
O discurso da presidente Dilma Rousseff para pedir paciência com as recentes medidas impopulares pode ter um efeito contrário ao pretendido: amplificar as manifestações antigoverno previstas para o dia 15 de março.
Para cientistas políticos ouvidos por ZH, o "panelaço" criado como resposta ao pronunciamento de Dilma na noite de domingo atraiu atenção para os demais protestos que vêm sendo organizados. Na opinião de especialistas, a presidente esperou tempo demais para vir a público e não utilizou a linguagem mais apropriada para apaziguar as insatisfações.
A bateção de panelas foi convocada pelo aplicativo de troca de mensagens WhatsApp. Registrada em pelo menos 12 cidades do país - entre elas, Porto Alegre -, a manifestação somou adeptos ao criar uma corrente: a mensagem que incentivava o protesto pedia vaias e terminava com um "passe adiante". Perfis no Facebook também se engajaram.
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Veja a íntegra do pronunciamento de Dilma
Na Capital, a exemplo de outras cidades, principalmente moradores de bairros de classe média e alta promoveram o panelaço, que não chegou a ser generalizado. As batidas foram ouvidas em regiões como Bela Vista, Mont'Serrat, Rio Branco e Petrópolis. A consultora Claudia Zanchi, 55 anos, residente no bairro Bela Vista, recebeu o convite por WhatsApp de uma amiga. Às 20h40min de domingo, acompanhou os vizinhos na mobilização:
- Não estou satisfeita com as coisas que estão acontecendo.
Já o administrador André Luiz Santos, 58, morador do Petrópolis, usou uma buzina para fazer barulho. Ele atribui à instantaneidade do aplicativo a mobilização de domingo:
- Por ele (WhatsApp), recebo muita informação sobre o que está acontecendo no Brasil inteiro, então conseguimos nos organizar em Porto Alegre também.
Reprodução da mensagem via WhatsApp:

Para o cientista político Benedito Tadeu César, a presidente deveria ter se manifestado antes da adoção de medidas como os aumentos nos preços dos combustíveis e da energia elétrica, e não depois. Assim, o impacto político seria menor.
- A Dilma deveria ter falado muito tempo antes, e a linguagem que ela utilizou não atingiu a população. Deveria ter explicado o que é déficit público, por que essas medidas tiveram de ser tomadas - avalia César.
Como resultado da manifestação tardia, o cientista político acredita que Dilma insuflou as manifestações contra ela própria.
- Com a divulgação do panelaço na mídia, agora todos ficam dizendo que teve manifestação contra o governo e que haverá outras. Se antes atingia 10% da população, ficou uma coisa muito maior - analisa.
O cientista político e professor da UnB Alexandre Gouveia também acredita que Dilma estimulou as reações contrárias ao errar o timing do seu discurso. A mobilização, somada a outros indicadores atuais, seria um sinal de que os protestos tendem a ganhar maior dimensão.
- O panelaço é um indicador de insatisfação, estimulada por fatores como Dilma ter feito aquilo que havia prometido não fazer durante a eleição, além dos problemas econômicos e da inflação - analisa Gouveia.
No dia 15, movimentos contrários a Dilma devem realizar marchas em diversas cidades. No dia 13, porém, outras manifestações convocadas pelo setor sindical devem ocorrer em defesa da Petrobras e de direitos trabalhistas.
Para o coordenador do curso de Ciências Sociais da Ulbra, Paulo Moura, embora o panelaço tenha se concentrado em bairros de renda maior, o sentimento de frustração é mais amplo:
- A pesquisa Datafolha (realizada de 3 a 5 de fevereiro) mostrou uma grande queda na popularidade da presidente, que agora está em apenas 23%.