
Se você acha que uma campanha publicitária na TV com Compadre Washington, Supla, Narcisa e Maradona jamais servirá para alavancar um negócio de internet, você não sabe de nada, inocente.
Fosse vendável essa largada previsível de texto, que bom negócio não seria? Decerto é possível: vice-presidente do BomNegócio.com, Ana Júlia Ghirello garantiu, em entrevista a ZH, já ter usado o site para comprar um pé de pato (um só, não o par).
Foi nessa onda, permitindo que (praticamente?) tudo se torne mercadoria, que o site de classificados registrou, em março, crescimento anual de 150% em visualizações de páginas, com atuais 4 milhões de anúncios ativos e R$ 270 milhões diários em transações. Para se divulgar, o Bom Negócio pescou inspiração no imaginário popular e, como que por retribuição, acabou pautando a fala e o clique do povo.
Amazon começa a vender livros físicos no Brasil
Leia todas as notícias em ZH sobre tecnologia
Ana Júlia veio a Porto Alegre na quarta-feira para contar esses êxitos no Conexão KingHost, que promoveu discussões sobre os desafios de manter o crescimento de empresas digitais de forma sustentável. Também estiveram no evento empreendedores como o fundador do Easy Taxi, Tallis Gomes, e o country manager do Viber no Brasil, Luiz Felipe Barros. A última rodada de palestras acontece em Recife, no dia 9 de outubro.
Confira a entrevista de ZH com Ana Júlia Ghirello:
O que pode explicar o crescimento do BomNegócio.com em um mercado que já tem grandes players, como o Mercado Livre e o eBay?
O Brasil nunca teve um player de classificados forte. Você tinha alguns players regionais. Um em São Paulo, como o Primeira Mão, e ainda era cultura de jornal, lá atrás. Você não tinha nenhum player de classificados online, que é um modelo diferente do marketplace. O objetivo principal não é mediar a compra, e sim você unir o comprador e o vendedor. Unir pessoas que estejam próximas. Por isso que, no Bom Negócio, tu já começas clicando em um mapa. A gente entrou em um momento que não tinha isso. Surgiram concorrentes logo depois, natural. Era uma oportunidade não só do negócio em si, mas acima de tudo de você poder construir isso no Brasil, o que é demais. Antes de construir o Bom Negócio, eu estava em Nova York, e os classificados de lá fizeram uma diferença incrível na minha vida quando eu tinha 19 anos: meu primeiro emprego, meu primeiro apartamento Foi tipo um amigo que me ajudou em algumas fases da minha vida. Então você ter a oportunidade de voltar para o seu país e construir isso é demais, é um produto que pode ajudar muita gente, que pode estar presente para muita gente. Podia até parecer que o espaço estava preenchido, mas realmente havia essa oportunidade, e está aí agora, comprovando que, nesses três anos, está todo mundo mais habituado ao conceito de classificados. Todo mundo hoje olha para uma bicicleta encostada e pode pensar que 1) eu posso ganhar uma graninha com ela, 2) tem quem queira, posso vender baratinho para alguém ser feliz ou 3) não aguento mais esse negócio aqui encostado, quero me livrar disso.
Qual foi a importância de passar esse período fora e olhar o que estava rolando em uma cidade como Nova York?
Tem muita gente empreendendo, muitas ideias novas, e lá as coisas são muito ágeis, então é fácil fazer tudo, desde abrir empresa até testar ideias no mercado. Todo mundo é superligeirinho. Isso com certeza me deu uma exposição maior a coisas que hoje eu uso no Brasil e para onde o mercado vem caminhando. Você tem insights lá que pode experimentar aqui. Não quer dizer que vai ser igual, às vezes não é. Mas acho que com certeza ajuda.
Para além da economia, o Bom Negócio também é um fenômeno como ferramenta de comunicação. Que mudanças ele traz para a forma de anunciar produtos?
Engraçado que, logo que lançamos o Bom Negócio, o pessoal estava mais acostumado com classificados em papel, então as descrições eram bem curtinhas, igual à que você dita no telefone para os classificados em papel. E mudou hoje. O pessoal já sabe que quanto mais fotos colocar e quanto mais completa for a descrição, melhor. Eles usam o próprio Bom Negócio para pesquisar preço e ver se o item que eles vão anunciar é competitivo, tanto para comprar quanto para vender. Então, sim, está mudando.
E por que investir tanto em publicidade na TV para um negócio de internet?
Tudo tem uma convergência, né? Lançamos o site em julho de 2011 e a primeira campanha de TV lá pelo final do ano. A gente já vem fazendo esse mix. Muitas pessoas tomaram contato com a gente pelo comercial de TV, que é uma mídia que ainda funciona muito no Brasil. Você vê o impacto dessa campanha diretamente nas métricas do site. E o que não se vê é um trabalho muito forte, muito minucioso, da equipe de marketing online. Então é uma combinação dos dois. Isso vem acontecendo desde o começo. Realmente, essa última campanha foi um boom muito maior do que imaginávamos. A gente está muito feliz. Ela teve um impacto bem agressivo, e a gente sabe que é devido à TV, mas que é acompanhado, e todo o suporte é dado, pelas campanhas online. Não parece tanto, mas os dois estão trabalhando bem juntinhos.
"A cada um minuto quatro coisas vendem"? Pela própria força do slogan, talvez ele já precise ser mudado, não?
Já! Já são mais que oito. A cada um minuto, mais que oito itens vendem, em média. Foi muito legal ver o carinho também. As pessoas têm carinho pela campanha, pela marca. Isso é uma construção que você não faz do dia para a noite. A gente vem trabalhando em estar bem próximo dos usuários, desde o produto, da comunicação até as campanhas de atendimento.
Até que ponto vocês colocam esse sucesso na conta da agência de publicidade?
Os caras mandaram muito bem. Temos uma relação muito boa com a agência. Sempre trabalhamos muito próximo deles. Eles vieram com esse conceito que é muito legal, muito inovador. E respondeu muito bem nos testes que fizemos. Não fazemos nada no escuro. Tudo a gente mede, a gente valida, pegamos dados quantitativos e qualitativos. E a campanha foi um desses exemplos. A gente sabia que tinha uma aceitação boa do público. Achamos que seria inovador, que daria certo, mas você nunca pode ter certeza. Foi muito mais do que a gente estava esperando. O Compadre Washington viralizou com o "sabe de nada, inocente!". Agora o (Alexandre) Frota também, o Tiririca A gente é bem feliz na escolha desses personagens. Eles são bem caricatos, engraçados
E todos aceitaram ser apresentados como inconvenientes. Vocês tiveram voz nessa escolha dos artistas?
A gente trabalha junto com a agência, é bem conjunto. Todo mundo conversa. E o conceito pode ser trazido muito para o nosso dia a dia. É um negócio que está ali incomodando na sua casa e que você pode transformar em um bom negócio rapidinho. A gente sempre usou humor nas nossas campanhas, tem muito a ver com a gente como empresa também, e os personagens têm tudo a ver: o brasileiro gosta de ver caras conhecidas. Mostra algo simples que acontece na vida de todo mundo. Tem algo me incomodando, quero me livrar rapidamente e ainda ganhar um dinheirinho.
Vocês chegaram a avaliar o risco de passar a mensagem não apenas de que alguém está se livrando de algo ruim, mas de que o comprador está adquirindo esse fardo?
Ah, mas o que é chato para você é legal para mim. Esse é todo o lance. Realmente, você olha para as suas coisas e diz "ninguém vai querer isto daqui". Mas não. É impressionante. Eu tenho histórias pessoais. Já comprei um pé de pato. Surfo de Morey. Perdi um pé de pato surfando. Achei um outro, não da mesma cor, mas do mesmo tamanho, tudo o que eu precisava.
Comprou no próprio Bom Negócio?
Sim. Então você vê: para o cara, era um pé de pato que ele não iria usar. Para mim, era uma solução, porque eu precisava do outro.
Há casos de gente que virou empreendedor por causa do site?
Sim, vários. Fizemos alguns episódios no YouTube sobre alguns casos, mostrando como o Bom Negócio faz parte da vida das pessoas. Tem um cara que perdeu o emprego e começou a usar o site para vender coisas e virou empreendedor. Uma moça cuja filha entrou na faculdade, ela mudou de casa, depois arranjou emprego e mudou de novo É esse papel de melhor amigo. Estava ali, naquele momento difícil em que a filha foi para a faculdade. Quanto mais a gente se adapta aos nossos usuários, melhor. É isso o que a gente quer.
E vocês acompanham esse processo de compra e venda?
Com certeza. Temos uma equipe de atendimento que fica superpróximo dos usuários em caso de dúvida. A transação é feita diretamente entre comprador e vendedor. Nosso papel é fazer a conexão, dando dicas de segurança sobre como efetuar transação segura, mas a decisão é deles. Eles têm autonomia, e a gente dá o suporte necessário para isso.
Quais são os maiores concorrentes hoje? Vocês pretendem expandir para outras áreas?
A gente sempre está de olho aberto. Você tem concorrentes hoje no próprio segmento de classificados, tem outros que são só de nichos, para certas categorias, tem os marketplaces Está todo mundo crescendo. É um mercado muito novinho, tem espaço para todo mundo crescer. Estar de olho aberto, estamos sempre. O foco é no usuário, mas lógico que você vai olhar a concorrência, novos players, novos mercados. Não temos planos concretos ainda, somos muito adeptos de experimentar e ficar de olho aberto.
O slogan sugere também que a venda é rápida. Funciona assim mesmo?
A gente tem inúmeras categorias. Se você vai em imóveis, obviamente que a venda demora mais para acontecer, o cara vai pesquisar. Celular já é muito rápido. É só colocar um celular um pouco mais barato (do que o preço de mercado). Às vezes o pessoal coloca iPhone com 40%, 50% de desconto. É usado, mas está como novo. É uma riqueza de conteúdo muito legal. Sou particularmente fã da categoria de antiguidades. Estou sempre bisbilhotando ali. Comprei um jogo de taças de cristal francesas da década de 1970, cristal original, superbarato, de uma senhorinha do Rio que tinha ganhado de casamento em dobro. Então ela nunca tinha aberto, desde o casamento. Aí comprei, está lá na minha casa, sou apaixonada. O que para ela era algo sem uso, para mim foi algo sensacional. Estava procurando há um tempão.
Quando vocês começaram, tinham alguma ideia de que iriam terminar na boca do povo?
Tanto quanto foi, não. Sempre tivemos ambições bem agressivas, valorizamos muito isso na empresa. Mas não sabíamos que iria ficar tão popular assim, crescer tão rapidamente, tanto a nossa equipe quanto o volume de usuários e a adesão. A gente é empolgadaço, a gente ama o que faz, e é muito bonito.