Solicitado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico do Estado (Iphae), o tombamento do casario da Rua Luciana de Abreu, na Capital, pode dar fim a um processo judicial que se arrasta há mais de 10 anos e está em vias de chegar aos tribunais superiores, em Brasília.
O pedido, feito no final do ano passado, é analisado pela Procuradoria-Geral do Estado, que não tem prazo para se manifestar. Enquanto a indefinição persiste, os seis casarões da década de 1930 sofrem com vandalismo e falta de conservação. A presença de vigilantes contratados pela construtora Goldsztein, atual dona dos imóveis, evita que moradores de rua e usuários de drogas se instalem no local, mas há sinais de deterioração, como telhas caídas e vegetação crescendo sobre as paredes. Também há pichações.
A Goldsztein tem planos de construir prédios de 16 andares no terreno, projeto questionado por moradores do entorno, que se mobilizam para impedir a realização da obra desde 2002. Enquanto os recursos interpostos pelo Ministério Público Estadual (MP) estão em análise na 1ª vice-presidência do Tribunal de Justiça (TJ-RS) para possível remessa ao Superior Tribunal de Justiça e ao Supremo Tribunal Federal, a derrubada das construções está suspensa por decisão liminar, mas o tombamento impediria definitivamente que as casas sejam demolidas.
- O bairro já está saturado, sem contar o aspecto histórico e o potencial turístico dos casarões - comenta Raul Agostini, presidente do movimento Moinhos Vive.
IPHAE DEFENDE VALORES ESTÉTICOS E AMBIENTAIS
Os casarões teriam sido projetados pelos arquitetos Theo Wiedersphan, responsável por conceber prédios como o que hoje abriga o Memorial do Rio Grande do Sul, e Franz Filisinger. Documentos anexados ao processo, entre eles cópias autenticadas das plantas com o carimbo do escritório Wiedersphan, foram consideradas insuficientes pela Justiça.
- Independentemente do autor, há valores estéticos e ambientais que qualificam aquele conjunto como bem histórico e artístico - defende a diretora do Iphae, Mirian Sartori Rodrigues.
O advogado Milton Terra Machado, que representa a Goldsztein no processo, diz que a construtora está "em compasso de espera". Em novembro passado, um acordo entre MP e construtora foi firmado prevendo a restauração e manutenção de três casarões. O acerto foi invalidado pelo Conselho Superior do MP, de modo que o processo voltou à Justiça. Machado recorreu ao Conselho Superior do MP pedindo que a decisão sobre o acordo seja reconsiderada. Se validado, o acerto encerraria o processo e evitaria remessa a Brasília - mas colocaria abaixo três casarões.
- O acordo é bom para todos. No nosso entendimento, houve equívoco na avaliação do Conselho - afirma Machado.
No entanto, se o casario for tombado pelo Estado nesse meio tempo, o acordo se tornaria inviável e o processo em andamento seria automaticamente anulado.
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UMA DÉCADA DE DISCUSSÃO
-Em 2002, diante da reação contrária de moradores do bairro Moinhos de Vento à derrubada de seis casarões na Rua Luciana de Abreu para dar lugar a um empreendimento imobiliário, o MP ajuizou uma ação civil pública em defesa do valor histórico, cultural e arquitetônico do casario.
-A ação foi julgada improcedente em primeira e segunda instância. No ano passado, um acordo foi firmado entre MP e construtora, prevendo a manutenção de três casarões. Outros três poderiam ser derrubados. O acordo não foi homologado pelo Conselho Superior do MP e voltou a tramitar no Judiciário. A defesa da Goldsztein recorreu ao Conselho pedindo que a decisão seja reconsiderada.
-O TJ-RS deferiu liminar à ação cautelar ajuizada pelo MP, concedendo efeito suspensivo enquanto os recursos especial e extraordinário não forem julgados pelo Superior Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal Federal. O mérito da ação cautelar foi julgado em maio deste ano, mantendo o efeito suspensivo. Assim, as seis casas não podem ser demolidas enquanto não houver decisão dos tribunais superiores a respeito da ação civil pública.
-Antes de serem remetidos aos tribunais superiores, os recursos são examinados pela 1ª vice-presidência do TJ-RS. Não há previsão de prazo para essa análise.
-Em dezembro do ano passado, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico do Estado (Iphae) abriu processo de tombamento do casario da Luciana de Abreu. O pedido é analisado pela Procuradoria-Geral do Estado. Se for decretado como tal, o casario, obrigatoriamente, deverá ser preservado, encerrando a disputa que tramita há mais de 10 anos na Justiça.