Campo e Lavoura

Para colher e preservar

Programa paga agricultores para "produzirem" água no Rio Grande do Sul

Grupo de agricultores em Vera Cruz, no Vale do Rio Pardo, integra único projeto reconhecido pela ANA no Estado

Caio Cigana

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Cesar Lopes / Especial
Kurtz foi um dos primeiros a aderir ao projeto e preserva quatro dos 30 hectares na propriedade em Vera Cruz

Se de um lado o campo é grande consumidor de recursos hídricos, de outro pode produzir e colaborar para a qualidade e a quantidade da água que depois vai abastecer populações urbanas. E ainda ganhar dinheiro com isso.

Um grupo de 67 pequenos agricultores de Vera Cruz, no Vale do Rio Pardo, integra de forma voluntária o único projeto de pagamento por serviços ambientais reconhecido pela Agência Nacional de Águas (ANA) no Estado. Lançada em 2011, a iniciativa foi criada para proteger nascentes e áreas de mata ciliar da sub-bacia hidrográfica do Arroio Andréas, de onde é captada 70% da água usada na cidade.

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No total, são 144 hectares preservados pelo projeto Protetor das Águas. Os agricultores recebem anualmente R$ 325 por hectare e bônus de R$ 200, pela adesão, independentemente da área.

- É um trabalho de extrema importância. Temos de cuidar bem do nosso arroio, caso contrário podemos enfrentar grandes problemas futuros - diz Ricardo Konzen, coordenador do Departamento de Ambiente da prefeitura de Vera Cruz, lembrando que a remuneração não deixa de ser uma proposta de diversificação, já que há muita dependência do plantio do fumo.

Nos quatro anos de atividade, já há o que comemorar. No início do projeto, a água das classes 1 e 2, consideradas de melhor qualidade, era encontrada em 44% dos pontos avaliados mensalmente com a coleta de amostras para análises laboratoriais. Agora, chega a 70%. Além da qualidade, a conservação das nascentes e da mata ciliar ajuda o rio a não sofrer tanto em períodos de estiagem, diz o coordenador técnico do projeto, Dionei Delevati, professor da Universidade de Santa Cruz do Sul (Unisc):

- Áreas protegidas "guardam" mais água, que vai sendo liberada quando o rio precisa. E a mata ciliar evita o assoreamento.

Apesar dos bons resultados, há dúvidas no horizonte. O patrocínio da iniciativa é da Universal Leaf Tabacos e da espanhola Fundación Altadis - ligada à britânica Imperial Tobacco, cliente da fumageira - e 2015 é o último dos cinco anos acertados para auxílio financeiro. O desafio é renovar ou encontrar uma nova fonte de financiamento.

Em novembro, a ANA selecionou 13 projetos - nenhum do Estado - para o programa Produtor de Água, criado pela agência em 2001. Destes, nove receberão apoio da ANA, dividindo R$ 5,8 milhões. Os demais só terão apoio técnico.

O programa no RS

- 103 fontes protegidas em 144 hectares

- 67 propriedades envolvidas

- Pagamento anual de R$ 325 por hectare preservado, mais R$ 200  para cada proprietário

- Iniciou-se em 2011, mas só em 2012 foi certificado pelo projeto Produtor de Água, da ANA.

Preservação como herança

No grupo dos primeiros 26 agricultores a aderir à iniciativa, Ingbert Kurtz, 58 anos, tem preservados quatro dos 30 hectares da propriedade no interior de Vera Cruz.

A área conservada protege uma vertente de onde alguns anos atrás retirava água para a casa e que vai desembocar no arroio Andréas.

Atualmente, a propriedade é abastecida pela rede da companhia municipal de saneamento, mas o interesse por ajudar a manter o manancial é o mesmo.

- A água que recebo em casa também é da minha vertente. Estou cuidando da minha própria água - lembra Kurtz, que planta tabaco, milho, mandioca e feijão para consumo próprio, comercializando o excedente.

A remuneração por proteger a nascente, paga sempre ao final do ano, auxilia a custear despesas e investimentos necessários na propriedade. E, claro, ajuda a comprar presentes para a família no Natal.

Mesmo antes do incentivo financeiro, a área já era preservada pela família, que vive no local desde o final do século 19, na época de seu bisavô, conta o agricultor:

- É para os meus filhos e netos também poderem usufruir.

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