A decisão da Justiça Europeia nesta semana que ordenou o Google a suprimir dos resultados dados pessoais de um cidadão espanhol é o primeiro passo rumo à privacidade digital. Mas e se nos 28 países do bloco a garantia ao esquecimento na web deu os primeiros sinais, como é a situação no Brasil? É possível eliminar do sistema de buscas do Google informações pessoais, imagens ou vídeos? Depende. Em alguns casos, sim, mas eles são bem poucos.
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A política de privacidade nos países os quais a empresa atua, incluindo o Brasil, adota postura neutra, classificando-se apenas como buscador e organizador de conteúdo sem gerência sobre os dados mostrados. Ou seja, o Google não interfere no conteúdo desses sites, mas pode retirar alguns endereços do seu sistema de buscas, mediante comunicado feito diretamente por e-mail.
Os únicos casos são quando a página exibe imagens pessoais com informações sigilosas ou cenas ofensivas. Os tipos de informações que podem ser excluídas incluem números de identificação nacional (CPF ou CNPJ), números de contas bancárias, números de cartões de crédito ou imagens de assinaturas.
Data de nascimento, endereço e número de telefone não estão listados, embora a organização garanta que a política é aplicada caso a caso de acordo com o grau de privacidade do dado divulgado.
O site também impede a exibição nos resultados da pesquisa caso o conteúdo apresente os seguintes temas: pornografia, funções orgânicas ou fluidos corporais, palavras vulgares, conteúdo gráfico incluindo ferimentos e doenças, representações de morte e partes do corpo humano e crueldade ou violência contra animais.
De acordo com o FAQ nacional da empresa sobre o tema, o cidadão que tiver qualquer outro conteúdo indesejado veiculado é orientado a entrar em contato direto com o meio de comunicação, página ou site em que o material esteja publicado para que seja excluído e, então, removido ou atualizado nas busca do Google.
"Os resultados de pesquisa do Google são um reflexo do conteúdo disponível para o público na web. Os mecanismos de pesquisa não podem remover conteúdo diretamente de websites. Ou seja, a remoção de resultados da pesquisa do Google não remove o conteúdo da web", informa o site.
Direito digital no Brasil
Para Leandro Bissoli, especialista em Direito Digital e sócio do escritório Patricia Peck Pinheiro Advogados, ainda que restrita à Europa, a decisão tomada nesta semana pela Corte de Justiça daquela região traz implicações em todo o mundo.
- Ela traz a possibilidade do usuário pleitear o direito e impedir a divulgação de informações que, apesar de verídicas, não sejam atuais e lhe geram prejuízos. Ou seja, teremos um número maior de demandas de usuários que buscarão a tutela do Estado para garantir o seu direito - diz.
Segundo o profissional, trazer a responsabilidade apenas ao Google por um conteúdo produzido e hospedado por terceiro não resolverá o problema, já que o mesmo permanecerá publicado e poderá ser localizado por outros buscadores ou acessado diretamente pelo endereço. Neste caso, a briga é na Justiça.
- Qualquer cidadão pode ter êxito judicial na remoção do conteúdo. O desafio está no monitoramento contínuo visando a identificação de novos conteúdos indevidos - acrescenta Bissoli.
Comportamento brasileiro
De acordo com o Bissoli, o brasileiro tem se preocupado cada vez mais com a reputação também no meio digital.
- Aumentou a demanda relacionada à remoção de conteúdo publicado na internet. Este é o resultado de uma sociedade cada vez mais conectada, da inclusão digital, da virtualização das informações e do desconhecimento dos usuários sobre os riscos decorrentes desta superexposição - diz.
Para o advogado, a luta pela privacidade deve ser abreviada a partir de 23 de junho, quando entra em vigor o Marco Civil da Internet, conjunto de leis que estabelece com mais rigidez os direitos e devedores dos usuários na ferramenta.
- O cidadão poderá notificar a empresa responsável pelo site e solicitar a sua imediata remoção. Fora este tipo de conteúdo, o cidadão deverá ingressar com um pedido judicial para rápida remoção. Este passará a ser o meio mais rápido para evitar a rápida disseminação de um conteúdo publicado.
CASOS FAMOSOS
Atualmente, no Brasil, as decisões da Justiça reforçam a tese de que o buscador não tem como controlar as páginas mostradas nas buscas. Exemplo disso foi o polêmico filme para adultos Amor Estranho Amor, com a participação de Xuxa, datado de 1982.
Recentemente, o Superior Tribunal de Justiça usou a argumentação para isentar o Google de responsabilidade sobre imagens de Xuxa nua postadas na internet, afirmando que o provedor não hospeda, e sim limita-se a indicar links onde o conteúdo está. Dessa forma, a apresentadora deveria entrar em contato com todos os links para que o conteúdo fosse removido.
TV Globo/Reprodução
A atriz Carolina Dieckmann também passou por uma situação parecida em 2012, embora nesse caso com um agravante, já que as imagens foram roubadas de um computador pessoal. A polêmica e o processo judicial cresceram, e a Lei Carolina Dieckmann, que alterou o Código Penal para tipificar como infrações uma série de condutas no ambiente digital, entrou em vigor em 2013. Fotos da atriz, contudo, ainda podem ser encontradas na web. O Google divulgou que não interfere em seus resultados de busca e que novamente é necessário entrar em contato diretamente com os sites que hospedam o conteúdo.
Philippe Lima e Roberto Filho/AgNews
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Outra caso polêmica envolveu a atriz Daniela Cicarelli, flagrada em 2006 fazendo sexo com o namorada em uma praia da Espanha. O vídeo virou um dos assuntos mais comentos na web e o casal chegou a ganhar ação na Justiça ordenando que todos os sites que veicularam o vídeo tirassem as imagens do ar.
Ricardo Wolffenbüttel/Agência RBS
No ano seguinte, uma decisão judicial exigiu que as empresas de telefone bloqueassem o acesso ao YouTube no Brasil, por descumprir a exigência. Dois dias depois, a repercussão fez o juiz mudar a decisão e a liberar o acesso ao site.
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