Que a política externa do presidente americano Donald Trump se contrapõe a toda a concepção de diálogo pregada pelo antecessor Barack Obama, não há dúvida. Os exemplos vão de Cuba ao Oriente Médio. Nas últimas semanas, essas diferenças apareceram nitidamente em três medidas tomadas pelo governo, que definem os seus rumos.
Trump desencadeou uma onda de sanções contra outros países. Os casos notórios são os da Rússia, da Coreia do Norte e da Venezuela. No russo, o motivo é um escândalo interno (a suposta interferência nas eleições presidenciais americanas). No coreano, é a ameaça bélica, com os testes nucleares do país asiático. No venezuelano, o caos socioeconômico e a crise institucional do país, que sinalizam uma ditadura.
O tema é complexo. Impor sanções é uma forma de dar recados. Não necessariamente é um aumento de agressividade. E os efeitos desses recados sofrem diversas contestações vindas dos analistas.
– A imposição de sanções por parte de Trump marca um estilo e reafirma sua imagem de presidente devotado aos interesses americanos. Mas é mais um sinal para a opinião pública do que algo capaz produzir resultados concretos – comenta Alcides Vaz, professor de relações internacionais da Universidade de Brasília (UnB).
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Professora de relações internacionais da UFRGS, Analúcia Danilevicz Pereira diz:
– É um tema complicado. Na verdade, o governo Obama era mais agressivo, se olharmos os fatos (as ofensivas bélicas). Houve mais intervenções internacionais. Trump, apesar de ser até assustador, tem movimento claro de frear ações militares. Há um refluxo, um isolacionismo, com o objetivo de resolver problemas internos. Há mais retórica, e as sanções são a forma de marcar terreno e dar recados a baixo custo.
Leia aqui os três contextos:

Coreia do Norte
Trump define a resolução do Conselho de Segurança das Nações Unidas sobre a Coreia do Norte como o maior pacote de sanções já imposto ao país. Por trás desses boicotes, estão os EUA. "O Conselho de Segurança da ONU acaba de votar 15 a 0 para sancionar a Coreia do Norte. China e Rússia votaram com a gente. Impacto financeiro muito grande!
A Resolução das Nações Unidas é o maior pacote de sanções econômicas à Coreia do Norte. Mais de US$ 1 bilhão em custo para a Coreia do Norte", disse Trump no Twitter. O documento define a proibição das importações de carvão, ferro, minério de ferro, chumbo e frutos do mar da nação asiática pelos Estados membros da ONU.
Como consequência, a Coreia do Norte ameaçou se vingar "mil vezes" dos EUA. As sanções foram impostas em resposta aos recentes testes com mísseis intercontinentais realizados por Pyongyang, que, por meio da agência de notícias oficial KCNA, acusou uma "violação violenta da soberania" e "complô hediondo para isolar e sufocar" o país. Por outro lado, o secretário de Estado americano, Rex Tillerson, descartou qualquer diálogo com Pyongyang e disse que as sanções demonstram que o mundo perdeu a paciência com as ambições nucleares de Kim Jong-un.

Rússia
No último dia 2, a Casa Branca informou que Trump assinou novas sanções contra a Rússia. Motivo: punir o governo de Moscou pela suposta interferência nas eleições presidenciais americanas de 2016, por ter anexado a Crimeia (antes território ucraniano) e pelo apoio ao presidente sírio Bashar al-Assad. As sanções são de ordem econômica, que impõem restrições a empresas russas, e punições a cidadãos russos que tenham cometido violações aos direitos humanos, crimes cibernéticos (ataques de hackers) e fornecimento de armas ao governo sírio.
Ainda antes desse anúncio, o presidente russo, Vladimir Putin, retalhou, determinando a redução do quadro diplomático americano na Rússia em 60%, o que diminui o contingente de 1,2 mil funcionários dos EUA no país para 755 a partir de setembro. As sanções econômicas foram votadas de forma quase unânime pelas duas câmaras do Congresso dos EUA.

Venezuela
No dia 26, Trump impôs o terceiro pacote de sanções contra venezuelanos ligados ao regime do presidente Nicolás Maduro. As restrições atingem 13 funcionários da administração chavista, que tiveram ativos congelados pelos EUA e foram proibidos de viajar ao país. As sanções chegaram quatro dias antes da votação para a assembleia constituinte convocada por Maduro para mudar as regras de um jogo em que se desenhavam derrotas eleitorais do governo.
A "constituinte" tem "suprapoderes" e, para muitos analistas, conclui um processo de cassação da democracia representativa e consolidação da ditadura. Protestos contra o governo, o caos socioeconômico do país e a constituinte já deixaram 125 mortos em quatro meses. As opiniões sobre as sanções se dividem.
– O cerco é necessário para mudar a política na Venezuela – diz o deputado oposicionista Luis Florido.
Deputados americanos veem riscos e enviaram uma advertência a Trump: "A Venezuela é o terceiro maior fornecedor de petróleo dos EUA, depois de Canadá e Arábia Saudita" (...) Desestabilizar os mercados de petróleo em nível mundial pode aumentar os preços do petróleo e fortalecer as economias do Irã e da Rússia".
Outra advertência é a de que as consequências mais pesadas se dariam em relação à população venezuelana, que já sofre com desabastecimento de 80% da cesta básica e inflação anual em 720%. Além disso, Maduro teria um motivo real para dizer que a situação venezuelana é resultando de interferência daquilo que define como "império".