Há no mundo uma pressão por certezas. E ela não é nem um pouco sutil. Trata-se de uma patrulha constante que exige convicção permanente. Clama-se, hoje ainda, por toda a lógica desde talvez o Iluminismo do Século XIX. Nada que a psicanálise do século XX pudesse deter. É preciso opinar, saber, conhecer, mesmo que pelo menos a metade de nós seja fabuladora e mística.
Por isso, não saber não é bem vindo. E, para a ignorância, inclusive, cunhou-se a expressão "em cima do muro". Muro evoca excluir, apartar, tudo de pior para o nosso imaginário ocidental industrial. É preciso saber, opinar, conhecer para sermos reconhecidos pelo outro. E sabemos que há aplausos quando os muros caem.
Mas o que fazer quando - e é quase sempre - ainda não sabemos? E com o fato de que todo conhecimento apreendido prescreve no instante seguinte?
Um psicanalista iluminado, o Bion, valorizava a capacidade de não saber e sugeria aguentar isso enquanto fosse necessário. Assim, nós todos viveríamos melhor. Chamou essa capacidade de negativa, embora ela seja tão positiva. Fora o Bion, desconheço outros defensores ferrenhos de uma ignorância.
Para piorar, somos humanos, ou seja, sempre com dois lados no mínimo. A vinda de Felipão para o Grêmio não escapa disso, e o treinador já chega espremido pela realidade e a ilusão. No mínimo.
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A realidade conta que estamos diante de um profissional que acaba de demonstrar o quanto está desatualizado. E o quanto não acompanhou nem soube mudar junto com as mudanças do mundo (do futebol).
A ilusão conta que se trata de um dos maiores vencedores do Grêmio e do futebol mundial, um supercampeão da América ao mundo, já acolhido por times e seleções de ponta do futebol europeu.
A realidade conta que o tempo passou.
A ilusão conta que a vida recomeça a cada dia.
A ilusão com frequência é tragada pela realidade.
A realidade com frequência é movida pela ilusão.
Acreditar no sucesso de Felipão no Grêmio é brigar com a realidade. Não convém.
Não acreditar no sucesso de Felipão no Grêmio é brigar com a ilusão. Não convém.
* De segunda-feira a sábado, a seção De Fora da Área debate futebol e outros esportes, com novos nomes e ideias em Zero Hora.
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