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As estradas estaduais e federais no Rio Grande do Sul levaram 991 pessoas a um caminho sem volta em 2014. Foram quase três vítimas fatais por dia devido a colisões, atropelamentos e capotamentos - grande parte causada pela imprudência de motoristas, mas, às vezes, também reflexo de problemas como a falta de estrutura e manutenção de rodovias.
Os números, embora ainda sejam alarmantes, trazem um alento: a quantidade de óbitos em decorrência de acidentes de trânsito nessas vias em 2014 é 3,7% inferior à do ano anterior, quando 1.029 vidas foram ceifadas. De acordo com o professor do Laboratório de Sistemas de Transportes da UFRGS, João Fortini Albano, como a diferença em relação a 2013 é pequena, os dados indicam uma estabilização e não uma tendência de queda, apesar do recuo após dois anos de alta.
- A majoração das multas nas ultrapassagens, a presença mais efetiva de fiscalização com novos equipamentos e os pardais retornando às estradas, e talvez uma maior conscientização por parte dos motoristas são fatores que podem ter contribuído com essa redução - explica Albano.
Entre as rodovias federais, metade do número de acidentes com mortos se concentra em apenas três estradas: a BR-116, a BR-290 e a BR-386. São vias que passam pela Região Metropolitana e cortam o Rio Grande do Sul, atravessando movimentados centros urbanos, onde, com frequência, são registrados acidentes que, mesmo com a duplicação em alguns trechos, não cessam de acontecer.
Palco de 80 acidentes com mortos em 2014, conforme levantamento da Polícia Rodoviária Federal (PRF), a BR-116 é a rodovia mais perigosa do Estado. Para chegar a essa conclusão, a reportagem se baseou no número de acidentes com óbitos por via - critério que, segundo o professor Albano, é o mais adequado por refletir a quantidade de situações de risco.
Ainda em obras que se arrastam há mais de dois anos, a estrada é marcada pelo grande fluxo de veículos em cidades como Novo Hamburgo e São Leopoldo, além da intensa presença de caminhões que escoam a produção do Estado até o porto de Rio Grande, no Sul.
BR-386 tem menos vítimas
A falta de duplicação no trecho da Serra e a escassez de passarelas na área urbana, onde há grande cruzamento de pedestres, são os principais motivos para tornar a rodovia tão perigosa, na avaliação do inspetor João Francisco Ribeiro de Oliveira, chefe da 1ª Delegacia da PRF no Estado. Ele explica que é preciso melhorar a estrutura da rodovia, principalmente na entrada e saída das cidades da Região Metropolitana cortadas pela BR-116.
A mortalidade em duas outras importantes rodovias também é alta. A BR-290 - responsável por uma das principais ligações com o litoral, cortando o Estado de Leste a Oeste - registrou 66 acidentes com vítimas fatais no ano passado. Ali, um dos principais problemas, conforme Oliveira, são os trechos nas imediações da Arena, na Capital, que registram alto índice de atropelamentos. O excesso de velocidade dos condutores a caminho das praias é outro fato apontado como desencadeador de fatalidades.
A BR-386, que liga o Noroeste à Região Metropolitana e em 2013 foi a mais violenta do Rio Grande do Sul, teve 60 acidentes com mortes em toda sua extensão. No trecho sob responsabilidade da delegacia da PRF em Lajeado, 40% das mortes foram decorrentes de colisões frontais - que somam apenas 3% do total de acidentes.
- O alto fluxo de veículos, especialmente caminhões, contribui para o número de mortes. Nós temos investido na fiscalização. Desde 2008, o fluxo aumentou em 80%, mas o índice de vítimas fatais tem diminuído - explica o inspetor Leandro Wachholz, chefe substituto da delegacia da PRF em Lajeado.
Trecho une as vias mais perigosas
No ano passado, um dos trajetos mais perigosos para os motoristas foi a ERS-239, que contabilizou 29 acidentes com vítimas fatais, conforme levantamento do Comando Rodoviário da Brigada Militar (CRBM). Os primeiros 40 quilômetros da estrada, entre Novo Hamburgo e Taquara, registraram 18 mortes em 2014: é o trecho com maior número de vítimas fatais entre as estradas estaduais. E ali, no entroncamento com a BR-116, a rodovia federal mais perigosa e uma das mais violentas estaduais se encontram.
O grande volume de carros é mencionado como fator decisivo para o índice de mortes na região do Vale do Sinos. Para o sargento Dalvo da Rocha, do Comando Rodoviário da Brigada Militar de Sapiranga, que atende o trecho com trânsito mais violento no Estado, na ERS-239 - importante ligação entre o Vale dos Sinos e o Litoral Norte -, o risco é maior nos primeiros quilômetros porque os motoristas tendem a acelerar em demasia no trecho duplicado.
Queda de óbitos nas estaduais
Com 26 acidentes fatais, a segunda via mais violenta no ano passado foi a ERS-122, que tem início em São Sebastião do Caí e termina nas imediações de Vacaria. De acordo com os dados da CRBM, os acidentes se concentram principalmente entre os quilômetros 61 e 80, entre Caxias do Sul e Flores da Cunha. Nesse trecho, que corresponde a 11,8% da rodovia, foram registrados 40% das mortes no ano passado.
Mesmo ceifando quase 500 vidas, as estradas estaduais registraram menos mortes no ano passado: em 2013, o número de vítimas fatais em acidentes foi 10% maior, causando um total de 541 óbitos.
A RSC-287, que vai de Montenegro a Santa Maria, cortando o Rio Grande do Sul de leste a oeste em pista simples, completa a tríade de rodovias estaduais com maior número de acidentes com mortes em 2014: foram 26 casos.
O que diz a EGR
Responsável pelo trecho da ERS-239 com maior número de mortes entre as rodovias estaduais, a Empresa Gaúcha de Rodovias (EGR) informa que está em andamento uma licitação para projeto de construção de quatro passarelas na rodovia.
As obras em estudo e sem previsão para saírem do papel são para os quilômetros 24, 29, 43 e 51, em Campo Bom, Sapiranga, Parobé e Taquara, respectivamente. A EGR também destaca que, no ano passado, construiu uma passarela em Parobé em um ponto onde ocorriam bastante acidentes.
O que diz o Dnit
Conforme o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), a BR-116, que possui 660 quilômetros de extensão no RS, recebe "investimentos permanentes". O órgão ressaltou que tem contratos para "manter a estrada em condições de trafegabilidade e segurança" e que o trecho que mais registrou mortes em 2014, entre Morro Reuter e Esteio, é o que mais recebe investimentos. Segundo o Dnit, estão em elaboração projetos de 20 intervenções na pista e de construção de 20 passarelas ao longo de 38,5 quilômetros, entre Novo Hamburgo e Porto Alegre.
* Colaborou Cleidi Pereira