
Fábio Gouveia é uma das vozes da experiência no surfe. Primeiro brasileiro a se sagrar campeão mundial amador, em 1988, o paraibano cravou o país (e o continente) no mapa-múndi do surfe já no ano seguinte, quando mergulhou atrás de ondas estrangeiras pelo circuito da elite - junto de Flávio Padaratz e Piu Pereira.
Hoje, não há dúvidas: depois de uma longa estrada percorrida, o mar está mais para peixe tupiniquim. Em entrevista direto do Havaí, onde acompanha de perto a saga de Gabriel Medina rumo à conquista inédita, Gouveia fala da preparação do atleta brasileiro e dos cuidados que ele deve tomar com seus adversários:
- Penso que o Medina está pronto, mas não vai ter parada fácil.
Zero Hora - O Brasil está a um passo de ter o seu primeiro campeão mundial de surfe na história. Caso isso aconteça, qual será o significado dessa vitória para o esporte no país?
Fábio Gouveia - Uma grande visibilidade. Um ponto para frisar novamente que o Brasil, a eterna potência em ascensão no esporte, é uma real potência no surfe atual, dividindo a mesma fatia do bolo com os anglo-saxônicos.
Zero Hora - Como você vê a preparação do Gabriel Medina para essa grande final? Ele está preparado para levantar o caneco?
Fábio Gouveia - Tenho visto o Medina treinar sempre em Pipeline, da mesma forma que o Fanning. Antes do evento começar, ainda não tinha visto o Kelly [Slater], mas é sabido que ele estava machucado. Penso que Medina está pronto, mas não vai ter parada fácil como se mostrava após sua vitória em Teahupoo. De qualquer forma, sua estrela pode brilhar e se sua hora chegar agora, vai ser. Ele já fez muito e, se o titulo não vier agora, mais cedo ou mais tarde virá com certeza.
Saiba o que Gabriel Medina precisa fazer para ser campeão
Zero Hora - Qual a melhor maneira de surfar em Pipeline, quais os cuidados que Medina precisa tomar nessas ondas?
Fábio Gouveia - Não sou expert em Pipe, mas com o sistema de prioridade, o lance é esperar a onda certa, tentando não cometer erros. Com certeza, Medina, com o pouco tempo de estrada, já tem certa quilometragem na onda e vai saber o que fazer.
Zero Hora - Qual têm sido o diferencial do Medina: o quê o surfe dele têm que agrada tanto aos juízes e, inclusive, aos seus adversários?
Fábio Gouveia - Medina tem a radicalidade, a velocidade e a força nas manobras. O que agrada é que todos sabem o quanto ele é precoce e o quanto ele irá evoluir ainda.
Zero Hora - Qual o seu ponto forte, na parte técnica? Mentalmente, como você vê seu comportamento?
Fábio Gouveia - Penso que ele ainda carrega uma pitada de pouca responsabilidade, mesmo com toda a pressão que está depositada em si neste momento. Ou seja, isso pode ser um ponto positivo.
Zero Hora - O que tu achas que o Medina precisa aprimorar, ainda? Acreditas que ele conseguirá manter o mesmo nível competitivo nos próximos anos?
Fábio Gouveia - Ele tem bastante pra amadurecer ainda. Quando surfar cada vez mais ondas de qualidade, vai, com certeza, estar um surfista apto em todas as condições. Em Teahupoo, mesmo com pouca quilometragem, mostrou esse ano uma performance épica e mostrou todo o potencial que poderá atingir.
Zero Hora - Quem são, daqui para frente, seus principais concorrentes? John John Florence, Jordy Smith?
Fábio Gouveia - Sim, esses dois são os mais prováveis . John John nem precisa comentários, mas o Jordy vem se solidificando. O [Mick] Fanning também continuará dando uma dura, com certeza.
Zero Hora - E o Brasil no tour: por enquanto, equalizamos, caíram dois brasileiros, mas também já subiram dois, certo? Acreditas que o país tem uma safra de surfistas que podem trazer mais títulos? Quem seria a tua aposta?
Fábio Gouveia - Por enquanto, o Medina é o cara. Achava que o Mineiro (Adriano de Souza, o Mineirinho) poderia chegar lá devido a sua dedicação e garra. Penso que, agora, ele terá que trabalhar ainda mais e de repente isso possa ser um combustível, já que sairá de contusão e vem presenciando a ascensão do Medina. Felipinho (Filipe Toledo), melhorando seu potencial em ondas maiores, com certeza será candidato a títulos. A turma que já está a dois anos vai arrumar bagagem pra dar trabalho. Como o Ítalo Ferreira, que está entrando e é um ferrenho competidor. Bom, de qualquer forma, as expectativas são ótimas e o Guigui (Wiggolly Dantas, que subiu para elite este ano) poderá surpreender também nas ondas pesadas.
Zero Hora - O que mudou no mundo surfe das décadas de 1980 e 1990 para cá? Por que há uma miscigenação maior dos surfistas do tour? É o esporte se globalizando?
Fábio Gouveia - Com certeza, nessas décadas citadas, apenas o Brasil aparecia como possível potência. A África do Sul teve Shaw Tompson, mas depois apagou-se um pouco. Mas voltou e aliou-se aos europeus e sul americanos, entre outros que vem em crescente.