A prioridade deve ser provar que o discurso da intolerância à corrupção é verdadeiro e fazer uma devassa na Petrobras.

Ninguém tem poder absoluto para escolher a forma como será visto pela História, mas quem chega à Presidência da República se vê, com frequência, diante de decisões cruciais para a forma como aparecerá nos livros do futuro. Primeira mulher a se eleger presidente, Dilma Rousseff está em uma dessas encruzilhadas: o que fazer para preservar a biografia e salvar o segundo mandato, conquistado há menos de um mês e que os adversários consideram natimorto?
- Não tenho e nunca tive tolerância com corruptos e corruptores - disse a presidente na quinta-feira, em discurso na abertura da 2ª Conferência Nacional de Educação (Conae).
Leia todas as últimas notícias de Zero Hora
Colocar esse discurso em prática e ressuscitar a Dilma faxineira, que no início do primeiro governo afastava ministros durante a apuração das acusações do que ela chama de "malfeitos", é uma das formas de recuperar a credibilidade perdida e dar sentido a outra afirmação que ela fez diante dos educadores:
- Falamos a verdade quando destacamos que o combate à corrupção nunca foi tão firme e severo como no meu governo. A Polícia Federal, o Ministério Público e instituições do Estado brasileiro estão investigando corruptos e corruptores e não há qualquer tipo de pressão do governo para inibir as investigações.
Os cuidados começam pela formação da equipe que está sendo montada para o segundo mandato. Dilma não pode ficar sabendo pela imprensa que este ou aquele candidato a ministro tem ficha suja ou está sendo investigado por irregularidades. Em política, subverte-se o princípio de que o ônus da prova cabe a quem acusa: os futuros ministros terão de comprovar inocência antes da publicação de seu nome no Diário Oficial.
Um dos amigos que Dilma deixou no Rio Grande do Sul garante que é genuína a disposição dela para radicalizar o combate à corrupção, mesmo que isso signifique comprar brigas com os partidos aliados.
- Agora, ela não tem que se preocupar com a reeleição e pode se libertar um pouco do PT. Ela vai surpreender - previu esse amigo, dias depois da eleição.
Um exemplo da disposição para sacrificar companheiros seria a exclusão do ministro das Comunicações, Paulo Bernardo. Embora a explicação oficial para a provável saída de Paulo Bernardo seja que ele está há muito tempo no governo e quer respirar outros ares, um aliado da presidente diz que o verdadeiro motivo é a denúncia de que sua mulher, a senadora Gleisi Hoffmann, ex-chefe da Casa Civil, teria recebido R$ 1 milhão do esquema da Petrobras, por caixa 2, para a campanha eleitoral.
O exemplo mais recomendado a Dilma no trato com as suspeitas é o do ex-presidente Itamar Franco, que afastou um amigo, o chefe da Casa Civil, Henrique Har­grea­ves, quando surgiu a suspeita do seu envolvimento com os "anões do Orçamento". Três meses depois, confirmada a inocência de Hargreaves, Itamar o renomeou para o cargo. Dilma poderia fazer o mesmo com a amiga Graça Foster, presidente da Petrobras.
A presidente terá de calibrar as medidas a serem adotadas para que o paciente não morra da cura. Como existe o risco de paralisação das obras públicas se todas as empreiteiras investigadas na Lava-Jato forem declaradas inidôneas, provocando um abalo brutal na economia, a Controladoria-Geral da União oferece um remédio jurídico, o "acordo de leniência", aceito pelo Tribunal de Contas da União. O acordo de leniência é uma espécie de delação premiada para pessoa jurídica. Para continuar as obras contratadas e participar de novas licitações, a empresa tem de admitir a culpa, devolver tudo o que foi obtido de forma ilegal, renegociar o contrato e revelar quais são os agentes públicos e privados envolvidos.
Leia todas as notícias sobre a Operação Lava-Jato
A suspensão de contratos em andamento pode provocar mais prejuízo ao país, pela deterioração das obras em andamento enquanto se realiza uma nova licitação. O acordo de leniência também evitaria a onda de desemprego decorrente da eventual paralisação das obras públicas.
A criação de condições para a retomada do crescimento e a reconquista da confiança dos investidores ajudará a superar a crise política.
Para não ser tragada pela agenda do escândalo, Dilma precisa, antes de tudo, dar um norte à economia. Isso significa indicar uma equipe econômica capaz de reconquistar a confiança dos investidores, controlar a inflação e conter a erosão das contas públicas.
- Quando se tem um problema político e uma economia exuberante, a política se subordina à economia. Quando a economia vai mal, o problema político se transforma no centro de tudo - simplifica um deputado fiel ao governo.
Dilma bem que tentou driblar a crise política com uma agenda positiva na área econômica. Convidou o presidente do Bradesco, Luiz Trabuco, o preferido do mercado, para ser o ministro da Fazenda. Trabuco recusou, alegando questões societárias e de sucessão no banco, e Dilma partiu para o plano B. Pretendia anunciar Joaquim Levy no Ministério da Fazenda e Nelson Barbosa no Planejamento na sexta-feira, mas desistiu na última hora, adicionando combustível aos boatos que incendiaram Brasília nos últimos dias. Um deles dava conta de que a presidente adiara o anúncio da equipe à espera das revistas do fim de semana, já que a central de boatos especulava sobre a existência de denúncias bombásticas. Outro, que ela quer primeiro aprovar a maquiagem nas contas públicas de 2014, projeto que está no Congresso, para não contaminara nova equipe.