
Um mês após revelar ao país que matou, torturou e ocultou cadáveres de presos políticos durante a ditadura, o coronel reformado do Exército Paulo Malhães, 76 anos, foi encontrado morto na manhã desta sexta-feira, no sítio em que morava, em Nova Iguaçu, no Rio de Janeiro.
De acordo com o delegado-adjunto Fabio Salvadoretti, três homens invadiram a casa por volta das 14h de quinta-feira e já estavam no local quando o coronel e sua mulher chegaram. No entanto, só começaram a revirar a casa após a chegada do casal. O casal e o caseiro foram feitos reféns. Os homens ficaram na casa por cerca de oito horas.
Saiba mais
Família está surpresa, diz filha sobre morte de coronel
Nilson Mariano, sobre Paulo Malhães: "A testemunha silenciada"
José Luis Costa, sobre Paulo Malhães: "Crimes semelhantes"
Morte de coronel Paulo Malhães pode ser queima de arquivo
Comissão da Verdade pede que PF acompanhe apuração da morte de Malhães
Coronel que admitiu matar e esconder cadáveres durante regime militar ensinou tortura no Rio Grande do Sul
Os homens levaram celulares, dois computadores, impressoras, jóias e pelo menos quatro armas da coleção do coronel, além de R$ 700. Fábio Salvadoretti suspeita que Malhães tenha sido assassinado por asfixia cerca de três horas depois da chegada dos bandidos ao sítio. Segundo ele, não há indícios de que o coronel tenha sido torturado.
Cristina Batista Malhães, viúva do coronel, contou que apenas um dos três homens estava encapuzado. Antes de irem embora, eles soltaram a mulher do coronel e o caseiro, que tinham sido amarrados e colocados cada um em um cômodo da casa.
O delegado Salvadoretti disse que estuda três linhas de investigação para o crime
- A esposa ouviu os bandidos fazendo ameaças, tipo "onde estão as armas e as jóias". A investigação está muito preliminar ainda. Nada está sendo descartado. Pode ter sido um latrocínio, uma vingança ou um crime relacionado com o depoimento prestado por ele à Comissão Nacional da Verdade - explicou o delegado.
No mês passado, Malhães admitiu torturar e matar durante a ditadura
- Quantas pessoas o senhor matou?
- Tantas quantas foram necessárias?
O diálogo travado entre o ex-ministro José Carlos Dias e o coronel reformado Paulo Malhães ocorreu no dia 25 de março, durante o depoimento do militar à Comissão Nacional da Verdade (CNV).
Malhães estarreceu o país com suas revelações. Em pouco mais de duas horas de depoimento, o coronel respondeu às perguntas com frieza e sem demonstrar arrependimento.
No dia 21 de março, quatro dias antes de falar à CNV, o militar também havia declarado à Comissão da Verdade do Rio de Janeiro que jogara os restos mortais do ex-deputado Rubens Paiva no mar fluminense, depois de os desenterrar de uma praia, onde fora sepultado clandestinamente em 1971.
Mas Malhães voltou atrás no depoimento à CNV. Negou que tivesse escondido o corpo de Rubens Paiva e disse que sustentou a versão apenas para conformar a família do parlamentar.
Logo após a notícia da morte do militar, suspeitas de queima de arquivo começaram vir à tona. Pelo Twitter, a ex-ministra dos Direitos Humanos, a deputada federal Maria do Rosário (PT-RS), disse que "soa estranho que após essas revelações o militar tenha sido assassinado". O presidente da Comissão Estadual da Verdade (CEV) do Rio de Janeiro, Wadih Damous, também disse acreditar na hipótese de queima de arquivo e defendeu "rigor nas investigações".
- Ele foi um agente importante da repressão política na época da ditadura e era detentor de muitas informações sobre fatos que ocorreram nos bastidores naquela época.
Malhães foi agente do Centro de Informações do Exército (CIE) e chegou a ensinar técnicas de tortura a repressores gaúchos. Ele também foi um dos agentes mais ativos da chamada Casa da Morte de Petrópolis, um centro clandestino mantido pelo regime militar no início da década de 1970.
O depoimento de Malhães à CNV: