A justificativa do Ministério Público Federal (MPF) para pedir buscas no Instituto Lula, na casa do ex-presidente, em São Bernardo do Campo (SP), no triplex do Guarujá (SP) e no sítio de Atibaia revela que os investigadores da Lava-Jato consideram Lula "um dos principais beneficiários dos delitos" do esquema de corrupção na Petrobras.
– De fato, surgiram evidências de que os crimes o enriqueceram e financiaram campanhas eleitorais e o caixa de sua agremiação política – pondera o pedido de busca feito pelo MPF.
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Chamou a atenção do MPF e da Polícia Federal o elevado volume de recursos que a entidade teria recebido de empresas investigadas pela Operação Lava-Jato.
Para o Instituto Lula R$ 20,7 milhões teriam sido repassados por Odebrecht, Camargo Correa, OAS, Andrade Gutierrez, UTC e Queiróz Galvão, entre 2011 e 2014 – dois terços da movimentação de R$ 35 milhões.
Já a empresa criada por Lula para dar palestras, a LILS Palestras, movimentou R$ 21 milhões e, desses, R$ 10 milhões têm origem em empreiteiras investigadas na Lava-Jato.
Ao todo, seriam cerca de R$ 30 milhões os recursos repassados ao Instituto Lula e a LILS Palestras por empreiteiras investigadas.
Veja os fatos apontados pelo MPF em trechos do documento
R$ 1 milhão para reformas no triplex
"O avanço das investigações revelou evidências de que o ex-presidente recebeu, em 2014, pelo menos R$ 1 milhão sem aparente justificativa econômica lícita da OAS, por meio de reformas e móveis de luxo implantados no apartamento tipo triplex, número 164-A, do Condomínio Solaris, em Guarujá. Embora o ex-presidente tenha alegado que o apartamento não é seu, por estar em nome da empreiteira, há provas apontando para o contrário, como depoimentos de zelador, porteira, síndico, dois engenheiros da OAS, bem como dirigentes e empregado da empresa contratada para a reforma, os quais apontam o envolvimento de seu núcleo familiar em visitas e tratativas sobre a reforma do apartamento."
Móveis para a cozinha e dormitórios bancados pela OAS
"Há evidências de que a OAS pagou despesas elevadas para reformar o imóvel (mais de R$ 750 mil), arcou com móveis de luxo para cozinha e dormitórios (cerca de R$ 320 mil), bem como de que tudo isso aconteceu de modo não usual (foi o único apartamento que sofreu tal intervenção) e com o envolvimento do próprio presidente da OAS, Léo Pinheiro. A suspeita é de que a reforma e os móveis constituem propinas decorrentes do favorecimento ilícito da OAS no esquema da Petrobras, empresa essa cujos executivos já foram condenados por corrupção e lavagem na Lava-Jato. Além disso, há fortes evidências de que outros líderes e integrantes do Partido dos Trabalhadores (PT) foram agraciados com propinas decorrentes de contratos da Petrobras, inclusive por meio de reformas e após deixarem o cargo público, como no caso de José Dirceu, o que já ensejou acusação criminal formal contra este."
Sítios em Atibaia custaram R$ 1,5 milhão
"As apurações apontam também para o fato de que o ex-Presidente Lula, em 2010, adquiriu dois sítios em Atibaia mediante interpostas pessoas, pelo valor de R$ 1.539.200,00, havendo ainda fortes indícios de que, entre 2010 e 2014, recebeu pelo menos R$ 770 mil sem justificativa econômica lícita de José Carlos Bumlai e das empresas Odebrecht e OAS, todos beneficiados pela corrupção no esquema Petrobras. De fato, dois sítios contíguos, um colocado em nome de Jonas Suassuna e outro em nome de Fernando Bittar, foram adquiridos na mesma data, em 29/10/2010. Tanto Jonas como Fernando são sócios de Fábio Luís Lula da Silva como foram representados na compra por Roberto Teixeira, notoriamente vinculado ao ex-presidente Lula e responsável por minutar as escrituras e recolher as assinaturas. Encontrou-se, ainda, mensagem eletrônica que aponta o uso dos adquirentes nominais como interpostas pessoas. Ademais, o ex-Presidente determinou que parte de sua própria mudança, quando do fim do exercício da presidência, fosse entregue na sede dos sítios, para onde foi, com expressiva frequência, ao longo dos últimos anos."
Reformas no sítio pagas por Bumlai, Odebrecht e OAS
"Para além da suspeita sobre a ocultação de propriedade em nome de terceiros, há fortes indícios, consistentes na palavra de diversas testemunhas e notas fiscais de compras de produtos, de que reformas e móveis no valor de pelo menos R$ 770 mil foram pagos, sem razão econômica lícita, por Bumlai e pelas empreiteiras Odebrecht e OAS, todos favorecidos no esquema Petrobras. Bumlai e a Odebrecht se encarregaram da reforma. A OAS adquiriu móveis no valor de aproximadamente R$ 170 mil para a cozinha, comprada no mesmo estabelecimento em que aquela empresa adquiriu móveis para o triplex 164-A, o que também indica que o imóvel pertencia ao ex-presidente. Foram encontradas mensagens, ainda, no celular de Léo Pinhero, indicando que os beneficiários da cozinha eram o ex-presidente e sua esposa, ex-primeira-dama. A suspeita, aqui novamente, é que os valores com que o ex-presidente foi agraciado constituem propinas pagas a título de contraprestação pelos favores ilícitos obtidos no esquema Petrobras."
Indícios de pagamentos de cerca de R$ 1,3 milhão da OAS a Lula
"Surgiram, ainda, fortes indícios de pagamentos dissimulados de aproximadamente R$ 1,3 milhão pela empresa OAS em favor do ex-presidente, de 01/01/2011 a 01/2016, para a armazenagem de itens retirados do Palácio do Planalto quando do fim do mandato. Apesar de a negociação do armazenamento ter sido feita por Paulo Okamotto, que foi um dos fundadores do Partido dos Trabalhadores, presidente do Instituto Lula desde o fim de 2011 e sócio do ex-Presidente na LILS Palestras desde sua constituição em março de 2011, o contrato foi feito entre a OAS e a empresa armazenadora. Nesse contrato, seu real objeto foi escondido, falsificando-se o documento para dele constar que se tratava de 'armazenagem de materiais de escritório e mobiliário corporativo de propriedade da construtora OAS Ltda'. Paulo Okamotto assinou ainda, em 12 de janeiro de 2016, procuração autorizando a retirada dos bens.
Pagamentos ao Instituto Lula
"Por fim, investigam-se pagamentos vultosos feitos por construtoras beneficiadas no esquema Petrobras em favor do Instituto Lula e da ILS Palestras, em razão de suspeitas levantadas pelos ingressos e saídas dos valores. De fato, a maior parte do dinheiro que ingressou em ambas as empresas, ao longo de 2011 a 2014, proveio de empresas do esquema Petrobras: Camargo Correa, OAS, Odebrecht, Andrade Gutierrez, Queiroz Galvão e UTC. No Instituto Lula, foram 20,7 dentre 35 milhões que ingressaram. Na LILS, foram 10 dentre 21 milhões. Quanto às saídas de recursos, além de beneficiarem pessoas vinculadas ao Partido dos Trabalhadores – cumprindo recordar que o esquema da Petrobras era partidário -, elas beneficiaram parentespróximos do ex-Presidente, por meio de pagamentos a empresas de que são sócios. Além de tudo isso, a própria presidência do Instituto foi ocupada, em dado momento, por ex-tesoureiro de sua campanha que é apontado por colaboradores como recebedor de propinas que somaram aproximadamente R$ 3 milhões, decorrentes de contratos com a Petrobras, o que, mais uma vez, mostra o vínculo de pessoas muito próximas ao ex-Presidente com os crimes e indica possível ligação das próprias empresas ao esquema ilícito e partidário que vitimou a Petrobras."
Confira o último trecho documento
"Todos esses fatos estão sendo investigados no âmbito da Lava-Jato porque eles se relacionam com o destino de verbas desviadas da Petrobras por empresas e pessoas participantes do esquema criminoso. Os fatos são de competência federal não só por se relacionarem com crimes financeiros e de lavagem de dinheiro transnacional, mas também por haver fatos praticados quando o ex-Presidente estava no exercício de mandato no âmbito da União Federal, onde possivelmente sua influência foi usada, antes e depois do mandato – o que é objeto de investigação –, para que o esquema existisse e se perpetuasse.
Ressalta a Força Tarefa do Ministério Público Federal que a investigação sobre o ex-presidente não constitui juízo de valor sobre quem ele é ou sobre o significado histórico dessa personalidade, mas sim um juízo de investigação sobre fatos e atos determinados, que estão sob suspeita.
Dentro de uma república, mesmo pessoas ilustres e poderosas devem estar sujeitas ao escrutínio judicial quando houver fundada suspeita de atividade criminosa, a qual se apoia, neste caso, em dezenas de depoimentos e ampla prova documental. Conforme colocou a decisão judicial, 'Embora o ex-Presidente mereça todo o respeito, em virtude da dignidade do cargo que ocupou (sem prejuízo do respeito devido a qualquer pessoa), isso não significa que está imune à investigação, já que presentes justificativas para tanto.'"