
Prometido para esta terça-feira, o pedido de absolvição de três pais de vítimas da boate Kiss acusados por promotores por calúnia e difamação, será protocolado na manhã desta quarta-feira pelo Ministério Público (MP) no Fórum de Santa Maria.
O documento foi redigido na tarde desta terça-feira pelo promotor de Justiça Alexandre Salim. O recuo do MP foi anunciado na segunda-feira pelo procurador-geral de Justiça, Fabiano Dallazen. Ele explicou que os objetivos dos promotores Mauricio Trevisan, Joel Dutra e Ricardo Lozza haviam sido atingidos: fazer com que as agressões contra eles cessassem e demonstrar que a conduta na investigação do incêndio da Kiss, que matou 242 pessoas em 27 de janeiro de 2013, havia sido correta.
O presidente da Associação de Familiares de Vítimas e Sobreviventes da Tragédia de Santa Maria (AVTSM), Sérgio Silva, e seu vice, Flávio Silva, são acusados por Lozza de calúnia por terem afixado cartazes com as fotos do promotor seguida do texto: "O MP e seus promotores também sabiam que a boate estava funcionando de forma irregular". Outro pai, Paulo Carvalho, é processado por Dutra e Trevisan por calúnia e difamação por conta de dois artigos no jornal Diário de Santa Maria nos quais acusa os promotores de "corporativismo" e "protecionismo". Este processo aguarda sentença.
A defesa dos pais esperou durante todo o dia o pedido de absolvição para entender os termos do documento.
– O processo do Paulo já está concluso para sentença. Como vão fazer um pedido de absolvição se eles pediram condenação dele? Não entendi muito bem essa jogada do MP. Para mim, estão querendo sair por cima, tentando mostrar que são humanos. Mas, juridicamente, é inviável – afirma o advogado Pedro Barcellos Jr.
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O MP é o autor das duas ações contra os três pais porque os promotores são servidores do órgão. O jurista Aury Lopes, doutor em Direito Processual Penal e professor da PUCRS, explica que crimes de honra em que funcionários públicos são vítimas no exercício das funções podem ser ações penais privadas ou representadas para o órgão ao qual estão vinculados – no caso, ações penais públicas.
– Se fosse ação penal privada, se os promotores tivessem bancado, feito uma queixa-crime, poderiam ter desistido, renunciando, perdoando. Mas optaram pela via pública porque, com isso, têm o apoio da instituição Ministério Público – explica Lopes.
Tecnicamente, o MP não pode suspender os processos, que têm de tramitar até o fim.
– Pedir a absolvição é uma jogada processual. A rigor, formalmente, não existe um perdão. Estão fazendo uma desistência mascarada, disfarçada processualmente, de um pedido de absolvição – acrescenta o especialista.
Segundo o artigo 385 do Código de Processo Penal, o juiz pode condenar os réus, mesmo que o MP tenha pedido a absolvição. A decisão dos promotores não vale para a ação individual movida por Ricardo Luís Schultz Adede y Castro e o pai, o promotor aposentado João Marcos Adede y Castro, contra Irá Beuren, mãe de Sílvio, 31 anos, por danos morais. A defesa de Irá vai aguardar a sentença do juiz Carlos Alberto Ely Fontela, da 3ª Vara Cível, para recorrer da decisão, podendo usar como argumento o pedido de absolvição nos demais casos.
– Dependendo dos termos da sentença, podemos usar como argumento em recurso – avalia Patricia Michellon, advogada de Irá.