
Os rebeldes jihadistas tomaram controle de uma nova cidade no Iraque nesta quarta-feira e avançam em direção à capital Bagdá, em uma ofensiva relâmpago que provocou a fuga de 500 mil civis. Este avanço dos rebeldes sunitas do Estado Islâmico do Iraque e do Levante (EIIL) contra as forças iraquianas, diante de autoridades xiitas impotentes, ameaça mergulhar o país no caos.
Sua última conquista foi Tikrit, 160 km ao norte de Bagdá, uma vitória muito simbólica por se tratar da região natal do ex-presidente sunita Saddam Hussein, derrubado e executado após a invasão americana de 2003. Os insurgentes também tentaram, sem sucesso, tomar Samarra, a cerca de 100 km de Bagdá, segundo testemunhas.
Desde terça-feira, os jihadistas tomaram o controle, quase sem combate, da província de Nínive, que tem como capital Mossul - segunda maior cidade do Iraque. Setores de outras duas províncias próximas, Kirkuk e Salahedinne, majoritariamente sunitas.
Em uma demonstração de força, o EIIL sequestrou 48 turcos no consulado da Turquia em Mossul, entre eles o cônsul e membros das forças especiais. Além disso, executaram a tiros 15 membros das forças iraquianas na províncua de Kirkuk, de acordo com líderes locais, enquanto uma série de atentados a bomba deixaram cerca de 40 mortos em áreas xiitas no centro e sul do país.
Os ataques se concentraram em bairros de Bagdá e nas províncias de Karbaka e Basra, ao sul da capital.
- Toda Tikrit (capital de Salahedinne) está em poder dos insurgentes - após duas horas de combates com as forças de segurança, informou um coronel da polícia. Os jihadistas também tentaram controlar Baiji, onde estão localizadas as maiores refinarias de petróleo do Iraque, mas tiveram que recuar.
Considerado pelos Estados Unidos "um dos grupos terroristas mais perigosos do mundo" e "uma ameaça para toda a região", o EIIL, que planeja criar um Estado islâmico, alertou que "não vai parar sua série de invasões abençoadas".
Antes desta nova ofensiva, o grupo já controlava várias áreas da província iraquiana de Al-Anbar, na fronteira com a Síria. Acusado de cometer abusos na Síria, o EIIL também mantém sob seu controle parte da província rica em petróleo de Deir Ezzor (nordeste), causando temores de que haja uma unidade territorial com o noroeste iraquiano.

Famílias fogem da violência de Tikrit e Nínive
SAFIN HAMED / AFP
Governo irá armar a população
Incapaz de manter o controle sobre o país e minado por divisões religiosas, o governo iraquiano dominado pelos xiitas anunciou que vai fornecer armas para os cidadãos dispostos a combater os insurgentes e convocou o Parlamento, que se reúne quinta-feira, a declarar "estado de emergência".
Mas, confrontado com o avanço dos combatentes jihadistas, soldados e policiais não hesitaram em abandonar seus postos, de acordo com autoridades iraquianas e testemunhas.
O governador da província de Nínive, Athil al-Nujaifi, acusou os líderes militares de abandonarem o campo de batalha.
Temendo por suas vidas, "mais de 500 mil pessoas foram deslocadas no interior e nos arredores de Mossul", que possui dois milhões de habitantes, de acordo com a Organização Internacional para as Migrações (OIM).
Estados Unidos prometem ajuda
Segundo a OIM, os habitantes fogem a pé porque o uso de carros foi proibido no centro da cidade. Além disso, Mossul sofre com a falta de água potável e alimentos.
- Temos medo das consequências desta invasão, porque se o Exército entrar, pode tentar se vingar dos habitantes - afirmou uma deslocada, Zahra Chérif.
Washington prometeu ajudar os cerca de meio milhão de pessoas que fugiam dos ataques cometidos pelos jihadistas, e o novo embaixador no Iraque, Stuart Jones, considerou que a violência "atingiu níveis nunca antes constatados desde 2007" durante os confrontos entre xiitas e sunitas.
Além disso, os Estados Unidos se disseram prontos para ajudar as autoridades iraquianas a enfrentar os rebeldes, ressaltando seu compromisso em "trabalhar com o governo e com líderes do Iraque para unir esforços contra o avanço do EIIL", indicou Jen Psaki, porta-voz do Departamento de Estado.
A Liga Árabe e a União Europeia fizeram um apelo nesta quarta-feira a "todas as forças democráticas do Iraque" para que cooperem com o objetivo de impedir "a deterioração da segurança" no país.
Esta situação é uma fonte de "grande preocupação" para a União Europeia e a Liga Árabe, que lembram que "a unidade e a integridade do território iraquiano são essenciais para a estabilidade e o desenvolvimento econômico do país e da região".
Em Teerã, o ministro iraniano das Relações Exteriores do Irã, Mohamad Javad Zarif, ligou para o chanceler iraquiano, Hoshyar Zebari, para oferecer o apoio de seu país ao governo e povo iraquianos frente ao terrorismo, informou a agência oficial Irna.
O ministro iraniano insistiu na necessidade de um apoio internacional ao governo de Bagdá diante da situação no Iraque.
De acordo com especialistas, o EIIL no Iraque é formado, em grande parte, por ex-membros dos serviços de segurança de Saddam Hussein, que se uniram à rebelião após a invasão americana. As tropas iraquianas, formadas pelos Estados Unidos do zero, nunca conseguiram se organizar em uma verdadeira força armada.
Tendo com principal área de atividade o oeste iraquiano, a partir de onde se infiltrou na Síria por uma longa fronteira porosa, o EIIL recebe o apoio de tribos contrárias ao governo e de parte da minoria sunita, que se considera marginalizada pelo poder xiita.
O EIIL não parece contar com o apoio de um Estado e, segundo os analistas, recebe a maior parte de seus recursos de doadores individuais, em sua maioria oriundos do Golfo Pérsico. No Iraque, o grupo também depende de personalidades tribais locais.
*AFP