
Até poucos dias atrás, o arco narrativo mais pungente da história moderna do Inter era personificado por Abel Braga – da vitória épica do Gre-Nal do Século, em 1989, êxtase amputado pela perda do título para o Bahia e pela trágica eliminação naquela Libertadores diante do Olimpia, até que chegou 2006 e, qual um filme de Scorsese, o velho Abelão estava lá, vermelho e transtornado à beira do campo, para conduzir o Inter até o limite de toda a alegria possível.
Seu percurso é perfeito, amarra duas pontas de agonia e glória separadas por quase 20 anos.
Leia mais:
Gustavo Souza: Por que ganhamos e por que perdemos?
Lucho Silveira: um D'Alessandro, dois corações
Carlo Balestrin: Grêmio, nunca vais me perder!
Mesmo colorados mais calejados, ainda pecamos pela ingenuidade. Uma narrativa tão perfeita quanto infeliz, insuperável do ponto de vista dramático, ainda estava para ser escrita. Há exatos 10 anos, o Estado ardia, não tanto pelo sol impiedoso, mas pela comoção vermelha que tomou conta das ruas após o gol de Adriano, impensável protagonista. Há pouco mais de uma semana, uma década depois, um Inter totalmente antagônico àquele de 2006 saía de campo de forma melancólica, reflexo de uma gestão catastrófica, sem mostrar disposição sequer para chorar de vergonha.
É preciso empenho para sair de Yokohama e chegar a Mesquita em 10 anos. Também é necessária uma boa dose de azar, talvez alguma ousadia, para lançar um livro sobre a década vermelha semanas antes da maior desgraça da história colorada. Impossível não se sentir uma espécie de Lisca do mercado editorial. O título, no entanto, pareceu pertinente, pela ambiguidade: História Universal da Angústia. Serviu como linha condutora das últimas semanas, mas também faz eco à época em que a aflição da arquibancada terminava em catarse. O desespero nos últimos minutos contra o São Paulo. O segundo de respiração suspensa enquanto a falta de Ronaldinho se perdia para todo o sempre pela linha de fundo.
Ingênuos, desprezamos a capacidade criativa do destino, que encerra uma narrativa ao mesmo tempo em que inicia outra: o ápice colorado era também o começo da contagem regressiva rumo ao cadafalso. A conquista liberta cada um de nós, enquanto a desgraça é coletiva. Acionado o instinto de sobrevivência colorado, estamos mais irmanados até do que nos grandes feitos. Com uma única certeza: a próxima narrativa vai ser escrita por muitas mãos.
Acompanhe o Inter através do Colorado ZH. Baixe o aplicativo:
* ZHESPORTES