Um dos artífices do histórico acordo entre Estados Unidos e Cuba, o cardeal dom Jaime Ortega, arcebispo de Havana, acredita que, com o governo Barack Obama, chegou-se a um momento oportuno para o avanço nas negociações entre os dois países.
Neste domingo, após celebrar a missa na Catedral de Havana, o religioso que atuou diretamente, durante um ano, como mediador do Vaticano rompeu a discrição dos últimos dias e conversou com Zero Hora.
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Perseguida no início da Revolução Cubana e durante a implantação do socialismo, a Igreja Católica alcançou nos últimos meses um protagonismo sem precedentes desde 1959. Dom Ortega, porém, pede cautela à população: "a História se faz com pequenos passos", ensina.
Leia a seguir os principais trechos da entrevista a ZH:
Qual a importância para a Igreja Católica de Cuba ter mediado este acordo, depois de ter sido perseguida por vários anos pelo regime socialista de Fidel Castro?
A Igreja em Cuba já não enfrentava as mesmas dificuldades que teve no começo, porque, desde a vinda do papa João Paulo II, houve uma mudança muito marcante nas relações entre a Igreja e o Estado de Cuba. E foi melhorando a situação. A normalização é progressiva nas relações com a Igreja. Depois, o papa Bento também nos visitou. E foi um momento importante. Todos os avanços que foram ocorrendo nas relações com a Igreja nunca foram retirados, não houve voltas atrás, foi sempre um caminho progressivo.
Os cubanos estão ansiosos para saber quando as mudanças vão acontecer de fato.
Creio que a História não se faz com grandes passos. Se faz com pequenos passos. E tudo se alcança com pequenos passos.
Quais serão estes próximos passos?
Primeiro o que está anunciado: a abertura da embaixada americana em Havana. Depois, a embaixada cubana nos Estados Unidos. Estes são passos certos. A visita do secretário de Estado americano a Cuba, tudo isso são passos prováveis.
O senhor acredita que o momento é sensível ainda, por isso há cautela? Há risco de voltar-se atrás nas negociações?
Sim, é importante cautela neste momento. O que facilitou a negociação foi a discrição com que se fez tudo. Discrição da Igreja, do Papa, do governo cubano, de todos que intervieram. Foi algo necessário. Quanto menos pessoas intervierem em um processo deste tipo, melhor. E se conseguiu algo muito completo, muito bem costurado, sem que houvesse anúncios prévios, vazamentos, que às vezes dificultam as coisas porque criam expectativas. E, às vezes, não chegam a alcançar a dimensão que alcançou este acordo. Foi muito importante.
O fato de ter sido um Papa latino o mediador do acordo influenciou as decisões de Cuba e dos EUA?
Creio que o papa Francisco estava exercendo o seu papel de Sumo Pontífice. E os Pontífices anteriores também tiveram muitas vezes interesses e trataram de intervir também, mas havia dificuldades da parte dos Estados Unidos. Chegou-se a um momento oportuno na história dos Estados Unidos, em que tudo foi muito bem acolhido.
*Zero Hora
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