
A adolescente atacada por dois homens na noite de domingo, nas proximidades do Anfiteatro Pôr do Sol prestou depoimento no Departamento Estadual da Criança e do Adolescente (Deca) por cerca de uma hora, na tarde desta quinta-feira, em Porto Alegre. Conforme o pai, a estudante de 16 anos não recorda das circunstâncias do crime. Ao ver as fotos dos agressores, presos em flagrante, disse que não os reconhecia.
- Ela não lembra nada, desmaiou, havia bebido. Se estivesse sóbria, essa dor estaria pior - diz o bancário de 45 anos.
Ao retornar para casa depois do depoimento, no final da tarde, na zona leste da Capital, a garota de olhos verdes, cabelos castanho claro e piercing no nariz sorriu e brincou com a sobrinha, de quatro anos. É na expressão dos pais, ambos com olhos avermelhados pelo choro, que está estampado o drama que a família vive desde domingo, quando a garota saiu para uma festa e acabou hospitalizada após ser vítima de abuso sexual.
Sua Segurança: Indecisão diante do crime
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A família evita perguntar detalhes à estudante. Na casa simples em que ela vive com os pais e duas irmãs mais velhas, o clima é de desconforto com a libertação pela Justiça de um dos suspeitos.
- Se um pai desesperado der um tiro ou agredir um vagabundo desses, vai ficar preso vários dias. Já ele saiu no dia seguinte, mesmo preso em flagrante. Não é uma suspeita, foi consumado (o estupro), foi visto pela polícia (pelo menos um policial relatou ter encontrado o suspeito deitado sobre a jovem) - desabafa o bancário.
O pai da vítima diz que está sofrendo por medo e pelo sentimento de impunidade:
- Eu temo pela minha filha, que é uma testemunha e sai na rua, pela minha família e pelos moradores de rua que a socorreram, que fizeram o que muito engravatado não faria. Fica esse sentimento de impotência quando um juiz bate o martelo como se alguém tivesse o direito de estuprar e ficar solto.
Mas a família tem esperança. O bancário contou ter sido procurado por representantes do Ministério Público do Estado:
- Pediram tudo que eu tinha do hospital e dei autorização para retirarem o prontuário. Disseram que querem colocá-lo (o suspeito solto) na cadeia. O juiz tem liberdade para decidir, analisar fatos e leis, mas ele buscou todas as alternativas e brechas para soltá-lo.
Irmã teme que garota não volta à escola
A estudante cursa a 7ª série e tem namorado. Uma das irmãs teme que não retorne à escola neste ano, por vergonha, já que o episódio foi divulgado no Facebook.
Mas a garota sorri e diz que retomará seus compromissos. A adolescente saiu de casa no domingo por volta das 19h para uma festa na Usina do Gasômetro. Teria se perdido de uma amiga e ficado sozinha no local. No final da noite, sofreu o ataque.
- Estamos mal porque a culpa também é nossa. Acho que fica uma mensagem para os pais de que dizer não também é amar, é cuidar. Ela vive uma fase meio rebelde, não está bem na escola. Mas eu já dizia muitos nãos - reflete o pai.
Aposta policial é em provas testemunhais
O conteúdo do depoimento prestado pela adolescente na tarde de ontem, no Departamento Estadual da Criança e do Adolescente (Deca), não será divulgado pela Polícia Civil. Conforme o delegado Leandro Cantarelli Lisardo, o caso corre em segredo de Justiça.
O diretor do Deca, delegado Andrei Luiz Vivan, afirmou que o inquérito deve ser concluído em 10 dias. Sobre a afirmação do pai de que a filha não lembra detalhes do que aconteceu, ele comentou que não há provas mais ou menos fortes de um crime, e que a polícia tem relatos testemunhais do caso.
- Independentemente de ela lembrar do fato ou não, seja pelo trauma, pelas agressões ou pelo uso de alguma substância, há policiais que viram o crime sendo praticado - afirmou Vivan.
Foi graças a três moradores de rua que a polícia conseguiu prender os dois suspeitos de terem estuprado a adolescente. Ao ouvir os gritos da vítima, dois foram tentar socorrer a garota, enquanto o outro correu para chamar a polícia. O crime aconteceu próximo ao Anfiteatro Pôr do Sol, por volta das 23h30min de domingo, quando ela saía de uma festa.
Suspeito responderá processo em liberdade
Embora os suspeitos tenham sido presos em flagrante, um deles foi solto pela Justiça na terça-feira. Segundo o juiz da 6ª Vara Criminal da Capital, Paulo Augusto Oliveira Irion, ele responderá em liberdade por ser réu primário.
O homem deverá apenas comparecer em juízo regularmente e não se aproximar da vítima. A decisão judicial criou polêmica, e movimentos de proteção à mulher divulgaram nota de repúdio à medida, considerada um retrocesso.
O segundo suspeito, conforme o juiz, deverá permanecer preso até o julgamento, por já ter sido condenado por roubo com tentativa de estupro. Após o crime, a adolescente foi encaminhada desacordada ao hospital Fêmina, onde permaneceu internada até terça-feira.