Política

Terremoto no poder

Kelly Matos: bem-aventurados os homens de bom coração como Temer, Rocha Loures e Joesley

Em março, o presidente recebeu o dono da JBS para uma conversa pouco republicana que, meses depois, provocaria uma hecatombe em Brasília

Kelly Matos

Enviar email
Presidente Michel Temer, deputado federal afastado Rodrigo Rocha Loures (PDMB-PR) e o empresário Joesley Batista

Narra o evangelho de Mateus que, certa feita, Jesus Cristo decidiu subir um monte para compartilhar ensinamentos com seus apóstolos. Ao chegar no topo, sentou-se e ficou em silêncio. Em seguida, disparou série de lições que, mais tarde, ficariam eternizadas num compilado chamado pelos cristãos de Sermão da Montanha. No apanhado, uma das lições diz que alcançarão o Reino dos Céus aqueles que dispuserem de pureza no coração. Pois é sobre esses homens que vamos falar.

Em março deste ano, o empresário Joesley Batista procurou o senhor presidente da República Michel Temer, na calada da noite, para uma conversa pouco republicana e que, meses mais tarde, provocaria uma hecatombe na capital federal. Temer, um homem de coração puro, aceitou recebê-lo de pronto. Nessa conversa, Joesley reclamou ao chefe da República, entre outros temas, sobre a falta de um interlocutor para tratar sobre assuntos do interessa da JBS dentro do governo.

Leia mais
Rocha Loures entrega mala com R$ 500 mil na sede da PF, em São Paulo
Base mantém apoio enquanto aguarda resultado oficial da perícia
Perito contratado por Temer diz que gravação é "imprestável como prova"

A demanda era nova, já que o responsável pela interlocução havia sido defenestrado do Palácio do Planalto em um desses escândalos que nos acostumamos a esquecer meses depois. Na época, o então ministro da Cultura Marcelo Calero acusou Geddel Vieira Lima de pressioná-lo a resolver uma pendência pessoal sobre um apartamento em Salvador. A crise custou o emprego de ambos. Em tempo: o presidente também foi gravado nesse episódio.

Voltemos aos homens de coração puro.

Com a saída de Geddel, explicou Joesley ao presidente, faltava alguém para anotar – e, em especial, resolver – os pedidos. Joesley, um homem de bom coração, não tinha intenção alguma de perturbar Temer com frequência. O presidente, então, achou que Joesley estava certo. E indicou o nome do deputado Rocha Loures como o novo interlocutor da JBS nos corredores de Brasília.

– É da minha mais estrita confiança – assegurou ao empresário investigado na data em três operações da PF.

Com o aval de Temer, Rocha Loures ficou responsável por atender as pendências de Joesley e sua JBS no governo. Tarefa que desempenhava com alguma experiência, já que havia sido designado pelo mesmo Temer para atuar na Assessoria Parlamentar da Vice-Presidência da República e, mais tarde, na Secretaria de Relações Institucionais. Os dois se aproximaram ainda mais, nos contou o repórter Fábio Schaffner em ZH, a ponto de Temer e seu coração puro terem doado R$ 200 mil para sua campanha em 2014.

Pulemos para maio de 2017. Já não eram R$ 200 mil, mas sim R$ 500 mil. Nosso terceiro homem de bom coração foi filmado pela Polícia Federal recebendo uma mala com meio milhão de reais. Filmado. Há imagens que mostram o recebimento. O problema é que um coração puro jamais desconfiaria do material que lhe foi entregue. Disse o senhor deputado (agora afastado) a aliados, na segunda-feira (22), que jamais desconfiou sobre o conteúdo da mala recebida. Pasmem. Segundo a versão de Loures, ele só soube de dinheiro quando abriu a mala.

Vejamos. Um homem encontra-se com outro. Recebe uma mala. Vai embora. Passa a carregá-la para lá e para cá. Mas em nenhum momento ousa especular o que está dentro. Coisas de uma pureza singular. A versão, esperam aliados, deve ser repetida em depoimento a ser agendado pelos investigadores.

Certamente conhecerá o Reino dos Céus. Amém.

Leia mais notícias sobre a delação da JBS

GZH faz parte do The Trust Project
Saiba Mais
RBS BRAND STUDIO

Futebol da Gaúcha

15:45 - 18:30