
Vou abordar mais um tema espinhoso (ando me aperfeiçoando nisso): a "secação" e a flauta. A gremistada vibrou com a desclassificação do rival. Alguns até jogaram rojões.
Pois bem, isso alimentou muito bate-boca desde ontem nas redes sociais.
Da minha parte, faço questão de repetir pela enésima vez: escrevo para este blog de gremistas, mas jamais deixo de vestir a indumentária de jornalista. Por um lado, sou antigo defensor de que todos jornalistas assumamos nossos times. Por outro, acho que jamais devemos nos despir de alguns comportamentos essenciais. Ontem, li um texto de arrepiar, desqualificando adversários, com argumentos infantis e estrutura quase panfletária. Não, de mim vocês nunca terão isso.
Sou jornalista sempre e respeito o adversário também em razão da minha formação humana, de ver na aceitação das diferenças um valor maior - sobre isso, aliás, até escrevi livro. Outro dia, disse que não curto tocar e receber flauta. Ora, a lógica é simples: sofro terrivelmente quando meu Grêmio perde, até perco o sono. Imagino que muitos dos meus amigos colorados tenham o mesmo sentimento. Não gosto de ver amigo sofrer.
Então, não tripudio. Respeito a dor alheia.
Ponho-me no lugar do outro, ainda mais quando é amigo.
Pois bem, dada a chinelada nas crianças que não entendem a liturgia da nossa linda profissão e a ética de respeito ao outro, vou ao ponto principal: os gremistas estouraram foguetes quando o juiz apitou o fim do jogo no México.
Podem ter certeza de que não foi o comportamento deste blogueiro, que acima de tudo é jornalista.
Mas vibrei discretamente, claro. Por quê? Simplesmente porque era importante pro meu Grêmio. Só!
Se não fosse isso, eu ignoraria. Aliás, confesso que nem vi o jogo. Soube do resultado pelo Twitter.
E os rojões? São manifestações de desafogo.
Agora, vou contar uma história, em dois tempos.
1) Final 1995 - eu tinha a prática de nem olhar para os lados do rival. Minha bronca maior era com os times do Rio e SP, porque insistiam em diminuir os grandes do RS e de MG. Aí, veio a nossa decisão do Mundial contra o Ajax. Pronto: tinha camiseta do Ajax por todos os lados em que se visse um colorado. Achei aquilo a expressão da inveja. E não gosto disso.
Ali, deixei um pouco de ser magnânimo.
2) Final de 2006 - o Internacional decidia o Mundial. Quando o juiz apitou o fim do jogo, começou aquela festa dos colorados. Eu estava no supermercado com meu filho, que tinha só quatro aninhos. O guri começou a me dizer que não suportava ver aquelas bandeiras vermelhas. Eu respondi: "Filho, adversário não é inimigo. E festa é sempre legal. Hoje, é a deles, nossos amigos colorados. Um dia, voltaremos a ter a nossa". Juro que foram essas as minhas palavras.
Aí, no dia seguinte, em vez de concentrar as energias pra curtir o próprio título (que é o que eu faria), os caras começaram a diminuir nosso título mundial, usar a expressão "campeão de tudo", juntar o Fifa (hoje dá vergonha ) ao nome da conquista ganha só pra implicar conosco. Enfim, minha magnanimidade diminuiu ainda mais um pouco.
Certo dia, comentei com um amigo de infância colorado.
- Os colorados têm uma tendência a pensar mais no Grêmio do que neles próprios. Acho isso uma coisa menor. Por que não cuidam da sua vida e nos deixam em paz?
Esse meu amigo colorado de infância, com quem convivi quando ele saboreou grandes glórias nos anos 1970 e também quando sofreu muito nos anos 1980 e 1990, respondeu, na forma civilizada que temos de discordar:
- É tudo igual. O problema é que os colorados precisam superar esse momento de derrotas e mais derrotas. Por isso, acabam torcendo tanto contra o Grêmio.
Hoje vejo que ele tinha razão. Pra nós, era importante a derrota do Inter.
Mas não porque é o Inter. Muito mais por ser nosso rival e por sentirmos certa arrogância na forma como insistentemente tenta diminuir o nosso Tricolor. Juro que, se não fosse essa arrogância, eu ignoraria o jogo contra o Tigres.
Acho que as pessoas têm de saber perder e, muito mais, saber ganhar.
Se o Grêmio ganha, penso só na felicidade íntima que isso me dá.
Aliás, falemos na Batalha dos Aflitos: tenho um baita orgulho daquele título. Por quê? Certamente, não por ser algo a exibir - pô, é o Brasileiro da série B. Mas pela perseverança do meu clube, pela forma como enfrentou um desafio sem igual (as circunstâncias adversas daquele jogo são insuperáveis). Detalhe que repito: não é um título para exibir! Percebam: eu me orgulho pela felicidade íntima que ele me dá. Nem penso nos colorados.
É engraçado como os colorados não entendem esse sentimento.
Já pensei numa lógica freudiana: como os caras levaram uma tunda de 10 a 0 no primeiro Gre-Nal, adotaram esse sentimento atávico de ter como missão premente superar o rival. A razão de viver do Inter seria a de superar o irmão mais velho.
Faz todo o sentido.
Mas concordo com aquele amigo de infância, que é colorado. Somos todos iguais.
O gremista, para respirar em meio a anos tão difíceis, precisava ver o rival baixar a crista.
Se isso representa uma virada na famosa gangorra, só o tempo dirá.
O certo é que nós, gremistas, sonhamos com isso.
E o tricampeonato da América rival seria uma rocha imensa no nosso caminho.
Simples assim.
*ZHESPORTES