
Nesta sexta-feira, o mesmo dia em que a comissão do impeachment do Senado vota o relatório sobre seu possível impedimento, a presidente Dilma Rousseff usou mais uma cerimônia no Palácio do Planalto para defender seu mandato e atacar o presidente afastado da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e o vice-presidente Michel Temer (PMDB-SP).
– Não vamos nos iludir. Todos aqueles que são beneficiários desse processo, como, por exemplo, aqueles que estão usurpando o poder, infelizmente o vice-presidente da República, são cúmplices de um processo extremamente grave –disse.
Leia mais
"Antes tarde do que nunca", diz Dilma sobre afastamento de Cunha
Dilma diz que Cunha não deixa o Congresso trabalhar desde o início do ano
"Golpes parlamentares" substituem golpes militares, diz Dilma em entrevista à Telesur
Em seu discurso, Dilma comentou o afastamento de Cunha, decidido na quinta-feira pelo Supremo Tribunal Federal (STF), e afirmou que, com isso, o Poder Judiciário confirmou que o presidente da Câmara afastado "usava de práticas condenáveis".
– Uma das práticas mais condenáveis foi a chantagem explícita contra o meu governo – declarou, ressaltando que a situação é "descarada".
Sem comentar que o governo pretende questionar no Supremo o fato de Cunha ter conduzido o processo de impeachment na Câmara, Dilma relatou que "o pecado original desse processo não pode escondido".
– Não foi só chantagem explícita, é um golpe explícito, desvio de poder –afirmou.
Na quinta-feira, o advogado-geral da União, José Eduardo Cardozo, disse que pedirá ao STF a anulação do processo com base no "desvio de finalidade" do presidente da Câmara. No Planalto, entretanto, interlocutores de Dilma dizem que Cardozo "está apenas cumprindo o seu papel" e que é difícil reverter o processo.
A presidente, que participou nesta sexta-feira de cerimônia relativa ao Programa Minha Casa Minha Vida, comentou ainda que sabe que é "muito incômoda" para alguns e reafirmou que não irá renunciar.
– Eu tenho a disposição de resistir. Resistirei até o último dia – pontuou.
– Vivemos um impeachment golpista: é ridícula essa questão de pedaladas fiscais – completou.
Pouco antes de começar a cerimônia, o ministro do desenvolvimento agrário, Miguel Rossetto, chamou o vice-presidente Michel de "impostor" e ameaçou avisando que seu "governo ilegítimo não terá um minuto de sossego".
– Ele (Temer) é um golpista e seu governo não terá legalidade – comentou o ministro.
– Será uma crise prolongada e não haverá estabilidade política no país com um presidente impostor – acrescentou.
Retrocesso
Ao defender o programa Minha Casa Minha Vida, Dilma afirmou ter "consciência" de que o "golpe" não é exclusivamente contra o seu mandato.
– Fui eleita com 54 milhões de votos e com um programa – destacou.
– O que está acontecendo é uma eleição indireta, que é travestida de impeachment. Vão querer, na maior cara de pau, referendar um programa que não foi eleito nas urnas – completou.
Sem citar diretamente Temer, Dilma disse que vão querer reduzir o Bolsa Família "a pó". Segundo ela, a proposta sugerida pelo PMDB de limitar o benefício a 5% da população deixará "mais de 36 milhões de pessoas à margem".
– O bolsa família hoje contempla 47 milhões de pessoas. A proposta reduziria para 10 milhões – ressaltou.
Mesmo com o impeachment em estágio avançado, Dilma seguiu falando de metas e prometeu a contratação de mais 2 milhões de casas no âmbito do programa Minha Casa Minha Vida. Segundo ela, ao final de 2018, o governo terá construído mais de 5 milhões de unidades habitacionais.
– A cada oito brasileiros, um terá uma casa do Minha Casa Minha Vida –salientou.
Na cerimônia desta sexta-feira, o governo anunciou a contratação de 25 mil unidades habitacionais no âmbito do programa.
Apoio social
Como aconteceu nos últimos eventos no Palácio do Planalto, a cerimônia teve uma plateia – desta vez, bastante reduzida – formada por claque de apoiadores de Dilma, como os movimentos sociais. Das cerca de 400 cadeiras separadas para o evento, mais de cem estavam vazias.
O coordenador nacional do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), Guilherme Boulos, que discursou no evento, fez duras críticas ao processo de impeachment e disse que "é importante que se reafirme que há um golpe, conduzido pelo maior bandido da história, que é o senhor Eduardo Cunha".
Boulos questionou o fato de o Superior Tribunal Federal (STF) julgar pelo afastamento de Cunha.
– Por que demoraram quatro meses para afastar Cunha? Dizem que tentaram higienizar o golpe, mas nem com muito desinfetante vão higienizar o golpe neste país – avaliou
Boulos mencionou ainda que há um risco "real e iminente" de retrocessos no Brasil e garantiu que os movimentos sociais vão tomar as ruas após o afastamento de Dilma.
– Não daremos nenhum passo atrás, presidente, e barraremos nas ruas esse golpe e qualquer retrocesso – disse o coordenador do MTST para Dilma.
– Para aqueles que querem ameaçar a democracia: não mexam com as conquistas históricas do povo brasileiro. A luta está na rua – sublinhou.