Nesta nossa tão maltratada Porto Alegre, que leva no nome um adjetivo que não corresponde à sua atualidade, vislumbra-se um alento: um pequeno grupo de artistas visuais acaba de criar a Bienal C, da Chico Lisboa. Fundada em 1938, a associação já passou por todo tipo de turbulência, e é mais uma vez geradora de um acontecimento que pretende movimentar a cidade. Duas centenas de artistas foram selecionados para participar de exposições em vários locais. E a escolha é farta: desde o Núcleo Histórico, no qual mestres que já nos deixaram se mesclam com artistas ainda em plena atividade, a outros núcleos, compostos por emergentes ou reconhecidos. Artistas há para todos os gostos. Esta mistura geral vai acontecer em paralelo à Bienal do Mercosul, cuja 10ª edição, além de prometer uma revisão da arte latino-americana, inclui um resgate parcial de nomes incontestes da arte do Rio Grande do Sul.
Será um bom programa percorrer essas mostras, e tirar conclusões. Como em toda exposição de arte, a dúvida entre o que é "contemporâneo", em contraposição ao que é "clássico ou acadêmico" se apresenta para discussão. De um lado: é possível apreciar uma pintura, desenho ou gravura que contenha uma narrativa ou um cenário identificável sem que isso seja uma demonstração de que o senso estético do artista e do observador se tornaram obsoletos? De outro: o fato de não entender a intenção do artista que propõe uma obra sem relação com a realidade conhecida, através de materiais inusuais, pode revelar que o observador é ignorante ou desinformado? Ou simplesmente deve-se tentar absorver o máximo e fruir sem contestações aquilo que está sendo mostrado?
Nestes tempos de incongruências, quando todos os dias somos sacudidos por uma novidade pior que a de ontem, essas duas bienais poderão significar um respiro no sufocante ambiente no qual estamos vivendo. A ideia de povoar com arte esta triste Porto Alegre nos traz um mínimo de esperança: talvez seja através da chama artística que possamos visualizar uma tênue luz no finzinho do túnel.