
Em Brasília, a sede do Banco Central (BC) está localizada a pouco mais de um quilômetro do Ministério da Fazenda, um trajeto que pode ser percorrido em pouco mais de 20 minutos a pé. Mas levando-se em conta as recentes decisões tomadas e medidas adotadas, seria esperado que as duas instituições estivessem situadas lado a lado, talvez até dividindo o mesmo prédio na Esplanada. Nesta quarta-feira, um dia depois de o Fundo Monetário Internacional (FMI) projetar o aprofundamento da recessão na economia brasileira nos próximos dois anos, o BC decidiu manter a taxa básica de juro (Selic) em 14,25% ao ano.
Na mesma semana, o ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, sinalizou um programa para estimular o crédito para empresas. O Planalto mostra que, assim como ocorreu no primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff, entre 2011 e 2014, a bússola do governo voltou a apontar para o crescimento econômico mesmo às custas do controle da inflação. As apostas pela manutenção do juro cresceram após o presidente do BC, Alexandre Tombini, ter emitido nota na terça-feira avaliando como “significativas” as revisões das projeções de Produto Interno Bruto (PIB) para o Brasil em 2016 – queda de 3,5% – e 2017 – zero.
Para analistas de mercado, foi uma indicação que o juro iria permanecer no mesmo patamar que está desde julho passado. Na última reunião de 2015, o colegiado deixou a Selic em 14,25%, com placar dividido – seis votos pela manutenção e dois pelo aumento para 14,75%.
Recentemente, a pressão sobre a instituição cresceu frente ao fraco ritmo da economia. A dúvida que divide economistas agora é se os preços, alimentados pela alta do câmbio, começarão a ceder nos próximos meses de maneira natural ou se será preciso novo aperto monetário para segurar a inflação. Por enquanto, o mercado avalia que nova alta será necessária – o relatório Focus aponta projeção de Selic a 15,25% no final do ano.
Para José Luiz da Costa Oreiro, professor de Economia da UFRJ e presidente da Associação Keynesiana Brasileira, a decisão tomada faz sentido.
– A inflação está neste patamar alto em parte pelo reajuste dos preços administrados ano passado, como gasolina e energia elétrica, e pela disparada do dólar. Não tem a ver com excesso de demanda. Ou seja, aumentar mais o juro não funciona, só aprofunda mais a recessão – explica.
Na avaliação do economista, aumentar a Selic agora só traria mais impactos para a dívida pública:
– O governo perdeu a única oportunidade real de segurar a inflação quando optou por reajustar o salário mínimo acima da inflação. Impedir o aumento seria a melhor maneira de evitar uma inflação no setor de serviços.
O trabalhador perderia de um lado, mas ganharia em outro, quando a inflação cedesse. Roberto Elerry, professor de Economia da Universidade de Brasília (UnB), concorda que o dólar tem empurrado os preços para cima, mas avalia que o BC errou ao não subir o juro.
– O câmbio é a faísca, e a inflação, o incêndio. Cabe ao BC mostrar ao mercado que o fogo vai ser controlado. Se a população entender que controle dos preços não será prioridade a partir de agora, começa a reajustar os valores dos produtos por conta, baseado apenas na expectativa futura – afirma Elerry, pontuando que é obrigação do BC impedir que isso aconteça.