
O plenário da Câmara dos Deputados votou, durante a noite de terça e madrugada desta quarta-feira, o pacote anticorrupção, aprovando uma série de modificações. Se o conjunto de medidas já era polêmico antes, as alterações feitas pelo parlamentares tornaram as medidas ainda mais controversas, suscitando críticas de integrantes da Operação Lava-Jato e questionamentos sobre a real necessidade de votá-las em um dia e horário (a sessão acabou às 4h19min) quando a atenção do país estava voltada à tragédia envolvendo o time da Chapecoense.
O fato é que o projeto que chegou em março ao Congresso, pelas mãos do Ministério Público Federal com o apoio de mais de 2 milhões de eleitores, de longe não é mais o mesmo. As "10 propostas para combater a corrupção" sugeridas pelo MPF se desintegraram em diversas medidas já durante passagem por comissão especial e, depois, a maior parte não passou pelo crivo dos deputados.
Leia mais:
Veja como votaram os gaúchos sobre a punição a magistrados e integrantes do Ministério Público
Lava-Jato chama de "Lei do Terror" medida aprovada pela Câmara
Mudança em pacote anticorrupção é "atentado à Democracia", avalia Ajufe
ZH detalha que pacote é esse aprovado pela Câmara e que agora segue para análise do Senado para depois passar pela sanção do presidente Michel Temer, que tem autonomia para vetar pontos do que for aprovado pelo Congresso.
O QUE FOI INCLUÍDO
– Crime de responsabilidade a magistrados e promotores
A primeira atitude dos deputados na madrugada foi incluir emenda com a possibilidade de punição de magistrados e promotores por crime de abuso de autoridade. Pela proposta, magistrados podem ser enquadrados por abuso de autoridade em pelo menos oito situações, entre elas, se "expressar, por qualquer meio de comunicação, opinião sobre processo pendente de julgamento". No caso do Ministério Público, seus integrantes podem responder pelo crime se, entre outros motivos, promoverem a "instauração de procedimento sem que existam indícios mínimos de prática de algum delito". Além da "sanção penal", o procurador ou promotor poderia estar "sujeito a indenizar o denunciado pelos danos materiais, morais ou à imagem que houver provocado". A pena prevista no texto aprovado é de seis meses a dois anos de prisão e multa.
– Violação de prerrogativas de advogados é crime
Os deputados também incluíram a possibilidade de punir policiais, magistrados e integrantes do MP de todas as instâncias que violarem o direito ou prerrogativas de advogados. A pena pode ser dobrada se "da violação resultar condução coercitiva ou prisão do advogado".
O QUE FOI RETIRADO
– Enriquecimento ilícito de funcionários públicos
A tipificação do crime de enriquecimento ilícito e das regras que facilitavam o confisco de bens provenientes de corrupção a favor da União foi suprimida do pacote.
– Prescrição de penas
Também foram derrubadas mudanças como a contagem da pena a partir do oferecimento da denúncia e não do seu recebimento que serviriam para dificultar a ocorrência da prescrição de penas, isto é, quando o processo não pode seguir adiante porque a Justiça não conseguiu conclui-lo em tempo hábil.
– Ação de extinção de domínio
O plenário da Câmara suprimiu do pacote o item que tinha como finalidade decretar da cessação dos direitos de propriedade e de posse quando os bens fossem provenientes de atividade ilícita. Os deputados classificaram a medida que veio da comissão especial de "expropriação de bem" antes de qualquer condenação.
– Delator do bem
Um dos itens mais importantes para o relator que ficaram de fora previa a criação da figura do "reportante do bem" (ou popularmente "delator do bem") para incentivar o cidadão a denunciar crimes de corrupção em qualquer órgão, público ou não. Como estímulo, o texto previa o pagamento de recompensa em dinheiro para quem fizesse isso - até 20% dos valores que fossem recuperados. A medida foi classificada por deputados como "regulamentação da profissão de dedo-duro" e foi removida do projeto.
– Endurecimento da Lei de Improbidade
O plenário retirou do projeto o texto no qual é suprimida a defesa prévia nas ações de atos de improbidade. Portanto, permanece a regra atual prevista na legislação.
– Responsabilização de partidos políticos
Pelo projeto apresentado, o partido que reincidisse na prática grave poderia perder o registro por determinação judicial. A Câmara derrubou ainda a responsabilização dos partidos políticos e dirigentes partidário por atos cometidos por políticos filiados às siglas.
– Acordos de leniência
Os deputados também retiraram do pacote a previsão de dar mais poder ao Ministério Público em acordos de leniência (espécie de delação premiada em que empresas reconhecem crimes em troca de redução de punição) com pessoas físicas e jurídicas em atos de corrupção.
– Acordo de culpa
A medida foi incluída no parecer do relator Onyx Lorenzoni (DEM-RS) durante a votação na comissão especial, mas foi rejeitada no plenário por entender que, no "acordo de culpa", o réu abre mão da exigência de produção de provas para sua defesa.
– Confisco alargado
Com o objetivo de recuperar ganhos obtidos com atividades ilegais, o texto previa o chamado "confisco alargado", em casos como o de crime organizado e corrupção, para que o criminoso não continuasse a delinquir e também para que não usufruísse daquilo que é proveniente de atividade ilícita.
– Teste de integridade
A possibilidade de os órgãos públicos realizarem o teste de integridade com servidores públicos foi removida do pacote.
O QUE PERMANECEU
– Criminalização do caixa 2
Os candidatos que receberem ou usarem doações que não tiverem sido declaradas à Justiça eleitoral irão responder pelo crime de caixa 2, com pena de dois a cinco anos de prisão. O texto prevê multas para os partidos políticos. Se os recursos forem provenientes de fontes vedadas pela legislação eleitoral ou partidária, a pena é aumentada de um terço. Se os recursos forem provenientes de fontes vedadas pela legislação eleitoral ou partidária, a pena é aumentada de um terço.
– Crimes hediondos
Vários crimes serão enquadrados como hediondos se a vantagem do criminoso ou o prejuízo para a administração pública for igual ou superior a 10 mil salários mínimos vigentes à época do fato – atualmente, deveria ser superior a R$ 8,8 milhões. Incluem-se nesse caso o peculato, a inserção de dados falsos em sistemas de informações, a concussão, a corrupção passiva e ativa, entre outros.
– Prevenção à corrupção e transparência
Os tribunais terão de divulgar informações sobre o tempo de tramitação de processos com o propósito de agilizar os procedimentos.
– Ações populares
Medida amplia o conceito de ação popular para permitir a isenção de custas judiciais e de ônus de sucumbência (honorários advocatícios por perder a causa) e aumentar o leque de assuntos sobre os quais pode versar. O texto especifica que, se a ação for julgada procedente, o autor da ação terá direito a retribuição de 10% a 20% a ser paga pelo réu.
– Limite de recursos
Estabelece regras para limitar o uso de recursos com o fim de atrasar processos.
– Venda de voto
O eleitor que negociar seu voto ou propor a negociação com candidato ou seu representante em troca de dinheiro ou qualquer outra vantagem será sujeito a pena de reclusão de um a quatro anos e multa.
– Partidos políticos
A Câmara manteve na legislação dispositivo que prevê a responsabilização pessoal civil e criminal dos dirigentes partidários somente se houver irregularidade grave e insanável com enriquecimento ilícito decorrente da desaprovação das contas partidárias.