
Qualquer gremista conhece Guilherme e Matheus Biteco - mas é apontando para Gabriel, o caçula de 13 anos, que o pai emprega um tom de alerta na voz:
- Esse é um Ronaldinho melhorado.
Verdade ou não, o empresário Jorge Machado, um dos mais poderosos do país, não ousaria discordar. Em troca do vínculo com os três garotos, ele acomodou a família em um apartamento espaçoso no bairro Menino Deus, em Porto Alegre, decidiu pagar uma mesada generosa para o pai, presenteou os irmãos mais velhos com dois Hyundai i30 - embora Matheus, de 17 anos, nem tenha idade para dirigir - e consolidou na residência um padrão de classe alta.
- O que a gente precisa, o Machado dá - assegura a mãe, Tatiane Bittencourt da Silva, mostrando fotos da acanhada casa de madeira onde as crianças cresceram.
Naqueles tempos de vida dura, ela fazia faxinas enquanto o marido, pai dos guris, entregava água mineral em armazéns da cidade. Na verdade, mais do que entregador, Jorceli da Silva foi feirante, servente de obras, hidráulico e até garçom de cabaré. Aliás, a dona do bordel, a famosa Tia Carmen, chegou a agenciar os garotos por um tempo, mas logo passou o bastão para Machado.
Em vídeo, os pais contam a trajetória dos Biteco:
Hoje, nem o pai nem a mãe estão empregados: vêm se dedicando a gerenciar a casa e a cuidar da filharada - em meio ao trio gremista, chama a atenção a bela Gabrielle, de 15 anos, a única colorada entre eles.
- Só falta dizer que ela também joga bola - questiona o repórter.
- Olha, por enquanto não - brinca Jorceli, mas a garota interrompe.
- O meu sonho é ser modelo - esclarece, do alto de seu 1m74cm.
Ninguém deprecia as ambições de Gabrielle. Afinal, em uma família na qual nada menos que três filhos despontam como promessas do futebol, o que mais poderia surpreender? Jorceli lembra do sábado em que Guilherme Biteco, hoje aos 19 anos, e o irmão Matheus foram descobertos. Jogavam futebol de salão em uma quadra na zona norte da Capital, perto de casa - o mais velho tinha sete anos, e o outro tinha quase seis -, quando um olheiro do Grêmio tocou o ombro do pai: queria que os filhos fizessem um teste no clube. Na segunda-feira foram aprovados.
Passaram-se dois anos e Jorceli, asfixiado pela falta de dinheiro, não podia mais pagar passagens para familiares levarem e buscarem os meninos na escolinha. Era hora de ensiná-los a ir sozinhos, pegar dois ônibus na ida, outros dois na volta, caminhar até a parada, caminhar até a escolinha.
- Eu passava o dia entregando água mineral e pensando neles. Minha aflição só acabava no início da noite, quando os dois chegavam em casa - recorda o pai.
Na primeira semana, mesmo com os filhos orientados, Jorceli seguia os meninos sem que eles vissem - queria ter certeza de que acertariam o trajeto. Um dia, Matheus virou para trás e, com a segurança de seus oito anos, disse bem alto:
- Pai, tá tudo bem. Pode ficar tranquilo.
E tudo deu certo. Deu tão certo que agora, com uma vida que a própria Tatiane, a mãe, classifica de "bem confortável", a família debate o local onde comprará a primeira casa própria. Guilherme Biteco, o primogênito, havia sugerido nas proximidades da Arena.
- Eu prefiro na Zona Sul, lá em Ipanema - avisa o pai.
- E eu queria por aqui mesmo, onde já moramos - retruca a mãe.
Gabriel, o caçula, fica quieto. É sempre meio quieto, mas porque quer. Já Guilherme e Matheus, por normas internas do Grêmio, são proibidos de falar - só foram autorizados a posar para a foto desta reportagem.
Ao juntar-se aos irmãos na hora do retrato, em frente à comprida piscina do condomínio, brotou do mais novo uma das poucas frases que se ouviu dele:
- Eu sou muito fã dos dois.
O martírio do pênalti
Foto: Mauro Vieira

Quando Guilherme Biteco se encaminhou para bater o último pênalti contra o São Luiz, na segunda-feira passada, o pai e o irmão mais novo sentiram o corpo petrificar nas tribunas da Arena.
A mãe, que ficara em casa com a filha, ajoelhou-se em frente à TV de 42 polegadas, agarrou seu terço com as duas mãos e pôs-se a chorar. O outro irmão, Matheus Biteco, assistia à cena à beira do gramado, abraçado aos colegas.
Guilherme chutou no ângulo, classificando o Grêmio para a semifinal do Gauchão.
Alemanha no aguardo
Embora 70% dos direitos econômicos de Guilherme Biteco já pertençam ao Hoffenheim, nem o próprio meia sabe quando partirá para a Alemanha. Pode ser no meio deste ano, no início do próximo, talvez só na metade ou no fim de 2014.
O certo é que a namorada - Renata, 24 anos - vai acompanhá-lo. Juntos há quase dois anos, eles se conheceram porque a garota é irmã da mulher de Fernando, volante do Grêmio e amigo de Biteco.
Assis é ídolo na família
Sempre que pode, a família inteira repete agradecimentos ao ex-jogador Assis Moreira, irmão mais velho e empresário de Ronaldinho. Quando crianças, Guilherme e Matheus Biteco jogavam na escolinha do Grêmio com o filho de Assis. O empresário, compadecido com a condição financeira dos meninos, dava-lhes chuteiras, roupas, cestas básicas e passagens de ônibus.
- Nunca pediu nada em troca. Quando Gabriel operou as amígdalas, aos 10 anos, ele pagou a cirurgia - conta a mãe, Tatiane.