas temporárias do Beira-Rio. Só na abertura da Copa, com a fan fest e a chegada de estrangeiros, o clima começou a mudar.