
Houve um tempo em que o futebol inglês era famoso pelo "chuveirinho". Sem grandes recursos técnicos, eles mal cruzavam o meio-campo e mandavam cruzamentos e chutões a esmo para a área adversária. Acredite. E esse modo de jogar futebol marcou por anos e anos os times e a seleção da Inglaterra. A partir de 1992, com a criação da Premier League, e a consequente abertura do mercado para os jogadores estrangeiros, tudo mudou. Hoje, até o pior time da Primeira Divisão inglesa tem um toque de bola melhor do que qualquer time do Brasil.
O atual Inter parece viver na Inglaterra pré-Premier League. Contra o ABC, foram 42 bolas levantadas para a área – 35 delas erradas, segundo o apontamento do Footstats. Resultado: muito esforço para apenas um gol – de William Pottker, em cruzamento de Uendel. Tantos erros, porém, levaram o Inter e um preocupante empate com o ABC, que terminou em vaias no Beira-Rio, com pedidos de parte da torcida pela demissão do técnico Antônio Carlos Zago.
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– Acima de 30 cruzamentos por jogo, a chance de vencer a partida é de apenas 10% – destaca Gustavo Fogaça, analista de desempenho da Rádio Gaúcha, amparado por mais de duas décadas de estatísticas de empresas que acompanham os principais torneios da Europa. – O cruzamento é um lance aleatório. Muitas vezes o cruzamento pode ser bom e não ter ninguém posicionado na área ou posicionado no lugar errado. O que vem ocorrendo no Inter é que parece uma obrigação jogar a bola para a área. se isso faz parte de um plano tático, ele pode estar errado – argumenta Fogaça.

O curioso é que, diante do Londrina, na goleada por 3 a 0 que abriu a campanha do Inter na Série B, foram feitos míseros 15 cruzamentos. Doze deles foram errados. Mas, como a equipe resolveu a partida ainda no começo do segundo tempo – aos 3min o jogo já estava 2 a 0 para o Inter –, os cruzamentos praticamente foram evitados.
A bola aérea vem sendo uma característica do time de Zago desde o começo da temporada. Mesmo com o time mais "pronto", com o aporte de jogadores que não estavam no elenco desde o início do ano, como Edenílson, a jogada seguiu partida após partida. Nas semifinais do Gauchão, por exemplo, o Inter "chuveirou" 65 vezes para a área do Caxias – entre Beira-Rio e Centenário. Com apenas 14 acertos, o que teve como produto final um gol – de rebote, após cruzamento de D'Alessandro. Nas finais contra o Novo Hamburgo – empates em 2 a 2 e em 1 a 1 –, 74 cruzamentos. Com um festival de erros: 64 bolas que resultaram em nada.
– É uma maneira de jogar pelo lado do campo, uma forma de não chegar no último terço do campo sem tentar uma conclusão. É uma ideia de jogo, que sempre tenta definir o lance. Agora, com mais atacantes que entram na área, como o Pottker, que por sinal fez um gol assim contra o ABC, essa jogada tende a ser mais efetiva – defende o vice de futebol do Inter, Roberto Melo.
Na Série B, o aproveitamento do Inter em cruzamentos é de míseros 17,5%. Na Copa do Brasil, mesmo com dois confrontos de Primeira Divisão, como foram os contra Corinthians e o jogo de ida contra o Palmeiras, os números não melhoram muito: 29,6%.
Números à parte, o próximo adversário do Inter na Segunda Divisão, o Paysandu – neste sábado, em Belém –, não desdenha do poderio ofensivo de Pottker e companhia. Para o técnico Marcelo Chamusca, a estatística colorada pode ser enganosa.
– Esses números devem ser analisados com calma. Contra o ABC, o Inter fez um jogo de imposição no primeiro tempo. Contra o Palmeiras, o Inter levou extremo perigo na bola parada. Tudo isso está incluído no quesito "cruzamentos". Até cobrança de falta e de escanteio. Levo isso em conta e vou tratar de trabalhar muito essa bola ofensiva do Inter durante a semana – diz o treinador do Paysandu.
Ao que tudo indica, o Inter seguirá cruzando para a área dos adversários. E espera que Pottker, Nico e Cirino resolvam.
* ZHESPORTES