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Depois de três anos seguidos da crise que levou a indústria gaúcha a perder quase um quinto da produção e a eliminar mais de 80 mil postos de trabalho, as fábricas do Estado esperam começar a ver enfim, em 2017, o início da retomada. Mas mesmo que projetem o fim do ciclo de retração, no quesito emprego a tendência ainda é de mais demissões. O presidente da Federação das Indústrias do Rio Grande do Sul (Fiergs), Heitor José Müller, define como "otimismo moderado" a expectativa para os próximos 12 meses:
– Batemos no fundo do poço e devemos começar a melhorar em 2017. Será um alívio, mas o crescimento será pequeno, sem recuperar todas as perdas que tivemos. Na área do emprego, continuamos céticos.
Dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) mostram que, de janeiro de 2014 a novembro do ano passado, a indústria de transformação no Estado perdeu 80.620 postos formais, 8,3% dos cortes no país no período. Em 2016, ainda sem os números de dezembro, foram 10.039 vagas perdidas. No acumulado até novembro, oito dos 12 setores analisados pelo Caged mais demitiram do que contrataram.
Expectativa de que safra agrícola ajude a reanimar a economia
Para o presidente da Fiergs, além de parecer que o pior já passou, a projeção de mais uma grande safra no Estado deve ajudar a recuperar o ânimo, com reflexos em setores como máquinas agrícolas e ligadas ao transporte. Mas as indústrias de outros tipos de máquinas e equipamentos, especialmente os adquiridos por fábricas para aumentar a produção, devem continuar a sofrer devido à alta ociosidade das empresas. Além da base reprimida de comparação, a expectativa de queda da inflação e do juro ajuda a começar a inverter o declínio da economia em 2017. Mesmo assim, fatores imprevisíveis, como o quadro político no Brasil, ainda trazem incertezas.
– Isso é fundamental, porque se reflete no otimismo dos consumidores – observa o presidente-executivo da Associação Brasileira da Indústria de Calçados (Abicalçados), Heitor Klein.
Cálculos do gerente da pesquisa industrial do IBGE, André Macedo, mostram que, do início de 2014 a outubro do ano passado, a produção das indústrias gaúchas acumula tombo de 19%.
Medido pela Fiergs, o Índice de Desempenho Industrial do Estado tem, até outubro, queda acumulada de 6,7% no ano passado – após despencar 9,5% em 2015 e 4,4% em 2014. Dos 18 setores pesquisados, só um, o de produtos de madeira, cresce: 13,4%.
– Mas dois terços disso se devem à ampliação da Celulose Riograndense – admite o presidente da Associação Gaúcha de Empresas Florestais, Diogo Leuck, referindo-se ao investimento de R$ 5 bilhões na unidade de Guaíba, que começou a operar com nova capacidade no ano passado.
Mas, mesmo com a exclusão do megainvestimento, o setor teve bom ano devido ao dólar em patamar médio superior a 2015, diz Leuck. O avanço foi mais em faturamento do que em volume de produção, explica o dirigente, que espera um 2017 estável para o setor.
Um fator pode ajudar a aquecer de forma mais acelerada a indústria caso a reação se confirme, aponta a Fiergs. Como os estoques estão baixos, o retorno da demanda teria o condão de mobilizar de maneira rápida as cadeias de fornecedores, espalhando os efeitos de uma possível retomada.
Máquinas agrícolas têm arrancada
Segmento do qual o Rio Grande do Sul detém mais da metade da produção nacional, a indústria de máquinas e implementos agrícolas iniciou uma arrancada no segundo semestre do ano passado e também vislumbra um 2017 melhor. Dados da Associação Nacional de Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) ilustram a situação. No final do primeiro semestre de 2016, as vendas de tratores acumulavam queda de 31%. Ao chegar dezembro, a retração era de 3,8%. No caso das colheitadeiras, saiu de recuo de 14% para alta de 14%.
O reflexo apareceu no emprego. No mês passado, as fábricas associadas à entidade registraram 16,8 mil postos de trabalho – aumento de 8,8% em relação a dezembro de 2015.
Com o bom preço das commodities agrícolas e a previsão de mais uma safra cheia, a entidade projeta que, em 2017, as vendas domésticas devem crescer 13% e a produção nas fábricas, subir 10,7%.
O diretor-presidente da Stara, Gilson Trennepohl, avalia que 2016 marcou o ponto de inflexão da curva de vendas e 2017 tende a ser melhor, embora ainda longe de recuperar o volume de negócios observado em 2012 e 2013.
– As vendas devem crescer em torno de 10%, com o mercado reagindo principalmente a partir do segundo semestre – diz o dirigente da empresa de Não-Me-Toque.
Em um cenário em que fatores como preço dos grãos, volume de safra e crédito não parecem ser problemas para 2017, a principal dúvida permanece no cenário político. Ou seja, se o governo não atrapalhar, já ajuda, completa Trennepohl.
Calçadistas esperam melhora em 2017
Intensivas em mão de obra, as fábricas de sapatos têm o melhor saldo de empregos pelos números do Caged ao longo de 2016. De janeiro a novembro, foram 4.155 vagas criadas no Estado, mas é preciso ficar com um pé atrás com os números, alerta o presidente-executivo da Abicalçados, Heitor Klein. Como em dezembro as empresas encerraram as entregas das encomendas relacionadas ao Natal, o último mês deve mostrar grande número de dispensas e há chance de o saldo encerrar o ano no zero a zero.
Mesmo assim, as expectativas ainda são de um otimismo cauteloso, define o executivo.
A previsão se deve à projeção de aumento das exportações ao longo do primeiro semestre, fruto de bons negócios nas feiras de setembro e outubro do ano passado, quando os fabricantes têm contato com compradores estrangeiros. E, para a segunda metade do ano, espera-se uma retomada, mesmo que lenta, do mercado doméstico, refletindo-se em mais encomendas para o próximo verão.
– No somatório, 2017 será melhor do que 2016. No emprego, também – afirma Klein.
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