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O presidente-executivo da Associação da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), José Velloso Dias Cardoso, elevou o tom das queixas contra as medidas adotadas até sobre o conteúdo nacional no fornecimento de equipamentos para o setor de óleo e gás. Fala em "lobby das petroleiras" e "política industrial às avessas".
Como a Abimaq decidiu fazer parte do movimento Produz Brasil?
Em outubro de 2016, percebemos um grande lobby da indústria internacional de petróleo, com Mobil, Statoil e Shell sendo recebidas na Presidência. Depois, percebemos que o ministro de Minas e Energia, Fernando Coelho Filho, e o secretário de óleo e gás do ministério, Márcio Félix, haviam encampado o discurso das petroleira. Em seguida, o presidente da Petrobras, Pedro Parente, que tem mais visibilidade, acabou sendo também porta-voz do setor de óleo e gás. Ele pode defender o que quiser, porque é presidente da estatal. O ministro tem de representar a sociedade brasileira.
A indústria fornecedora do segmento de óleo e gás e as empresas de engenharia não se sentiam representadas pelo Ministério de Minas e Energia. Sentimos a necessidade de juntar toda a indústria brasileira. Esse grupo foi formado por sete federações dos Estados com interesse no petróleo (a Fiergs está representada) e sete associações, como de máquinas, eletroeletrônicos, engenharia e aço, além do Sinaval (Sindicato Nacional da Indústria da Construção e Reparação Naval e Offshore). Começamos a trabalhar para ajudar o governo com sugestões de política industrial.
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O que vocês chamam de lobby?
O segmento de óleo e gás é o mais subsidiado no Brasil, por meio do Repetro, regime especial que isenta impostos, como PIS, Cofins e IPI, dos bens comprados. O lobby era para manter o Repetro e, ao mesmo tempo, acabar com a obrigatoriedade de se comprar no Brasil. O ponto principal que precisa de esclarecimento para a sociedade brasileira é o seguinte: há críticas ao conteúdo local, de que é protecionismo para a indústria nacional, e faz com que a Petrobras pague mais nas compras. É mentira.
Em 1997, (o então presidente) Fernando Henrique Cardoso, ao abrir o setor de petróleo, tinha uma visão, e havia duas alternativas: o modelo da Opep (Organização dos Países Exportadores de Petróleo), em que as empresas exploram o petróleo sem conteúdo local, e a outra era o modelo do Mar do Norte, de Noruega e Reino Unido.
Qual a diferença?
Se o petróleo ficar no fundo do mar, não vale nada, não é riqueza. Três dos países em que mais cresceu a exploração de petróleo na década de 1990 são da Opep: Venezuela, Angola e África do Sul. Na Venezuela, o petróleo representa 15% do PIB. Na Angola, 8%. Na África do Sul, 7%. Mesmo com esse peso enorme de petróleo, não são países ricos.
No caso de Noruega e Reino Unido, descobriram petróleo no fim da década de 1980. E começaram grandes investimento nos anos 1990, obrigaram a comprar insumos, máquinas e equipamentos nos dois países. A Noruega não tinha indústria, e isso fez com que muitos investimentos fossem para lá. A produção, no começo da década de 2000, chegou ao ápice de 3,5 milhões de barris por dia. Hoje, o Brasil produz 2,1 milhões por dia.
Depois, começou a cair e hoje está em pouco mais de 2 milhões de barris por dia em Reino Unido e Noruega. Mas o PIB gerado pela indústria do petróleo ainda aumenta, porque usaram petróleo para gerar riqueza no país. Agora, exportam máquinas. A cada R$ 10 bilhões de demanda de máquinas no Brasil, são gerados 282 mil empregos, entre diretos, indiretos e efeito renda.
Qual o potencial de geração de empregos no segmento de máquinas e equipamentos?
Só de máquinas e equipamentos, o Brasil tem potencial para gerar 1,5 milhão de empregos. A exploração de petróleo não gera emprego. Se você falar de fim de conteúdo nacional com o ministro (de Minas e Energia) Fernando Coelho Filho e o secretário contra o conteúdo local, vão lhe chamar de mentiroso. Por quê?Porque foi mantido o conteúdo local sem separar bens de serviços.
O conteúdo local nas plataformas é de 25%. Em cada campo, a parcela de 50% é de serviços, 50% de bens, entre máquinas, equipamentos e materiais como tintas, lubrificantes, tubos e aço. Os 25% de conteúdo local podem ser atingidos com serviços, que não se pode importar. Gera empregos, mas de baixo valor agregado.
A indústria nacional não quer subsídios. O problema é que o subsídio dado ao setor de óleo e gás para justificar a política de conteúdo local não foi retirado. As petroleiras podem comprar lá fora e não pagam nada de imposto, graças ao Repetro, que representa renúncia fiscal de R$ 10 bilhões por ano, sem contar financiamento subsidiado do BNDES e principalmente do Fundo da Marinha Mercante (FMM).
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A principal crítica ao modelo anterior é de que elevou preços e prazos...(interrompe) Não concordo com isso. Apresentação feita por Graça Foster (ex-presidente da Petrobras) e outra por Bendine (Aldemir, ex-presidente de Banco do Brasil e Petrobras) mostram que houve mais atraso em sondas importadas do que em construídas no Brasil. Teve sonda importada que atrasou 800 dias. Se você pegar as plataformas FPSO da Petrobras afretadas, compradas para (o campo de) Libra, das nove, cinco foram entregues antes do tempo. O maior atraso foi de cinco meses.
O que estava sendo feito nessas plataformas?
Os cascos vieram de fora. Foram feitos no Brasil módulos e integração. Os maiores atrasos foram nas sondas. Mas não houve distinção entre atrasos entre as produzidas no Brasil e no Exterior. Com o Repetro, no primeiro elo da companhia de petróleo, que é o estaleiro, tudo que é comprado é suspenso de impostos, inclusive quando importa-se um bem. Quando compro insumos no Brasil, pago impostos. Mas, quando vendo para a Petrobras, há suspensão do Repetro. O que acontece é que acumulo impostos, e não tenho o que fazer com eles.
É uma política industrial às avessas, com tributação no que é nacional e sem no que é importado. Há caso ainda mais grave no tributo de importação. No momento em que fabrico um compressor, 20% dele é importado. Sobre essa parcela, pago imposto de importação, Pis, Cofins, ICMS, tudo. O imposto de importação não gera créditos. Paguei, morreu. Agora, se a Petrobras comprar 100% desse compressor importado, não paga o imposto de importação.
Quando você fala que esse tributo é mais caro, considera-se o Repetro ou não? O Repetro encarece nossos produtos, em média, 15% a mais do que o importado. Outra questão é: o que no Brasil é mais barato do que lá fora? Nem tomada. No Brasil, pegando como exemplo a indústria automobilística, que tem proteção do imposto de exportação de 35%, e o Inovar Auto dá mais 30% de IPI. O Brasil tem indústria automobilística há 30 anos, com o quinto maior mercado do mundo, as maiores companhias estão aqui. Temos tudo, e precisamos de proteção.
Não existe nenhum bem industrial no Brasil mais barato do que na China e em Singapura. Por que máquinas serão mais baratas aqui do que lá? Se pegarem uma indústria alemã e trazê-la de helicóptero para o Brasil, com a mesma estrutura, ficará 25% mais cara. É o Custo Brasil. Agora, em óleo e gás ainda existe a questão do Repetro. Por que tenho de pagar mais caro pela gasolina do que lá fora?
O movimento recebeu alguma sinalização de que será ouvido pelo governo?
O (ministro da Fazenda, Henrique) Meirelles prometeu no dia 11 de abril que resolverá o problema do Repetro. Garantiu que vai tirar o viés importador. Estamos esperando. E passou a incumbência para o Jorge Rachid (secretário da Receita Federal). Estamos cobrando.
Qual a parcela do segmento de óleo e gás na indústria nacional de máquinas?Hoje, não representa nem 4%. Mas tem potencial para chegar a cerca de 15%.