Fabrício Carpinejar
Vou contar um segredo: Carpinejar era meu amigo imaginário na infância. Sempre que sofria deboche na escola chamava um menino fictício de óculos grandes e destemido para resolver o conflito. Carpinejar era o meu contrário. Era o meu justiceiro. Era o meu confidente.
Se arcava com a gagueira, a timidez claustrofóbica e a vergonha da aparência, vinha o Carpinejar me defender falando alto, comprando briga com os meus agressores, desarmando preconceitos com sua risada poderosa.
Se chorava no fim das aulas, vinha o Carpinejar me consolar, secar as lágrimas e exigir que deixasse de ser maricas.
Se não me aproximava de nenhuma menina com receio de ser escorraçado, vinha o Carpinejar, com seu espírito galhofeiro, seduzir e namorar as mais bonitas do bairro.
Carpinejar cresceu comigo e se transformou num autor de sucesso. Ele é quem realiza as palestras, escreve no jornal, surge polemizando na televisão, dá dicas de relacionamento.
O Fabrício continuava sendo o guri indefeso, inseguro, sensível, caseiro, discreto, dentro do Carpinejar. Aparecia com parcimônia, apenas com longa intimidade, para aqueles que ele julgasse realmente merecer.
Enquanto Fabrício se emocionava à toa, com seu olhar de pintassilgo no muro, cheio de dúvidas de si, à espera da confiança e lealdade irrestritas de alguém para sair do seu esconderijo de medo, Carpinejar abria espaço com sua confiança e certezas absolutas de gavião, sedutor afiado com as palavras.
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