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Ao falar que "o PT está velho" e "só pensa em cargos", o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva externou críticas que já fazia em reuniões reservadas, inclusive com a presidente Dilma Rousseff. Estratégicas, as declarações tentam chacoalhar um partido que passa pelo momento mais delicado dos últimos 12 anos, desde sua chegada ao Planalto, e preocupado com as eleições de 2018.
Se já sofria com a baixa aprovação de Dilma, o desempenho da economia e as medidas impopulares do ajuste fiscal, o PT ficou mais acuado após a nova etapa da Operação Lava-Jato, que prendeu executivos de Andrade Gutierrez e Odebrecht. A intenção da Polícia Federal de apurar as relações de Lula com a Odebrecht acentua o temor sobre o desfecho de uma investigação capaz de comprometer o futuro político da legenda e de seu principal líder.
- A situação é delicada. Políticos com mandato vão deixar o PT já nas eleições municipais de 2016. Era difícil ver alguém sair do partido, o que mostra que o prestígio está em baixa - afirma David Fleischer, professor emérito de Ciência Política da Universidade de Brasília (UnB).
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Analistas, parlamentares e ministros avaliam que a saída da crise passa por uma reaproximação entre Lula e Dilma. A presidente confidenciou a conselheiros que ficou chateada com as críticas públicas. Apesar das cobranças da cúpula, a postura no Planalto é evitar a defesa enfática do PT, posição que desagrada à bancada no Congresso e à base. A prioridade é recuperar a economia, pavimento para manter as conquistas sociais, principal ativo nas urnas.
O discurso de renovação de Lula dá fôlego para correntes que defendem essa bandeira há mais tempo, a exemplo da Mensagem ao Partido, do ex-governador Tarso Genro e do atual ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo.
Alas apoiam inflexão mais forte à esquerda
Abertura para novos candidatos e repensar as alianças estão no radar do PT para 2016. O cientista político Adriano Oliveira, professor da Universidade Federal de Pernambuco, entende que a sigla tende a ter menos prefeitos e vereadores, mas considera possível reverter o cenário no longo prazo:
- A recuperação da economia, a reeleição de Fernando Haddad na prefeitura de São Paulo e um processo de renovação de lideranças serão decisivos. É possível que, em 2018, Dilma tenha aprovação de 40%, o que tornaria o cenário viável a Lula e ao PT.
Uma das urgências observadas é devolver o fervor da militância, parte acomodada com os 12 anos de Planalto e parte desanimada com os episódios de corrupção e as alianças firmadas nesse período. Alas do partido defendem uma inflexão mais forte à esquerda, retornando às origens, a fim de evitar que outra legenda possa ocupar o espaço.
- O PT vem perdendo a militância mais aguerrida, mas tem força para reagir. Não se menospreza o PT, que é o maior partido do Brasil - avalia Maria do Socorro Braga, cientista política da Universidade Federal de São Carlos.
Em jogo até 2018
Candidato próprio ou aliança
Com a perspectiva de desempenho fraco nas eleições municipais do próximo ano, o PT já mira 2018 preocupado. Há dúvidas sobre a candidatura do ex-presidente Lula, que externou a aliados que não entrará na disputa caso permaneça o atual cenário do governo Dilma. Três opiniões circulam no partido: lançar candidato mantendo a aliança com o PMDB, apostar em uma chapa de esquerda e romper com PMDB ou ser o vice de um presidenciável peemedebista, opção menos provável.
Relação com o governo Dilma
No Planalto, é considerada inócua qualquer estratégia que pregue um descolamento entre as imagens de Lula e Dilma. Se o governo naufragar, o ex-presidente e o PT seguem caminho similar. As críticas de Lula à afilhada política seriam uma forma de chacoalhar o governo, a fim de acelerar uma reação e exigir que Dilma defenda o legado do padrinho. O grupo da petista aposta na continuidade dos anúncios da agenda positiva e acredita em recuperação da popularidade apenas em 2016.
Renovação de lideranças
Lula criticou a falta de renovação no PT. O ex-presidente é o único candidato de peso que o partido dispõe para 2018 -uma opção seria o atual ministro da Defesa e ex-governador da Bahia, Jaques Wagner. A baixa renovação se reflete em alguns Estados, a exemplo do Rio Grande do Sul, onde Tarso Genro e Olívio Dutra se revezam na disputa do Piratini desde 1990. A intenção do PT é repetir São Paulo com Fernando Haddad na prefeitura. Outra vontade é incentivar novos quadros a deputado.
Recuperar a identidade
Ao criticar o apego do partido a cargos, Lula tenta incentivar o PT a voltar às origens. A legenda reconhece que a militância já não vai às ruas com o mesmo fervor de décadas passadas. Uma ala do partido prega uma guinada forte à esquerda a fim de recuperar a relação com movimentos sociais. Bandeiras antigas, a exemplo da reforma agrária, podem ser retomadas no discurso e nas ações do governo. O PT também estuda ampliar seu espectro de apoio, dentro de uma nova frente de esquerda.