
Coração do centro financeiro de São Paulo, a imponente Avenida Paulista teve o seu concreto e asfalto pintados de verde e amarelo, naquela que se tornou a maior manifestação do país em favor do impeachment da presidente Dilma Rousseff. O protesto estava marcado para começar às 15h deste domingo, mas, pouco antes do meio-dia, a concentração era grande, diversos caminhões de som já ecoavam discursos ácidos ao governo. Às 13h, o ato havia tomado a avenida por inteiro e também as suas adjacências.
A Polícia Militar estimou que 1,4 milhão de pessoas compareceram. Os organizadores apontaram 2,5 milhões. Bandeiras e camisas do Brasil foram maioria, muitos manifestantes tinham traços de tinta verde e amarela no rosto. Famílias participaram de forma intensa: por todos os lados havia crianças acompanhadas dos pais e avós. Gente de todas as idades. O protesto em São Paulo tinha como alvos Dilma, o ex-presidente Lula e o PT.
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– Estamos sendo achincalhados, não há respeito ao povo. Sou totalmente favorável ao impeachment. Já não há mais governo – avaliou Octávio Marcondes Machado, 47 anos, que vestia verde e amarelo dos pés à cabeça.
O juiz federal Sergio Moro, que conduz processo da operação Lava-Jato, foi saudado como herói. Faixas e cartazes cumprimentavam o seu trabalho. Embora o foco fosse o petismo, aqui e acolá existiam manifestações contra o PSDB e Eduardo Cunha (PMDB-RJ). O Supremo Tribunal Federal (STF) chegou a ser lembrado, acusado por manifestantes de subserviência ao PT. Foram minoritárias e pontuais as manifestações de pedido de intervenção militar. A maioria falava em “vencer através da lei e das instituições”, apontando o impeachment como uma saída democrática e constitucional.
O humor também ganhou espaço no protesto na Avenida Paulista. Incontáveis manifestantes vestiram roupas de presidiário e máscaras com o rosto do ex-presidente Lula. Os bonecos infláveis chamados de Pixuleco – uma sátira com o petista – estiveram espalhados aos montes, em todos os tamanhos. Marchinhas de carnaval adaptadas ironizavam o governo e pediam o impeachment de Dilma. Os ambulantes também saíram satisfeitos. Um Pixuleco ou uma bandeira do Brasil custavam R$ 10. Os manifestantes encontravam diversos pontos de venda de bebidas – até uma cervejinha – e alimentos.
– Vendi todos os meus cem espetinhos de churrasco – disse o ambulante João Ferreira da Silva, que, às 17h40min, já se preparava para ir embora.
As organizações envolvidas na manifestação eram diversas, mas o Vem Pra Rua e o Movimento Brasil Livre conseguiram reunir multidões em torno dos seus palanques. Diferentemente dos protestos anteriores, houve a abertura de espaço para que políticos com mandato fizessem uso da palavra. Mais do que isso, eles foram, a pedido de lideranças do MBL, aplaudidos e saudados. Passaram por lá lideranças do PSDB, DEM, PPS, PMDB e PP.
Estratégia é pressionar deputados e senadores
– Vamos trazer aqui os líderes da oposição, sim, porque o impeachment se faz com voto no Congresso – disse um dos integrantes do MBL.
A estratégia é aproveitar a manifestação massiva para pressionar os deputados e senadores a votarem a favor do impeachment de Dilma, que deve começar a ser analisado esta semana na Câmara.
– Bem-vindos ao velório do governo Dilma Rousseff. Qualquer político que votar contra o impeachment será lembrado pela história como alguém que traiu o país – discursou Kim Kataguiri, um dos mentores do MBL.
Ferrenho opositor do PT, o senador Ronaldo Caiado (DEM-GO) chegou a ter seu nome cantado por parte dos manifestantes.
– Não vamos decepcioná-los – prometeu o parlamentar.
Apesar da multidão, não foram registradas ocorrências significativas, enfrentamentos ou depredações. O ato foi pacífico e o único trabalho da Polícia Militar foi conter alguns indivíduos que se infiltraram na multidão para roubar e furtar celulares. Às 18h, decidido a voltar para casa, um homem que levava o filho nos ombros passou diante de uma fileira de cinco policiais e apertou a mão de todos eles, um a um. E assim os paulistanos regressaram, devolvendo os tons acinzentados à Avenida Paulista, depois de um dia que consideraram “histórico”.