Exatos 1.902 dias após passar a faixa presidencial a Dilma Rousseff, Luiz Inácio Lula da Silva volta a ocupar um gabinete no Palácio do Planalto. O ex-presidente toma posse nesta quinta-feira, às 10h, como ministro da Casa Civil para coordenar a articulação política do governo. Em entrevista coletiva logo após o anúncio oficial nesta quarta-feira, Dilma admitiu ter outorgado carta-branca ao petista:
– O presidente Lula, no meu governo, terá os poderes necessários para nos ajudar, ajudar o Brasil.
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A primeira missão de Lula será frear o avanço do processo de impeachment de Dilma. Para tanto, já acenou com um armistício ao PMDB, dono das maiores bancadas na Câmara e no Senado e há meses às turras com a presidente. Seu maior aliado para conter o grupo do vice-presidente Michel Temer, que articula rompimento com o Planalto, é o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL). Lula ligou para os dois ontem, pedindo reunião para pôr fim à crise.
– Ele tem boa relação com o Congresso e torço para que o Brasil melhore, que as coisas comecem a dar certo – disse Renan.
Apesar da boa vontade do senador e da avaliação de que o governo ganha fôlego com Lula, o petista terá dificuldade em compor um bloco orgânico, mesmo recorrendo à velha prática da troca de cargos e emendas por sustentação política. No Senado, dois ex-ministros de governos petistas, Eunício Oliveira (CE) e Romero Jucá (RR), têm orientado o baixo clero a manter distância do Planalto.
– Esse pessoal sente de longe o cheiro de um governo putrefato.
E, se alguém achava que poderia ser protegido pelo Planalto, perdeu todas as ilusões no dia em que o Lula foi levado para depor – disse influente peemedebista.
A presença do líder petista tampouco significa respaldo popular ao governo, ainda mais depois da revelação do diálogo entre Lula e a Dilma reforçando acusações da oposição de que a nomeação do ex-presidente para o ministério poderia ser utilizada para obstruir ações da Operação Lava-Jato.
Negada, possível reforma ministerial ganha força
Antes de se tornar o primeiro ex-presidente a virar ministro de um governo subsequente, Lula relutou. Em conversas reservadas, chegou a dizer que "uma mesa não pode ter duas pessoas na cabeceira", em alusão à proeminência sobre Dilma.
Até o acirramento da crise, preferia influenciar de longe. Foi assim que forçou a saída de José Eduardo Cardozo do Ministério da Justiça, patrocinou a substituição de Joaquim Levy por Nelson Barbosa na Fazenda e de Aloizio Mercadante por Jaques Wagner na Casa Civil – agora desalojado por ele, mantendo status de ministro no papel de assegurar o elo entre Dilma e o antecessor.
Com o salvo-conduto da presidente, Lula já planeja uma reforma ministerial. A presidente refutou trocas em entrevista, mas as especulações são grandes, a partir de um novo mapeamento da base no Congresso. Retorna a ideia de repassar ministérios a políticos com votos em suas bancadas.
A Educação pode ser oferecida para Ciro Gomes, a fim de assegurar a fidelidade do PDT – hipótese que não foi bem aceita entre os parlamentares.
Ainda ontem, George Hilton, do PRB, que já flertava com o impeachment, abandonou o Ministério do Esporte. Edinho Silva herdaria a pasta, deixando a Secretaria de Comunicação, que seria repassada a um nome indicado por Lula. O retorno de Celso Amorim ao Itamaraty, na vaga de Mauro Vieira, seria para fortalecer a política externa. Henrique Meirelles no Banco Central é uma ideia para agradar o mercado.