
Você não sabe nada de futebol. Os consultores americanos Chris Anderson e David Sally chegam a esta conclusão em Os Números do Jogo, livro lançado recentemente no Brasil (editora Paralela, 360 páginas, R$ 39,90). Mas eles adiantam: "A culpa não é sua."
Futebol se joga pelas pontas. Escanteio curto é desperdício. Tem que finalizar, senão não faz gol. Frases que podem explicar muito bem qualquer situação de um jogo. E que também ajudam a perpetuar mentiras que não têm nenhum fundamento científico.
Incomodados com os comentários sobre como o futebol deveria ser, em vez de como ele é, o professor de estatística da Universidade de Cornell (EUA) Chris Anderson e o especialista em estratégia da Faculdade Dartmouth David Sally analisaram diversos dados relacionados ao jogo bonito ao longo da história. Eles juntaram várias teorias e usaram seus próprios estudos para destrinchar essas máximas. E concluíram que a maioria delas não passa de mitos.
- Eu gostaria que nós, como torcedores, discutíssemos mais sobre fatos, sobre o que times, jogadores e técnicos realmente fazem, do que sobre as coisas que achamos ou acreditamos. Eu pessoalmente acho os fatos muito mais satisfatórios do que a ficção. Isso não quer dizer que não adore a emoção do jogo; sem ela, ele está morto. Mas ainda continuo querendo saber qual time é o melhor de verdade - diz Anderson, em entrevista à Zero Hora.
Uma falsa verdade conhecida dos brasileiros e desmistificada por eles é a de que jogar na Espanha é melhor, pois o jogo é mais fluido, enquanto que na Itália é puro contato e recheado de defesas retrancadas. Pode até servir de conselho aos jovens atacantes, mas vale avisá-los também que isso não influencia em nada na média de gols. Anderson e Sally avaliaram todas as partidas das quatro principais ligas do mundo - Inglaterra, Alemanha, Espanha e Itália - de 2000 a 2010. No fim, se deram conta de que a média de gols por temporada - entre 2 e 3 por jogo - varia pouco.
A primeira explicação sobre por que o futebol é assim é de dar inveja a Lavoisier: no futebol, nada se cria. Por estar arraigado à tradição, a cópia é a regra. Se deu certo em outra equipe, vou tentar aplicar na minha. Outra justificativa é que é muito mais fácil - e preguiçoso - analisar algo que funcionou do que inúmeras outras coisas que não tiveram êxito. No livro, eles afirmam: "O maior problema de seguir uma tradição venerável e um dogma estabelecido é que ambos raramente são questionados. O conhecimento fica estagnado, enquanto o próprio esporte e o mundo em torno dele mudam."
As demais respostas podem ser investigadas no livro. Se você pensa que tudo isso é balela, peça explicações ao seu clube, pois a maioria deles está apostando alto em estatísticas e captação de dados. Eles sabem que o futebol é uma caixinha de surpresas cada vez mais previsíveis.
Mitos x Verdades
Conheça alguns dogmas permanentes no universo futebolístico escarafunchados por Anderson e Sally em Os Números do Jogo:
Escanteio é para ser cobrado no meio da área
O lateral do seu time cava o escanteio e levanta a torcida no estádio. Prenúncio de gol? Segundo Os Números do Jogo, não. Observando os 1.434 escanteios na temporada 2010/11 da Premier League, perceberam que a média de gols originados de um escanteio é de 0,022 - ou um tento a cada 10 jogos. Talvez seja melhor cobrar curto e manter a posse de bola.
Quanto mais chutar, maiores as chances de fazer gol
Futebol é eficiência e equilíbrio. Finalizar mais não faz sair mais gols, assim como ter melhor ataque não faz vencer mais campeonatos. Analisando 8.232 jogos das quatro principais ligas do mundo por seis anos, os autores chegaram à conclusão que o time que mais chuta a gol vence, em média, 47% das partidas. Ou seja, finalizar mais que o adversário em direção à meta dá as mesmas chances de acertar o resultado de um cara ou coroa.
A regra dos três pontos tornou o futebol mais ofensivo
Ofensiva é esta afirmação. A média de gols não mudou desde que a Fifa adotou, em 1995, a pontuação de três pontos por vitória. Dois economistas alemães fizeram o serviço para os autores, avaliando 7,3 mil jogos de campeonato e copa nacionais nos 10 anos anteriores e 10 seguintes à mudança da regra. E viram que a única coisa que aumentou foi o número de cartões amarelos. A valorização da vitória só deixou marcas nas canelas dos adversários.