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Confira abaixo a entrevista concedida pelo técnico Tite, no domingo pela manhã, no campo do Grêmio Esportivo Gianella, onde ele participou de um jogo de confraternização com amigos:
Pioneiro: Há um ano (12 de dezembro de 2015), te entrevistei em um jogo beneficente em Nova Prata. É possível dimensionar o quanto mudou na sua vida desde então?
Tite: Estava com uma operação nas pernas, de varizes, e não pude jogar naquela oportunidade. Em Nova Prata, um dia também de muito sol, de estar perto dos amigos e, de certa forma, beneficiar alguém também. Em termos profissionais, era um momento extraordinário. E, cara, só posso agradecer. Venho em outro momento conversar contigo com uma satisfação e um orgulho grandes, não só pelas conquistas obtidas, mas pela forma como foram. Pela forma como minha carreira tem se pautado, como tenho enfrentado os meus medos com coragem para superá-los, sem passar por cima de quesitos éticos e morais que preservo muito e que estão na minha educação, do Seu Genor, da Dona Ivone, do meu irmão Miro. É o vencer, não puritano, mas com um jeito limpo de ser. Chegar ao final de ano assumindo a Seleção Brasileira e a gente bem encaminhado nas Eliminatórias me deixa muito feliz. Agora é compartilhar com meus amigos essa alegria.
Depois do confronto diante do Peru, você chegou a falar que não sabia se merecia tudo o que estava acontecendo. Já caiu a ficha desse período e da resposta que teve dos atletas nos seis jogos?
Nós dependemos ainda destes seis jogos que restam e acredito que uma vitória seja definitiva. Mas a mobilização precisa ser sempre para o próximo jogo. É consolidar esse momento e crescer a partir dele. Uma equipe vai se construindo. Agora quero curtir um pouco esses seis confrontos que tivemos. Palavra de honra: estive tão envolvido com a preparação que, logicamente, tinha a alegria da vitória, mas logo depois tinha um outro jogo e ainda nem assisti àquelas partidas. Quero ver elas com olhos de torcedor e relembrar a emoção de cada duelo. Primeiro, o Equador, pressionado, com nervosismo aflorado, até o jogo contra o Peru, muito difícil. De todos, nenhuma torcida apoiou tanto o time como a peruana. Era um confronto de concentração alta. E o jogo marcante, por enfrentar a Argentina. Quero curtir um pouco e assistir cada um deles.
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Para o próximo ano, além das Eliminatórias, está no planejamento a realização de testes diante de seleções europeias que tragam outros aspectos de exigência?Vou ser bem específico. O objetivo é consolidar o estágio em que nós estamos. A equipe cresceu muito e surpreendentemente. É consolidar antes de pensar no segundo ou terceiro passos. Manter o nível de desempenho que apresentamos, encontrar formas alternativas com jogadores em diferentes funções para termos dois atletas preparados para cada posição e ter espaço aberto para novos atletas que estão surgindo. No início do ano ainda será confirmado um jogo contra a seleção colombiana (com renda revertida às famílias das vítimas da tragédia aérea da Chapecoense, foi confirmado para o Engenhão, no dia 25 de janeiro) e minha ideia, sem afirmar isso, é convocar atletas brasileiros. A partir daí, vão aparecer situações de seleções europeias. Mas esse é um segundo passo após conseguir a classificação nas Eliminatórias.
Dentro desse período de observação, qual a importância de ter esse confronto com a Colômbia, apesar dos motivos tristes pelos quais ele irá se realizar?Fazendo as devidas ressalvas de que os atletas estarão voltando de férias e ninguém deve jogar mais que 45 minutos, serve de avaliação, sim. Até porque já venho acompanhando os jogadores que serão convocados. Não gostaríamos que fosse com esse sentido ou essa conotação, mas é para mostrar que a Seleção está voltada ao cunho social, a um aspecto de solidariedade, de poder amenizar e respeitar um pouco a dor de todas pessoas que estiveram envolvidas com familiares no acidente.
Em entrevistas, você já citou, por exemplo, a importância do aspecto coletivo do Lebron James para a conquista do título da NBA. Saindo um pouco do futebol, o que o Tite gosta de acompanhar no esporte?
Gosto muito do handebol. Na Olimpíada fui assistir a um jogo, é um esporte com muito contato físico, agressivo, mas que você precisa interpretar até que ponto a agressividade é leal. Gosto muito do basquete porque você faz movimentos ofensivos interessantes, de mexer a marcação adversária para provocar a jogada no um contra um, ou provoque uma infiltração. São duas modalidades que aprecio e me fascinam. Outro é o tênis, pelo nível de concentração muito alto, a capacidade de antever o lance, de observar e ler o movimento do corpo do adversário e reprogramar seus movimentos.
Neste período do ano, o quanto a possibilidade de estar junto a Dona Ivone, amigos e familiares recarrega suas energias?
Sei da visibilidade que o cargo me dá e tenho essa noção. Tenho todo o respeito pelas pessoas, mas peço também que elas respeitem por serem alguns momentos que preciso estar voltado exclusivamente para a família. Inicialmente, a eles, aos amigos, para a minha espiritualidade, para fazer alguma atividade que possa ser beneficente, mas sabendo que nem sempre posso atender todo mundo. E que seja possível entender que também é um momento que eu possa ficar quieto, ficar no meu canto, rever meus erros, minhas angústias. Por vezes também sou uma má companhia. Não pensem que também não tenho essas situações, preciso fazer minha oração, buscar minha paz para fortalecer de novo, fazer algumas visitas solidárias. Tudo isso para reenergizar e, na sequência, estar forte de novo.
Em período de agradecimentos e projeções, carimbar a vaga na Copa de 2018 é o principal pedido do Tite para o próximo ano?
Sim. Ela está bem encaminhada, tenho a noção exata. Aquelas pessoas que não têm responsabilidade ou não conhecem o futebol podem dizer que está garantida. Nada na vida se conquista automaticamente. E temos a consciência disso. O primeiro objetivo é a consolidação do trabalho e a classificação.
E antes mesmo de começar 2017 já se pode pensar um pouco mais à frente, na Copa de 2018?
Claro que o planejamento ocorre, com passos a curto, médio e longo prazos. Eu fico atento ao curto prazo porque o futebol é assim. O Edu (Gaspar, coordenador técnico da Seleção), no médio e longo prazos, inclusive com o Flávio Mahseredjian (preparador físico da Seleção) e o Luís Vagner (supervisor da Seleção), viajando para a Rússia e vendo possibilidades de locais para que a gente possa fazer os treinos. Mas é algo de planejamento, é inerente ao dia a dia. A busca é sempre a mais atualizada possível, no fazer o melhor no momento, de acompanhar os jogos e projetar a equipe. Não foge disso.