
O chefe da Casa Civil, Jaques Wagner, afirmou nesta quinta-feira que a presidente Dilma Rousseff está "muito indignada" com o acordo de delação do senador Delcídio Amaral (PT-MS) e o vazamento do conteúdo da declaração dele à revista IstoÉ.
– (A presidente) está com a mesma indignação que eu, talvez até mais que eu, porque envolve diretamente o nome dela – afirmou. – Ela está preocupada porque eu acho que é uma coisa totalmente fora de qualquer padrão. Uma delação que eu não sei se foi, pelo que eu sei, não foi homologada, que envolve ministros e, principalmente, a figura da Presidência da República. Aí, está totalmente de cabeça para baixo – disse.
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Wagner afirmou ainda que "tem muita poeira e pouca materialidade" no acordo de delação e comparou o vazamento ao escândalo da Escola Base, da década de 1990, em que os donos do colégio de São Paulo foram inocentados anos depois de denúncias de abuso infantil.
– Eu prefiro ser objetivo, fático. Esse fato é intolerável numa República e num Estado Democrático de Direito. Se faz um linchamento público, seja de quem for, para depois alguém dizer: "É, não valeu, não vale nada".
Ele disse ainda que é "um absurdo completo" a execração pública para depois alguém provar que algo está diferente.
– Tocaram fogo na escola, tocaram fogo na família, tocaram fogo nas pessoas, para dois anos depois dizerem: "Ih, não é nada disso". Então, não dá, gente. Eu acho que isso aqui é um absurdo completo – disse.
Wagner, que se reuniu com Dilma e com o ex-ministro da Justiça e novo chefe da Advocacia-Geral da União (AGU), José Eduardo Cardozo, para definir uma estratégia de reação do Poder Executivo, também levantou suspeitas sobre a veracidade das informações de Delcídio, mas preferiu não "adjetivar" se as razões do acordo de delação seriam uma espécie de vingança. O chefe da Casa Civil declarou ainda que o suposto acordo de delação "tem muita inconsistência" e que o senador do PT de Mato Grosso do Sul "é o delator, ele é a testemunha, ele é tudo".
– Na minha opinião, tem muito pouca materialidade – acredita.
Após a divulgação do acordo de Delcídio, a administração federal tem tentado desqualificar as falas dele, alegando que o senador tem mentido. Desde que deixou a prisão, Delcídio afirmava que não faria acordo de colaboração premiada, pois "reescreveria" a história "sem revanchismo". Perguntado se Cardozo poderia ter conhecimento do acordo e por isso ter deixado o cargo, Wagner rebateu dizendo: "Vocês sempre pressupõem que a gente conhece de tudo".
– O que mudaria a gente tirar ou deixar o José Eduardo Cardozo, até porque ele foi pra AGU, ele continua ministro? – questionou.
Wagner também evitou comentar a possibilidade de o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que é inimigo público do Executivo, estar por trás do vazamento.
– Não, aí eu não tenho e, até gosto porque eu não tenho uma cabeça conspirativa, eu prefiro dizer o seguinte: o fato é inaceitável, que alguém pegue algo que vale ou não sei se vale, bote em qualquer órgão de imprensa – acha.
O chefe da Casa Civil julga que o acordo de delação que estava sob sigilo da Justiça não poderia ter sido vazado e que "estão receptando informações", mas que não caberá ao Ministério da Justiça investigar os vazamentos.
– No caso, não tem o que o Ministério da Justiça apurar porque só teve a delação – admitiu. – Se couber a alguém é a própria Procuradoria-Geral da República (PGR) – completou, ressaltando que a gestão federal mantém "relações harmônicas e respeitosas com os outros Poderes".
Delação
De acordo com a IstoÉ, Delcídio teria dito em acordo de delação que Dilma tentou atuar ao menos três vezes para interferir na Operação Lava-Jato por meio do Judiciário.
– É indiscutível e inegável a movimentação sistemática do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo e da própria presidente Dilma Rousseff no sentido de promover a soltura de réus presos na operação – afirmou o senador do PT no acordo, segundo a revista.
Cardozo deixou esta semana o ministério alegando sofrer pressões do PT. Na delação, Delcídio teria citado também o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e detalhado os bastidores da compra da refinaria de Pasadena pela Petrobras. As primeiras revelações do ex-líder do governo fazem parte de um documento preliminar da colaboração.
Nessa fase, o delator indica temas e nomes que pretende citar em seus futuros depoimentos após a homologação do acordo. Delcídio foi preso no dia 25 de novembro do ano passado acusado de tentar atrapalhar as investigações da Operação Lava-Jato e solto no dia 19 de fevereiro. O senador foi denunciado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) ao Supremo pela tentativa de atrapalhar investigações.
Em conversas gravadas pelo filho do ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró, o senador aparece negociando o silêncio do ex-diretor da estatal. Nas gravações, Delcídio sugere uma rota de fuga e dinheiro à família de Cerveró, para não ser mencionado em eventual acordo de delação premiada. Na delação, de acordo com a revista, o senador teria negociado com Cerveró a mando do ex-presidente Lula.