
O ex-presidente desembarcou em Brasília disposto a salvar o governo, o PT e o seu legado político. Em paralelo, desmoralizar a Operação Lava-Jato está no seu horizonte. Essas estratégias foram colocadas em prática em café da manhã que teve com Renan Calheiros (PMDB-AL) como anfitrião nesta quarta-feira. O líder petista prometeu que, a partir de agora, irá mais à capital federal.
O ex-presidente chegou a Brasília na terça-feira. Jantou no Palácio da Alvorada com Dilma, o governador mineiro, Fernando Pimentel, e os ministros Jaques Wagner (Casa Civil) e Ricardo Berzoini (Secretaria de Governo). Enquanto degustavam pratos, pelo WhatsApp a bancada petista estava sendo convocada para o café na manhã seguinte na residência oficial da presidência do Senado.
A ideia inicial era reunir um grupo mais seleto, de lideranças decisivas, para que fosse possível traçar uma estratégia para barrar o crescimento do impeachment de Dilma. Encontrar-se com os velhos caciques do PMDB e alguns petistas era o desejo de Lula – até o ex-senador José Sarney (PMDB-AP) foi convidado, mas não compareceu. Contudo, a lista de convidados engordou, quase metade do Senado passou pelo café, que se converteu em palanque para discurso do ex-presidente. Em determinado momento, com a presença de vários investigados, o encontro virou uma espécie de ato de protesto contra a Operação Lava-Jato.
Na reunião, entre rodadas de suco de laranja, café e bolo, Lula repetiu o receituário sugerido desde sempre para a superação da grave crise: ampliar o diálogo com o Congresso e a base social e mudar o rumo da política econômica.
– Tem de apostar no mercado interno – disse o ex-presidente. – Ele (Lula) falou que tem de facilitar o crédito para a população e empresas – relatou Humberto Costa (PT-PE), líder do governo no Senado.
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Das dezenas de senadores que passaram pela residência oficial de Renan, grande parte contribuiu para esquentar as orelhas da presidente. Foram generalizadas as reclamações de que Dilma é fechada, avessa ao debate, excessivamente reclusa no Palácio do Planalto e de pouca capacidade de articulação política.
Essa, aliás, foi outra receita apresentada por Lula. Para ele, a petista precisa ampliar o diálogo e fazer até mesmo alguns gestos de boa vontade à oposição, como forma de tentar aplacar a crise. Lula reforçou que pretende aglutinar a esquerda e os movimentos sociais, ajudando a manter certa sustentação ao governo.
Também se discutiu a possibilidade de Lula assumir um ministério. A ideia circula há meses dentro do PT e ganhou força depois de o ex-presidente ter sido conduzido coercitivamente pela Polícia Federal para prestar depoimento, já que ele é investigado pela força-tarefa da Lava-Jato por supostamente ter recebido vantagens e pagamentos ilícitos de empreiteiras. Setores do PT pressionam para que ele aceite, e Dilma concordou com a sugestão. Já há, inclusive, discussão sobre qual seria a pasta adequada. Uma das citadas é o Ministério das Relações Exteriores.
A presença de Lula na Esplanada seria reforço para um governo carente de popularidade e, sobretudo, devolveria a ele o foro privilegiado. O ex-presidente escaparia das investigações da Lava-Jato em Curitiba e também da caneta do juiz federal Sergio Moro. Passaria a responder somente à Procuradoria-Geral da República e ao Supremo Tribunal Federal (STF). Há receio de que a estratégia amplie o desgaste de Lula, soando como uma manobra para evitar a sua eventual prisão.
– Pelo que percebi e pelo que conheço do ex-presidente Lula, não tem nenhuma chance de ele ser ministro. Ele se dispôs a ajudar fora do governo – comentou o senador Paulo Paim (PT-RS).
Lula voltou a se defender, disse que as acusações sobre o triplex do Guarujá e o sítio de Atibaia são infundadas, declarou-se perseguido pela PF, mas não explicou os motivos de as reformas terem ocorrido. Ele negou ser o dono dos imóveis e ironizou:
– No final, vão ter de me dar o sítio.
Apesar da aparente confiança, os relatos são de que Lula "não estava irritado, estava sereno, mas também não estava feliz". Não foram ouvidas suas piadas e metáforas. Por outro lado, há quem tenha ficado com a sensação de que "ele é candidatíssimo para 2018".
Na saída da residência oficial, Renan fez um gesto público de crítica às apurações da Lava-Jato. Ele, que é um dos investigados por suposto recebimento de propina, entregou uma Constituição a Lula.
– É preciso que as investigações avancem, mas no devido processo legal, com liberdade de expressão, com direito de defesa, com presunção de inocência, como diz a Constituição Federal – disse o peemedebista.