A demolição do Presídio Central de Porto Alegre começa na terça-feira, colocando abaixo um ícone do descaso com a população carcerária. Um dos prédios da estrutura original da cadeia erguida há 55 anos, o pavilhão C foi palco de motins e assassinatos, além de embrião do crime organizado e da guerra entre facções no Rio Grande do Sul. Até os seus últimos dias, segue gerando controvérsias.
O pavilhão C foi escolhido para tombar primeiro porque é motivo de vergonha internacional. Em meados de 2008, presos destruíram a terceira galeria (terceiro andar), deixando o local como se tivesse sido devastado por bombardeio. Quando chovia, apenados dormiam pendurados em redes no forro, igual a morcegos. As celas eram inundadas pela água.
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As imagens correram o país e o mundo. Em Brasília, a CPI do Sistema Carcerário rotulou o Central como o pior presídio do Brasil e chegou a indiciar autoridades gaúchas - depois recuou - por omissão.
No ano passado, as condições inóspitas do presídio de uma forma geral, como superlotação, esgoto correndo a céu aberto, proliferação de doenças e risco de incêndio, levaram o Brasil a ser denunciado à Comissão Interamericana de Direitos Humanos, organismo ligado à Organização dos Estados Americanos (OEA). Por tudo isso, somado ao fato de ser o pavilhão menos abarrotado - tinha cerca de 370 presos, enquanto outros beiram mil -, o C vai ao chão antes dos demais.
Ao mesmo tempo em que acumula esses problemas, o pavilhão C ainda é considerado o melhor do Central por causa dos dois pavimentos iniciais. A primeira e a segunda galerias são as mais bem cuidadas de toda cadeia. Paredes pintadas sem riscos e sem fotos de mulheres nuas. Cozinha, lavanderia e banheiros bem conservados, e as portas das celas, em madeira, originais, dos tempos da inauguração em 1959.
Sempre que um visitante queria conhecer o Presídio Central, era apresentado ao C, porque a facção dominante era obediente às regras da casa. No ano passado, a terceira galeria começou a ser reformada com mão de obra prisional. Por essa razão, juízes da Vara de Execuções Criminais (VEC) da Capital se mostraram contrários à demolição começar pelo prédio sem que, ao menos, fossem consultados. Presos que estavam no C e foram transferidos provisoriamente para a Penitenciária de Montenegro - até dezembro deverão ir para a nova cadeia de Canoas - também reclamaram da mudança.
O C ganhou fama como pavilhão da discórdia no final dos anos 1980, quando foi plantada a semente das primeiras facções no Estado. Entre 1989 e 1991, o pavilhão foi cenário de duas das mais sangrentas guerras entre quadrilhas, com oito apenados mortos - seis deles carbonizados. Meses depois, lá foram encarcerados integrantes da gangue de Jorge Luís Queirós Ventura, o Jorginho da Cruz, líder do tráfico no Morro da Cruz, na Capital, que tinha duas pistolas calibre 7.65.
Ao mesmo tempo em que matava atrás das grades, o bando de Jorginho planejou sequestros - não concretizados - de um juiz da VEC e do então governador Alceu Colares (1991 a 1994), com objetivo de soltar comparsas. Dono do pavilhão C, Jorginho se rebelou em sangrentas disputas contra Dilonei Francisco Melara, então líder do pavilhão B, impedindo a organização de uma facção única de criminosos. Tempos depois, o C foi dominado pela quadrilha Os Brasa, que seguiu a guerra contra a facção de Melara até a morte dele, em 2005.